ORLANDO ANTUNES BATISTA
Nascido em Rancharia, Estado de São Paulo, em 1947. Professor universitário aposentado, escritor, poeta e compositor, reside na cidade de Três Lagoas (MS).
Doutor em Letras pela USP. Livre-Docente em Teoria Literária. Lecionou em várias universidades, entre elas a Universidade Federal de Mato Grosso (1975/85), e a Universidade Federal de Goiás. Reside na cidade de Três Lagoas (MS).
Concorreu e foi eleito - em 16 de maio de 2006 - para a Academia Sul-Mato-Grossense de Letras (Cadeira nº 12).
Sitio web do autor: http://www.members.tripod.com/~orlandoab/
BATISTA, Orlando Antunes. Magnópio poesias. Rio de Janeiro: Presença, 1987. 55 p. 14x21 cm. Em colaboração com a Fundação Universidade Federal de Mato Grosso. Centro Pedagógico de Barra do Garças. Capa, contracapa, ilustração, arte final: Luiz Antônio de Melo. ISBN 85-22-0019-0 Col. A.M.
PROFISSÃO DE FEL
Vim ao mundo pelo desagrado
Cumprir meu destino n´ocaso,
Viver um aspecto dum verbo
Fazendo melancolia no signo.
O fim imitando o princípio
O acaso unido os precipícios.
Rodas de fogo levando omeu
O ocidente ao longínquo oriente.
Uma ária símile do século XX
No lápis se fazendo de espinha
No duplo movimento de um x.
Vivendo entre aros dourados
Querendo o além da esquina
No meu belo opus intestino.
INFORTÚNIO
Meu nome tem duas rodas
que uso qual coturnos
marchando nos silêncios do papel
Dois sóis soturnos
orlando meu tempo infinito de gerúndios.
Na cabeça a peneira me fazendo de chinês
um anel entre as mãos
numa simetria de planetas
De resumo um ar lindo
Pairando no meu tempo de engrulhos.
ENSAIO
Há em tudo um mistério.
Um meandro, uma cabala.
Um sinal de mito no muro.
Quero ser um siriemo
fora dos ermos dos pantanais.
Levo do pântano muita música
a reboque. Quem quiser que
me toque. Eu fiz lira do
meu bodoque.
DEVOÇÃO
Nossa Senhora do Pantanal,
sei que tu não existes!
Pura ficção minha,
Dai-me um patamar.
Mesmo que a música eu perca
no tempo incerto destas
entropias!
Neste planalto te peço:
senhora minha do meu mal,
ajudai-me,já que a esperança
não é tão longa quanto
pronunciar o nome estúrdio
de Aquidauana!
MITO MATOGROSSÊS
Comi cabeça de
pacu e não saio
mais do reino
da poesia.
BIOGRAFIA
Nasci no estio da menopausa.
O destino se abriu qual veio.
Não tinha o azul do seu.
Era escuro qual um breu.
Levei pisa.
Só não fiquei inclinado.
Da infância carrego a Rua Padre Paulo
feito pedra dando pulo.
Órfão. De felicidade partida ao meio,
se pudesse, fazia de todo um bis.
Se não posso, armo numa metátese
a poesia de meu nome e vou rolando.
Procuro-o! Não sei onde vai o opus.
Cheio de melancolia, no azedo da bílis
me lanço ao mundo, sonhando um ex-libris.
Diálogo
Sul-Matogrossense:
— Paulista bebe café caipira.
Poeta:
— Aprendi poesia fazendo café
tropeiro: pouco pó, pouco pó,
pouco pó!
Anatomia
Do centoboi o colchão
mole é para pobre de
espírito. Pra iniciação
poética só o duro
colchão.
Passarogo
O pássaro está feito. E voa/com certeza.
Pró nada. Como que vou vendo o perfil
esculpido na metonímia do espelho.
Aprendi voar tendo asas por todos os
sentidos.
Feito ave de subúrbio cantarei sem
soberba pelas manhãs de Rancharia
ou Goiânia. Um voo dentro do ovo
cápsula feito ave,
flutando num breve calipso.
Até que chegue o tempo de ser
silenciopedra.
Viagem
No espaço desta sala
imagino meu solo de música
e geometrias. Porei um se-
lo no pássaro e o projetarei
no infinito.
Meus erros vivarão areia
no tempo da erosão, ficando
o silêncio apenas o símil
do engodo pulando a barreira
dos sãos.
Na fumaça desta ave
haverá rastros de superson
misturados com milméis.
Poemas extraídos do livro MAGNÓPIO. Rio de Janeiro
BATISTA, Orlando Antunes. Madurez no Pantanal. Rio de Janeiro: Presença Edições; Brasília: INL, 1984. 179 p. 14,5x21,5 cm. Capa: José Pedro Frazão. Prefácio de José Fernandes. "Prêmio Brasília" de poesia da Fundação Cultural do Distrito Federal, 1982. Ex. bibl. Antonio Miranda
INQUIETAÇÃO
O martelar dos sapos
acorda a palavra dormindo
de verso, sem saber de
telegrafia entre os sapos.
Com a saparia martelando
Aquidauana o verso se
vira e dorme no ponto final.
DIVANDANDO
Procuro uma musa
moça ou sem inveja,
e mesmo sendo Aurélia
darei nela um puxão de
orélia por me seduzir
nas margens do texto.
Se nos buscarem,
acharão nossos passos
nas franjas das sílabas.
Antes da despedida,
mesmo à revelia, farei
um sinal na tua testa
para não nos perdermos,
até na porta do pantanal.
UMA ESTAÇÃO QUALQUER
Dou menos banana para a morte.
