FLORA EGÍDIO THOMÉ
Poeta e professora de Literatura, nascida em Três Lagoas, Mato Grosso do Sul. Autora de Cirros.
“Quanta coisa ela quis dizer com “trem que não traz alguém”, “os caminha se desfazem”, “ânsias em erupção”, “A afadiga do não realizado”. Página muito brancas e muito altas.” ROSÁRIO CONGRO
Poema extraído da obra CHUVA DE POESIAS, CORES E NOTAS NO BRASIL CENTRAL, 2 ed., de Sônia Ferreira. Goiânia:Editora da UCG; Editora Kelps, 2007, com a autorização da autora.
Ocupa a cadeira no. 33 da Academia Sul-Matogrossense de Letras.
REVISTA DA ACADEMIA SUL-MATO-GROSSENSE DE LETRAS. No. 19. Setembro de 2011. Campo Grande, MS: 2011.
Ex. cedido por Rubenio Marcelo
Lá vem um trem
Lá vem um trem
correndo vem
fazendo curva
jogando apito
cheio de trem.
Eu vejo um trem
um outro trem.
Trem. Muito trem...
É trem que chega
trazendo gente
cheia de trem.
Trem. Muito trem
Que tenho eu
com esse trem
que longe vem
se não me traz
nenhum alguém.
Menino moleque
Menino moleque
é gente de fato
é esperto
é danado
é briguento
é falaz...
Menino moleque
de mão sempre sujas
de cabelos longos
de roupa emendada
não usa sapato
nem mesmo botina
não "dorme no ponto"
não topa preguiça
remexe... revira
é tremendo... é audaz!
Menino moleque
metido a ser grande
que fuma e namora
já entende da vida
já entende mulher
ninguém o tapeia
ninguém o engana
pois sabe o que quer!
Menino moleque
de alma febril
de estilingue no bolso
roubando laranja
roubando galinha
que faz confusão
e muita miséria
miséria de fato
é az... é vilão!
traz o diabo no corpo
e Deus no coração...
Mesmo moleque
de infância distante
do mundo da escola
e aprendeu a ler
na escola da vida
foi moço de fita
sem fita fazer!
Menino moleque
de ponta de rua
de beija de rio
de porta de bar
da casa vadia
O que esperas da vida
O que te espera o amanhã?
— eu te pergunto agora:
— o quê ?
TREM
Lá vem um trem
correndo vem,
fazendo curva,
jogando apito,
cheio de trem.
Eu vejo um trem.
Um outro trem.
Trem. Mais trem.
É trem que chega,
Trazendo gente
Cheia de trem.
Que tenho eu
Com esse trem
Que longe vem,
Se não me traz
Nenhum alguém?
REVISTA DA ACADEMIA SUL-MATO-GROSSENSE DE LETRAS. No. 9. Setembro de 2005. Campo Grande, MS; 2005. 96 p.
Ex. bibl. Antonio Miranda
Haicais
Quatro as estações
do ano. Múltiplas
as estações da vida.
Cores se abrem
no campo e flores.
Primavera.
Ardem as cores
no tempo e horizonte
Verão.
Cores amadurecem
nas árvores e no chão.
Outono.
Fecham-se as cores
no espaço e mãos.
Inverno.
Esqueceu-se da tabuada...
Em seu lugar,
decorou a natureza.
Colorido no céu:
pipas de papel
brincando de haicai.
Jabutigrama no quintal
Chão coberto de flores:
amores não acontecidos.
Sobre vitórias-régias
o sol derrama
compondo girassóis.
Não lamentes
pétalas desfolhadas.
Outras há... outras virão!
Outono:
Nudez nas árvores
Mudez no coração.
Ao longo do caminho
taboas perfiladas
vêem o dia desfilar.
No mar, o horizonte
se perde. No horizonte
quem se perde é o mar.
Do lado de cá do rio,
em tarde de sol,
a tarde morre mais tarde...
Atravessando o rio
o tempo é mais, é menos.
Fuso-horário lúdico.
Bêbadas no espaço
nuvens compõem
figuras abstratas.
Em galhos feitos de nós
a árvore mais parece
camisa-de-força.
Mangueira no quintal.
Memória inspira respira
instantes felizes.
Ó lagartixa
o que mais te assusta:
ruído ou inquietação?
Bogarim no alpendre.
Vida pela metade:
pai e mãe.
Na estrada, faróis
piscam sombras e fantasmas.
Fauna noturna.
Formigas na sala
me fazem companhia.
Fora, a vida arde...
Morcegos transitam
nos medos que mastigo.
Crescem a noite e o medo.
Borboleta passeia
e no quarto se instala.
Comunhão a dois.
Na geografia azul
pássaros voam
Cantando ilusões.
*
Página ampliada e republicada em abril de 2023
*
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Página publicada em julho de 2022
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