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ANDRÉ DI BERNARDI

André Di Bernardi Batista Mendes nasceu em Belo Horizonte. Também Jornalista, André estréia com A hora extrema (1994), vencendo o prêmio Álvares de Azevedo, promovido em 2006 pela Academia Mineira de Letras. Em 1997 lançou água cor, e em 2002, longes pertos e algumas árvores. Di Bernardi tem um livro inédito, Lâmina, de onde serão retirados os poemas para a sua leitura, em diálogo sonoro com alguns poemas do livro longes pertos e algumas árvores.  

Mais textos em: http://reacaocultural.blogspot.com/2006/09/poesia-di-bernardi.html
 

I

 

Carnadura

 

Triste, alegre coração humano.

Danado de lastro e lava.

Sujo, todo de delicadezas prontas.

Feito de cardos. Carneiro. Cárneo.

Pronto para o abate.

Feio de dálias leves e lúcidas,

seria o máximo dizer-lhe: sangro.

 

Porque Deus teceu a este ponto,

um coração feito de carne.

 

Nesse mossoró interno

compaixão e ternura,

lastro e lástima.

O dito cujo carnoso.

 

Feio de tudo,

seria o máximo dizer-lhe.

Porque teço a este ponto.

Poesia.

Seria isto soprar-lhe na ferida viva?

A palavra, das mais delicadas, a delicada.

 

De Deus, minhas carniças. 

 

II

 

Asa pedra

 

Cheia de muito cuidado,

letra, palavra, asa pedra,

do jeito que a gente acha

e ela nunca é.

Como corações.

Vá se foder, vá conhecer

o vermelho por dentro.

Isso que pesa nasce pronto,

verdadeiramente neutro

e delicado.

Mas vai escrever,

e a grafia desce torta, ainda que azul.

A gente colhe o inusitado na vida,

o barulho da voz de cada pessoa única,

suas feições, ângulos e gestos, ou ainda,

mais além, nosso próprio timbre estranho,

peculiar, sentimental.

Cheia de muito cuidado,

pluma, trem, pala palavra,

a tinta decora seu papel

onde a tua, já não sei mais,

o que era alma flora.

 

*** 

De

A HORA EXTREMA

Belo Horizonte: Maza Editores, 1994

 

***

 

Às vezes nem tanto,

mas sigo protegido, iluminado pelo clarão de tua

sombra,

iluminado pelos resquícios dos teus gestos, que,

cristalizados,

faço deles meu punhal,

e prossigo fortalecido.

 

E sigo protegido, iluminado pelo meu cansaço,

ternura dos corpos apalpando o inusitado,

o que está para se criar, o inventado,

aperfeiçoando idéias, tornando outras mais belas.

 

Talvez nunca haja um resultado,

mas pelo menos sei que agora invento palavras,

tenha a certeza dos medos,

sei da coragem dos olhos que insistem

e seu da vontade da alma, que, iluminada,

idealiza seu canto. 

 

***

 

Nem nos delírios absorvo-me

e quanto mais nele

mais me quedo

e absorto,

sorvo-me.

 

Nem no sonho absorvo-me

e quanto mais nele

mais me amplio

e absorto,

sonho-me.

 

 

A TENSÃO

 

A tensão que me conduz

condena, reina,

e morre de rir da amplidão que me espera

e que, desesperada por não me ter,

se reduz.

 

 

 

Página publicada em março de 2008.



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