HEITOR LIMA
Poeta, advogado. Humberto de Campos considerou a obra “Primeiros poemas” (Rio, 1915) do poeta como “a estreia mais brilhante porventura registrada em nossa literatura poética neste segundo decênio do século”, único na carreira do autor.
Nasceu em São Paulo de Muriaé, Minas Gerais, em 28 de março de 1887, Heitor de Oliveira Lima faleceu no Rio de Janeiro em 17 de fevereiro de 1945.
CINZAS
A última brasa ardeu na cinza adusta:
Tudo passou, tudo se fez em poeira...
E na minha alma, que o abandono assusta,
Morre a luz da esperança derradeira.
O amor mais casto, a aspiração mais justa
Têm a desilusão para fronteira...
Um momento de sonho às vezes custa
O sacrifício da existência inteira!
Chama efêmera, o amor! Baldado surto,
A glória! Ah! coração mesquinho e raso...
Ah! pensamento presumido e curto...
E o amor, que arrasta, e a glória, que fascina,
— Tudo se perderá no mesmo ocaso
E se confundirá na mesma ruína.
DA TERRA AO CÉU
Ser raiz é ser bom. É viver sem vaidade,
É sofrer sem blasfêmia, é morrer sem terror.
É combater o mal, sabendo que há de
Sucumbir ao furor da tempestade,
Para ressuscitar, um dia, triunfador.
Todo aquele que luta, abraçando o partido
Da Virtude, e cultuando a Justiça e o Dever,
E, passada a peleja, combalido,
À terra volta, odiado e encarnecido —
É Raiz: algum empo há de reverdecer.
Todo aquele que deixa os mundanos tumultos
Pela meditação — misterioso crisol —
E leis formula à ciência, e dos estultos
Tem, no transe final, mofas e insultos —
É Raiz: subirá para a glória do sol.
Todo aquele que, insone e em febre, as noites vela,
Na tortura inaudita e suprema do Ideal,
E, no verso, no mármore, na tela,
Na pauta vibra a perfeição revela —
É Raiz: há de ser, ao Sonho, pedestal.
Todo aquele que sente o indizível encanto
Dessa alucinação que é ser amado e amar,
E sofre, e quer o próprio mal, contanto
Que o olhar querido não se afogue em pranto —
É Raiz: errará, feito perfume, a ar.
Todo aquele que, em face à indigência, que implora,
Detém o passo, escuta o rogo, estende a mão,
E consolando, comovido embora,
Num furtivo carinho se demora —
É Raiz: será fronde, há de chegar ao céu.
ASAS
O que torna mais triste o céu sangrento
Ao por-do-sol, são as partidas, são
Os adeuses dos pássaros ao vento,
Numa incerta e fugaz palpitação.
Ah! Quantas vezes, no apressado ou lento
Voejar de aves que veem e aves que vão,
Tocam-se duas asas um momento
E afastam-se em contrária direção...
Também os nossos corações, um dia,
Se encontraram: no ocaso rubro ardia
O incêndio dos amores imortais.
E — asas, na tela acesa do sol poente —
Um no outro eles roçaram levemente,
Para não se encontrarem nunca mais!
Página publicada em agosto de 2015
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