FRANCISCO INÁCIO PEIXOTO
(1909-1986)
Francisco Inácio Peixoto nasceu em Cataguases, onde viveu toda sua vida, exceto pelos anos no Rio de Janeiro onde cursou Direito na Faculdade Nacional.
Foi um dos integrantes do Grupo Verde, de poetas modernistas e um dos mais importantes articulistas da Revista Verde, uma das principais revistas modernistas da década de 20 em Minas Gerais.
Em 1940 contrata Oscar Niemeyer para projetar sua residência e em 1945 o Colégio Cataguases. Participaram destes projetos o paisagista Burle Marx e Joaquim Tenreiro, com o mobiliário. A partir daí diversos outros edifícios modernos são construídos na cidade.
Principais obras: Meia Pataca - 1928, poemas, com Guilhermino César ; Dona Flor - 1940, contos ; Passaporte proibido - 1960, romance e novela ; A janela - 1960, contos ; Chamada geral - 1982, contos. Fonte da biografia: wikipedia
Temos em nosso acervo privado, um exemplar da obra ERÓTICA – Poemas, álbum com desenhos de Aldary Toledo, da Imprinta Editora,do Rio de Janeiro, de 1981, de onde extraímos os poemas a seguir. Antonio Miranda
EXERCÍCIO ERÓTICO
Triângulo isósceles que se inscrevesse no ventre
coxim de pelos ruivos
ou negros ou fulvos
ora seda desfiada ora cerda ou lã
ou espessa crina crespa em campo escuro
que ansiosa mão afaga procurando
a oculta amêndoa
— vértice de dura bissetriz que irá ferí-la
dividindo em dois o deleitável monte.
SESTA
De flanco, encolhida como
um feto retornado ao útero,
as ancas cheias são
entre tronco e coxas
leiras que os olhos rasgam>
Presto mas sutil
(não lhe desmancho o sono)
fundo-me, isopétalo, na fôrma
do corpo de ébano.
Inconsúteis nos quedamos e indivisos.
Em breve também emigro
entre sonho e sono
para aquém da vida.
JOELHO
Orografia mínima
entre perna e coxa.
Um dedo basta
para sentir-lhe as pequenas dunas
as ligeiras covas
onde o tato se compraz.
Se a mão espalma em concha
a gelatina da carne
um bicho nela oculto freme
titila
explodindo em cio.
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De
MÁRIO DA SILVA BRITO – POESIA DO MODERNISMO. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1968, p. 121-122
PEDREIRA
Dependurados no espaço
eles ficam ali o dia inteiro
Arrancando faíscas
Furando buracos na pedreira enorme
Que reflete como um espelho
As suas sombras primitivas.
A tarde ouve-se um estrondo
E o eco repete a gargalhada das pedras
Que vieram rolando da montanha.
Os homens de pele tostada
Descem então dos seus esconderijos
E caminham pras suas casas
Vagarosamente decepcionados
Segurando nas mãos cheias de calos
As ferramentas com que procuram
Há urna porção de anos
O segredo que lhes dê
Urna nova revelação da vida...
Meia-Pataca — "Verde" Editora - 1928 — Cataguazes — Página sem numeração.
Extraído de POESIA SEMPRE, Número 36, Ano 18/2012:
POEMA
Em que densas florestas me embrenhei!
Jamais, jamais esta paz
tão feita de solidão e de mistérios impenetráveis!
Oh, aurora tantas vezes pressentida,
tudo, tudo perdido na certeza desta hora inumerável!
Se caminho, minhas mãos cegas esbarram em troncos viscosos
parando, me comprime em seu seio a treva imensa.
Eu, cego, sinto a evaporação pesada da seiva apodrecendo
meus pés não encontram firmeza na massa de lodo que aos
poucos vem subindo e me recobre o corpo
eis que são algas marinhas me envolvendo
me afundo na floresta submarina e meus ouvidos só
guardam agora
marulhos de conchas e búzios
adormeço neste enorme útero para a vida placentária
que voltará sempre.
Estrelas-do-mar contornai meu corpo
deixai meu corpo boiando sobre as águas irreveladas
deixai-o boiando à flor dos oceanos.
Página publicada em maio de 2009; página ampliada e republicada em agosto de 2015.
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