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CLEONICE RAINHO
15 de Março de 1919 a Maio de 2012
CLEONICE RAINHO THOMAZ RIBEIRO
foi escritora, poeta, contista, trovadora, romancista, ficcionista infanto-juvenil, educadora e muitos outros títulos.
Nascida em Angustura, distrito da cidade de Além Paraíba (MG), ela foi professora da Faculdade de Letras da UFJF.
Natural de Angustura, a escritora e educadora está entre os importantes nomes da cultura de Juiz de Fora.
Sua entrada no mundo da literatura se deu por colaborações em jornais da cidade, como “Gazeta Comercial” e “Diário Mercantil”.
A autora publicou cerca de 30 obras, entre livros, antologias e ensaios, incluindo títulos como “Terra corpo sem nome” (1970); “Veio branco” (1979); “Intuições da tarde”, de 1990; “Verde vida”, de 1993; “O palácio dos peixes”, de 1996; “O linho do tempo”, de 1997; “Poemas chineses”, de 1997, e “Liberdade para as estrelas”, de 1998.
Trabalhou para o Conselho Estadual de Educação de Minas Gerais e para o MEC na Campanha de Aperfeiçooamento e Difusão do Ensino Secundário (Cades).
Uma das fundadoras do Conselho Curador da Fundação Cultural Alfredo Ferreira Lage (Funalfa), foi ainda criadora da Associação de Cultura Luso-Brasileira em Juiz de Fora, trabalho que lhe rendeu a “Ordem do Infante Dom Henrique”, concedida pelo Governo de Portugal. Ainda em Juiz de Fora, foi agraciada com a “Comenda Henrique Guilherme Fernando Halfeld”. Vésperas de completar 96 anos, Cleonice vive em sua residência aos cuidados de tres enfermeiras que se revezam, sob supervisão do filho Fernando Rainho.
Faleceu em 21 de maio de 2012, aos 97 anos.
ALVO
Companheiro,
vem beber a branca espuma
desse mar de carneiro que me toca
e colher as coisas transitivas
que ora viajam para o meu espírito
Vem ser o obreiro-irmão da cidade azul
onde bordaremos puros capitéis
e aprender os discursos de meu timbre
acertando o alvo de alvas direções
Vem abrir comigo este pombal
sentir o que do traço das asas subsiste
a envolver-nos nos fios desta tarde
em que a Paz se oferece como pão.
(de Intuições da Tarde)
LITERATURA. Revista do Escritor Brasileiro. No. 19. Ano IX / DEZEMBRO 2000.
Publicação semestral da Editora Códice. Brasília, DF: 2000. � Diretor: Nilto Maciel.
Editor: José Carlos Taveira. Ex. bibl. Antonio Miranda
FIAT LUX
Dói no corpo e na alma
este momento. Desnudamo-nos.
Como tecemos a túnica pesada
e tantas máscaras moldamos
não sabemos.
Importa que o rompimento
se deu
e hoje não temos
como em transparéncia
cristalina -
nossa verdade, nossa face.
E porque amamos este momento
em que a luz se fez
teremos claridade no caminho
por milenios.
Cultiva a amizade, insiste,
põe nela o fervor maior,
pois cada amigo que existe
faz nosso mundo melhor.
**
Na vida, estrada de dor,
vim andando, a perceber
que a amizade, mais que o amor,
ajuda a gente a vencer.
***
Nas fases boas apenas
devia a vida parar,
tal como nuvens serenas,
esquecidas de passar...
TEMPO DE ESTRADA – 20 POEMAS DA TRANSAMAZÔNICA. Rio de Janeiro: S.D.M.T em co-edição com Instituto Nacional do Livro e Grupo de Planejamento Gráfico, editores, 1972. 208 p. Ex. bibl. Antonio Miranda
TRANSAMAZÔNICA, 5.269 KM DE ESPERANÇA
Despenteio a lira
para penetrar-te
selvática selva selvagem
e me enlaço e me enleio
nas tuas cobras e cipós
de estremeções iguais.
Teus frutos bárbaros
como, embriago-me
e no teu ventre
me encharco:
rios miasmas pântanos
areias buracos barrancas
índios feras
tocaias saques
duendes mitos
e monstros —
Meu São Raimundo das Margens
valha-me nesta missão!
Faço a jornada das águas
e no abismo dos mistérios
embalo-me à flauta do uirapuru.
Ponteio o mal-acabado mapa
rastreando vestígios
não nacionais.
Bois e vaqueiros
ruminando lendas e causos
vêm, pelas veredas.
Mora a ternura
nas cruzes à beira
entre lírios do Sermão.
Junto a cedros
mognos sucupiras
armo minha tenda:
o putirum começou.
Nem Éden nem Inferno —
quero-te humana
pátria, país natal.
Surpreendo-te áo vivo
os olhos livres
de lianas e cascavéis.
Sacudo-te do sono
no catre das águas
insuflo corações de borracha
tomo as garças no ar
dos igarapés.
O ideal ressuma
das seringueiras
um sabor de amanhã
nos úmidos arvoredos
e céus abrindo azuis sobre
os troncos que estralam
as nuvens de piuns
a orquestra dos pássaros
e o desfile dos peixes
na agreste passarela.
Vaporizo o odor das resinas
nos hálitos podres
para te salvar, Caboclo,
meu povo minha gente meu irmão
Zoca Chico dos Santos Doga
te vejo te sinto te ouço —
com a tua malária
teu rosto de inchaço
teu teto de palha
tua cuia de goma
tua grama de ouro
teu instinto teu bordel
teu cuité de cachaça
tua carabina chumbeira .
teu arco tua flexa
teu jacá de castanhas
tua menina deflorada
teu varal de peles
teu garimpo
tua seringa
tua rede de tucum
teu cavalo
tua trilha de burro
teu sonho de barco de popa
teu olhar tapuio
(espiando o gaiola)
teu flagelo
tuas chagas
tua fome
tua resignação —
e te trago humano
brasileiro humilde e bom
para este abraço
d i m e n s i o n a l.
(Correi, génios maus:
Pajés e puçangas
Curupira Cobra-Grande
Bicho-do-Fundo Boto
Pai-do-Mato Minhocão!)
Incita o coro dos psitacídeos
e as palmas das pupunheiras
ergue auriverde nos mastros
de Nazaré venha o círio
colhe vitórias-régias
e o néctar dos ventos
arma a roda do chorado
traze gado de Bel-Terra
e pirarucu de Santarém
para os arruídos da Estrada
— pororoca de dois oceanos —
arquitetura de espanto
na teia de aranha dos rios
5-269 quilómetros de esperança
na tua vida de junco.
TROVAS 2. TROVAS. [Seleção de Edson Guedes de Morais]: Bastos Tigre, Batista Capellos, Belmiro Braga, Benedita de Melo, Carlos Guimaraens, Carolina Azevedo, Catulo Cearense, Cícero Acaiaba, Cleoniice Rainho, Djalma Andrade, Durval Mendonça, Edgar Barcelos, Edmar Japiassu Maia, Edna Valente, Elmo Elton S.
Zamprogno, Elton Carvalho, Emiliano Pernete. Jaboatão dos Guararapes, PE: Editora Guararapes EGM, 2013. 17x12 cm.
edição artesanal, capa plástica e espiralada.
Ex. bibl. Antonio Miranda
Pagina publicada em setembro de 2019; Página publicada em novembro de 2020
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