Os que olham para mim observam
só minha rispidez, mal sabendo
dos deuses que dormitam em si
mesmos.
Sendo alguém que sabe o perfume
da tortura, sem trepar em pau
de arara, caminho com todos ao
meu lado sendo a cada dia um prefácio
esquecido na porta do paraíso.
CÓDIGO
Mar de xaraés, achado
raro nas charadas dos
rios que correm sem
saberem donde vem o
som das águas rasas
e chãs.
TEXTO DO MAR
Ainda não cantei este mar
que invade meus sonhos no
silêncio do pantanal.
Perdido entre ar, terra e
outros mares, o mar dos xarayos
vive em mim, precipitando-se nas
ondas de silêncio que lambem
meus pés.
Mar de cabeça para baixo, esse
mar corre tão profundo que nunca
dará pé. Dó sinto suas águas no
orvalho que cai, suor das águas
cansadas de nunca retornarem.
SEGREDO DE XARAÉS
O mar de Xaraés eu não sei como é,
só sinto suas águas lavando meus
pés. Marulham em silêncio as águas
de Xaraés, exilada no tempo. E
Ninguém vê, nem sabe como é, só
eu sinto suas máguas derrubando
meus pés.
O mar de Xaraés não sei como é.
Só sinto seu lodo em que afundam
meus pés. Talvez o mar de Xaraés
durma no leito do Aquidauana e
siga fluindo, sonhando o rio
o mar que não é.
REVISTA DA ACADEMIA SUL-MATO-GROSSENSE DE LETRAS. No. 18. Dezembro de 2010. Campo Grande, MS: 2010.
Ex. cedido por Rubenio Marcelo
Gazal
Escuta o gazal que te fiz,
Bugrinha, em louvor de ti.
— Poeta de Aquidauana, teu verso
minha mágoas não diz.
Pois na até aldeia global
Também me eu já me perdi.
Disseste: Te exaltarei constante
Ainda que seja breve o instante.
E as índias anastacianas,
De Limão Verde ou Kadiwéu.
Agora que moras em Três Lagoas
Delas não ter coragem de tirar o véu.
As índias todas desencaminhadas
São agora quase pó: estão na piaba.
Três Lagos, 12/10/2006
Trova
O que farão as pombinhas
Se não acharem raminhos?
Não terão mais suas caminhas
Pois destruíram seus ninhos!
Três Lagoas: 12/10/2006
Anseio
O São Linguinho,
Teu nome soletro baixinho:
Entre logo nesse versinho
Vem, vem bem de mansinho:
Quero chegar numa casa
Onde tomam chá das cinco
Chegarei batendo as asas
Entrarei sem abrir o trinco.
Pé-ante-pé, São Longuinho,
Chegarei à a(r)cademia:
Cobrirei meus versos de lix
Com as sete chaves de poesia.
Chegarei com disfarce de fênix
Porque tenho na lira o meu ix.
Adamantina 11/08/2006
Três Lagos 12/08/2010
Diagnóstico
Enquanto uns correm pro Alcorão
Outros indagam: onde é o porão?
Orlando Antunes Batista
Três Lagoas (MS) 25/07/2006 – 09/08/2006
Alguns têm bursite.
Outros, tendinite.
Muitos, apendicite,
Otite, apetite, rinite.
Eu? Carrego só
aquidauanite!
Alexandrino em limos
Blasfemador, ardente, amoroso ou perverso,
Dizei-me do espaço, as vibrações ouvistes.
Ter arte é ter Paixão. Sem paixão não há verso.
Dizei-me se o concerto oculto já ouvistes?
A Dor é sempre o eterno e gigantesco plinto.
Dizei-me se o concerto oculto já sentistes
De quem sonha e comunga este trágico absinto.
Há muita gente que eu sei que não gosta de versos.
E canta a tua Dor e talha o alexandrino;
Daí uma asserção de críticos diversos.
E burilo, Vera, este pobre soneto.
Pousa no fictício os pedestais emersos
Sustentados são sol em cimento reverso:
Eu me esteio em tantos pontos controversos!
Centão indígena
Línguas e dentes dardejais nos ares
Os botoques guardais nas armas brutas
De restos babujais templos e lares
Que em desgraçadas e mesquinhas lutas
Já tendes paços em lugar de grutas.
Sabeis — e errais propositadamente
Morubixabas de ambições astutas.
Ainda viveis! Conheço vos felizes
Como no solo o vosso rasto ilude.
Em vez de liberdade encontra um muro
E em lugar da glória o lodo impuro
De pés virados, marcha avessa e rude,
Mas, apesar do tempo e dos vernizes,
Ainda viveis! Conheço-vos (in)felizes.
Foto de Aquidauana - MS
https://www.sospantanal.org.br/microrregioes-pantaneiras-aquidauana/
Aquidauanite
Ao Geraldo Ramon Pereira
Aquidauana, ó minha Aquidauana,
Na água do sul do mato-grossense.
Dentro das imagens és bem ruana
Que chega até cheirar o non sense!
No Portal do Pantanal, ao meio dia,
Tens Pantim de menino da porteira
Casta Princesa! Teu cinto de poesia
Guardo de loisa e coisa na algibeira.
Do vale do Morro do Chapéu
Sob as sete chaves de melancolia
Teu nome ecoa nas névoas ao léu.
Tem a gramática verbo aquidauanar?
Enquadrar posso o meu pensar?
Anastaciar, trilagoar, isto é que é penar!
Três Lagoas 21/08/2006
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Página ampliada e republicada em julho de 2022
Página publicada em janeiro de 2008. Ampliada e republicada em junho de 2017. |