HÉLIO LOPES
(1919-1992)
Nasceu a 19 de dezembro de 1919, em Eugenóplis, Estado de Minas Gerais, Brasil.
Professor em diversas Universidade do Brasil.Homenagens: Prêmio "Érico Verissimo", da Associação Brasileira de Letras.
Alguns títulos do autor: Invulnerável Pássaro, 1974; Divisão das Águas, 1979;
Água Emendada, 1981; Introdução ao Poema Vila Rica, 1985; Cantigas do Meu Bairro, 1987; Terraços da Abite; Cântico dos Cânticos . . .
I
No incêndio das estrelas
consumi os olhos.
Tateio no chão das ventanias
o passo do anjo.
entre as minhas mãos,
a tua face -
rosa dos ventos -
e sentirei glícinias e agapantos,
noturnas claridades.
-
Quem me carregará para a outra margem
senão o teu amor?
-
As palmeiras repousaram a amanhã
Aliocha*
No asfalto resvalam salamandras
com olhos de bistre.
-
Nos lábios o sonho
nas mãos o espelho.
*
( Aliocha* personagem que, no romance
de "Dostoiesvski", escritor Russo, exprime o anseio
pela santidade).
*
Invulnerável Pássaro
*
II
Pastor, a Flauta
acordei saudade nos pássaros.
Será da alvorada
o segredo acendendo na prata
cintilações de azul?
-
A Rosa
beija o silêncio da noite
e arranca das estrelas,
o orvalho do verão
nas águas do rio
a árvore jogou
a ponte de sombra.
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De
Hélio Lopes
CANTIGAS DO MEU BAIRRO
Desenhos: Sérgio Campos
Itaperuna, RJ: Damadá Artes Gráficas e Editora, 1987
s.p. , ilus. formato 21 cm x 32 cm. Capa dura revestida de tecido vermelho
Cantiga Número Seis
Tranco de novo outra porta,
abro céus de fora a fora.
A claridade tem noite,
a escuridão em aurora.
Em toda árvore que sonha
há um pássaro que chora.
Nas águas em disparada
jogo sombras de papel.
Mato o sabor do veneno
com minha faca de mel.
Só é segura a balança
porque tem o seu fiel.
Quando na estrada se ajuntam
os ventos com sua ronha,
os rios com os desvios,
as pedras com a peçonha,
planto uma árvore que chora,
nasce um pássaro que sonha.
Cantiga Número Dez
Não vale a pena exigir,
muito menos reclamar
aquilo que não foi meu.
Rolo na roda gigante
e sonho que não sou eu
quem foge longe de mim.
Alto o fogo requeimou,
dentro e fora consumiu
o sonho que me sonhou.
Amo os ardis do perigo.
Se jogo a proa no ilhéu,
arrasto estrelas comigo.
LOPES, Hélio. Água emendada. São Paulo: Vertente Editora, 1981. 67 p. 13,5c21 cm. “ Hélio Lopes “ Ex. bibl. Antonio Miranda
27
Era junho, era noite e noite fria.
E eu acordado e as flores acordadas
e as velas, hirtas, acordadas! Tu
com tuas frias pálpebras fechadas!
O sono ressumbrava das paredes,
mas o dia acordados nos achou.
E só a ti nem passos nem palavras
nem o grito da vida te acordou!
Eu sentia vontade de agitar-te,
pegar a tua fronte em minhas mãos,
dizer-te que era dia em toda parte
e somente em teu rosto persistia
a sombra vesperal que, não sei como,
fez brotar nos teus lábios a alegria!
33
Aos lamentos subindo destas sombras,
errantes sobre as águas deste rio,
muito embora minha alma não responda,
os olhos destas sombras não desvio.
Que importa pelas névoas os seus rostos
se desfaçam em lívidas estrelas?
De pé, a margem destas águas, todos
eu pelo nome e afeio os reconheço.
Sobre as águas largai, sombras amigas,
o vosso branco manto de neblinas
para a minha passagem muito breve.
Fazei o remador remar de manso
e ao compasso de mágoas e de cantos
para a margem das sombras me carregue.
LOPES, Hélio. Invulnerável pássaro. São Paulo: Editora do Escritor, 1974. 51 p. 14X21 cm. “Orelha” do livro por João Carlos Morel. “ Hélio Lopes “ Ex. bibl. Antonio Miranda
XIX
No incêndio das estrelas
consumi os olhos.
Tateio no chão das ventanias
o passo do anjo.
Entre as minhas mãos,
A tua face —
dos ventos —
e sentirei glicínias e agapantos,
noturnas claridades.
Quem me carregará para a outra margem
senão o teu amor?
As palmeiras repousam a manhã,
Aliocha.
No asfalto resvalam salamandras
com olhos de bistre.
Nos lábios o sonho,
nas mãos o espelho.
Página publicada em fevereiro de 2010; ampliada e republicada em junho de 2014.
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