LÚCIA SERRA
Sou Lúcia Serra e nasci em um 22 de maio, outono em Lavras, MG. Cresci rodeada por natureza pródiga, vivenciando mistérios de floradas e estiagens. Hoje resido - de maneira múltipla - em Belo Horizonte, Lagoa Santa e Serra do Cipó. Experimento, então, outros biomas: o cerrado e o campo rupestre. Sou doutora pela Faculdade de Engenharia de Alimentos, UNICAMP; especialista pelo Instituto Pasteur de Paris e pesquisadora aposentada da Fundação Ezequiel Dias. Cultivo estrelas e flores. Sempre amei cães e gatos. E, agora, colaboro com o Banco de Idéias e Projetos da Organização Conviver – Saber Social, voltada a meninos e meninas do Programa Espaço Criança. Embriagada de beleza e infância: escrevo. Caminhos do Corpo, Florada de Vernonia, Desvarios das Estações e Fendas: 16 Poetas Vivos são meus livros publicados. Menotti Del Picchia, Florbela Espanca, Francisco Igreja, Murilo Mendes e Blocos Editora são prêmios nacionais recebidos.
De
Lúcia Serra
DESVARIO DAS ESTAÇÕES
Maricá, RJ: Editora Blocos, 1999
“Prêmio Blocos 1999”
cavalgada
a ânsia
com a qual
me bebeste
(mel e absinto)
atiçou
cavalos
percorrendo
pradarias.
turbulência
na paisagem
(mescla da tarde
e ventania)
acossando
na encosta de morros
o murmúrio
de riachos e minas
(líquidos ruídos).
paia o galope
não há trégua
o êxtase
evola
das
narinas
pêlos
hálito afoito
suor
caldas
e crinas.
batida de cascos
matinada
e relinchos
confluência
de sentido
e sina
no encalço
do acaso.
semeadura
erva
de
tua
faina
semente
vertida
Se
esvaindo
na
seara
de
meus
pastos.
renascimento
não me aniquila a dor
- esta angústia -
ainda almejo
o rodízio das estações
no tempo fluído
de outras mãos
contradigo
o instante
experimento
o futuro
não mais tua
lanço-me nua
em busca da lâmina
não a que lacera
o pescoço
o pulso
pesquiso
isto sim
com olhos insepultos
nesgas de sol
que emeigem
(dentro da noite)
o léxico
do
dia.
De
Lúcia Serra
FLORADA DE VERNONIA
Belo Horizonte: Editora Mulheres Emergentes
– Edições Alternativas, 1997
69 p. (Col. Almanach de Minas, v. 6)
Mazelas
Sentimentos
peregrinos
exalam
e
exultam
odores
(e dores)
de folhas
maceradas
no
chão
de outono.
Dois sentidos
Quando
permeias
na geografia
(acidentes
planícies
matas
e rios)
é em braile
que tu me lês
atento e sôfrego
decifrando
incógnitas
tateando sílabas.
De olhos fechados
(e cego de desejo)
o amor
medra
na paisagem
os
ícones
de seus próprios
passos.
Signos.
Prazer
Tanto
se
nutriu
de
ostras!
especializou-se
pescador
de
pérolas!
Inquietude
Reativaste
em
mim
todo
sentido
de
me
saber
(inquieto e sôfrego)
esperando
do telefone
(estático e mudo)
o
alento
da
feminina
voz
e
seu
chamado
oculto.
LITERATURA. Revista do Escritor Brasileiro. No. 12. Junho, 1997. Publicação semestral da Editora Códice. Diretor: Nilto Maciel. Editor: João Carlos Taveira Ex. bibl. Antonio Miranda
SABOROMA
Melão
melancia
a aparência
não ludibria
a vista.
Pitanga e jaca
só a casca
embala
a fruta.
Goiaba e jambo
a saliva
gesta o sumo.
Marmelo e pêssego
fruta verde
é travo na boca
madura
(ainda no pé)
é mentira.
Carambola
o desejo
machuca
jabuticaba
da carne morena
jatobá
no cerne se
esconde
a alma
romã
ela da flor-semente
somente
caqui sumarento
maçã bem-vinda
uvaia fagueira
uva retinta
resina da vinha
vindima
amém.
(Para Antônio Augusto Lins Mesquita)
*
Página ampliada e republicada em março de 2023
Página publicada em fevereiro de 2010, depois de conhecer a autora durante o Verão Poesia 2009, de Belo Horizonte, Minas Gerais.
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