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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 


SILVA FREIRE

(1928-1991) 


Benedito Sant'Ana da Silva Freire nasceu em Mimoso, Distrito localizado no Município de Santo Antônio do Leverger - MT, em 20 de setembro de 1928, e faleceu em Cuiabá MT, em 11 de agosto de 1991.

 

Conterrâneo do Marechal Cândido Rondon, Silva Freire, foi poeta, advogado, professor na Faculdade de Direito da Universidade Federal de Mato Grosso - UFMT, e ocupou a cadeira nº 38 da Academia Mato-grossense de Letras - AML.

 

Recebeu diversas homenagens, entre elas, a homenagem do Univag Centro Universitário de Várzea Grande MT, que deu o nome deste intelectual à sua biblioteca.

 

Obras principais: Meu Chão; Pássaro Implume; As Redes; Os Meninos de São Benedito; Águas de Visitação; Trilogia Cuiabana, publicada em 1991.

 

 

Poema extraído da obra: FERREIRA, Sônia. Chuva de poesia, Cores e notas do Brasil Centrar: História através da Arte. 2 ed.  Goiânia: ed. UCG; Edl. Kelps, 2007.  293 p. com a devida autorização da autora.


FREIRE, Silva. Na moldura da lembrança. Organizador Wlademir Dias-Pino.  Cuiabá, MT: Edições Universidade Federal de Mato Grosso, 1991.  208 p.  (Trilogia Cuiabana, Volume 2: Todolos prazeres & alguns lazeres).  15,5x21,5 cm.  ISBN 85-327-0005-5  N. 08 662




 

 CERRADO / RAÍZES

 

 (Fragmento)*

 

 

—cerrado

arbusto miúdo

o ar no alto do

busto recurvo um grito no

susto da planta dos pés     

o ritmo da floração

no coração ancestral

 

— cerrado

experiência de estar no perto

/ na caixa do peito

na folha do livro

 

— cerrado

tecido telúrico/       

processo/     

ngresso na história  

e/ou

regresso atávico

no trançado que amassa

a raça         

que adelgaça

 

— nos calombos do cerrado

tempo-tropelro ...

curva-cuia (bania)

b-oiando

no liso-a-liso

do

berro

que

afoga

na linha reta do pantanal.. .

 

• FRElRE, Silva, Aguas de Visitação, Cuiabá / MT - Adu/mat, 1999  

 

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Extraído de
ALVES, Henrique  L., org.  Poetas contemporâneos.  Capa de Alfredo Volpi. São Paulo: Roswitha Kempf Editores, 1985. 
 

 

- a canoa coisifica a respiração da madeira        

         (alimento do aviso)

 

- o canto

           (beira-chão-barranco)

           responde no toque-atabaque

                    traço-truque-do  leque

                                                   membrana d’água

- a canoa circunscreve a escrita

                                  que irrita

                                   tato-peixe

- da colher do remo

                            pinga o desenvolvimento

                            do curso inventado

- a canoa trabalha a função do reflexo

               canoa                 remo

                    remoer do homem

                             canoeiro

               canoeirar o rio-equilíbrio

- o sulco ferido

                      (feriado)

                          gruda

        a negritude do aquaremo

- balanço que bate embalo

                                      pla

                                      plaque

                                      pla

                                               sono-módulo prisão-no-porto

                                                                            ou morto

- a canoa concebe

                            boca que inventa o vento

                            tempo que a fome urra

                            riso que o peixe isca

                            abrangência de mormaço

- a canoa incorpora

                            intuir a chuva

                            carne-viva vida-nova

                                       viva-vida

 

                            pose do embarque

                            tensão do emborcado

                                  iodo do Iodo

                                         Iobo 

 

- o remeiro imanta o pranto

                            no canto

                            que canta

                                           a queda do peixe

                                 limpo     limbo

                                 lama       limo

                                 lima-que-lima

                            a invenção da canoa

- a canoa insere no assento

                     o nojo do rio

- a canoa investe o lucro

                                      na transparência da sombra

                                      interior do sem-medo

                                      eventual da paisagem

                                      no corte que a linha quebra

- a canoa enfeita

                            hirto olho vela velório

                                      boi-afôgo

                            boiaafogando barriga d’água

- a canoa escritura

                            a faca da curva

                              leva-e-lufada

                            remoinho que o rio incesta

- a canoa desperta

                            esmalte da escama

                            fundição da faca

                            dependência do anzol

                            o peso que a poita aponta

- noturno

              a canoa soletra

              o enredo da pesca

 

De
Silva Freire
Águas de Visitação
Cuiabá:  Edições do Meio, 1979.  s. p. 
Col. Poetas de Mato Grosso, série      Vanguarda, I)   
[Diagramação: Wlademir Dias-Pino]

 

garimpo da infinitude
(fragmento)

— o garimpo
               vaza
   eco da sorte
no pilão da bateia


                            — o garimpo é hermético
                                estranhamente aberto
                                         ao receber o rito
                                                           hirto
                                                           mito
                                                  e o místico

 

— o garipmeiro
crava
na lavra
pálpebra / forma
que arredonda o chibiu

 

— o garimpo codifica o sonho
                             minerador
—   o garimpo decodifica  a
        leitura da mancha

 

                            — outros amigos:
                                o pai
                                              irmão
                            o                esmo
                            o                 meio
                            o    meia  -  praça

 

o garimpo talha
moe
romoe
moenda
remorrendo
na brita do sol
no brilho da vida
no budum do lençol

 

 

WLADEMIR DIAS PINO

 

O sentido de Obra (mesmo aberta) já era

 

         SILVA FREIRE não se preocupa mais com a continuidade temática (sucessão linear) como semântica lógico-discursiva, chegando mesmo à posição radical de desprezar o sentido de estrutura e, consequentemente, o de Obra. E digo isso porque numa explosão estrutura lista o sentido de lógica narrativa geralmente é conseguido por falhas na estrutura que tem como complementação a reparação dessas mesmas falhas, como equilíbrio.

 

         Essas "mesmas" falhas é que formavam a lógica, a unidade da história. Assim, na narrativa tradicional, as falhas (morais, econômicas e sociais) são reparadas no fim, como uma espécie de conclusão, e até mesmo de pagamento pelo sofrimento do personagem principal. É a moça pobre casando com o príncipe, para a estabilidade emocional do leitor. Uma espécie de objetividade da informação em justificativa de detalhes que lhe dá um ar de veracidade, em substituição à autenticidade criativa.

 

         Numa novela o texto não tem autonomia pela mesma razão de que o consumidor não tem opções de leitura. Por uma série de fraquezas o discursivo sempre tem necessidade de se impor.

 

         Em SILVA FREIRE o rigor dos vocábulos, independente  do conteúdo, se organiza no espaço conseguindo um dinamismo (condensação ótica) e uma tensão semântica (núcleo de significados) em condição de desprezar a lógica poética tradicional, para adquirir, se não uma autonomia de textos visuais, pelo menos de blocos de múltiplas e simultâneas direções de leitura: física das palavras. A densidade do rigor vocabular conseguida, visualiza a intencionalidade ao articular uma sintaxe insólita, cada vez mais densa, que faz desses blocos engrenagens de palavras em sequência móvel de aproximações. Vale dizer, da multiplicidade da continuidade: horizontal (probabilidade da língua) e a dimensão vertical (linguagem lugar geométrico). Essa identidade  formal, pioneira, é que tem causado certa confusão com uma constante de estilo.

 

          Ao destruir o sentido de obra desaparece, de maneira dupla, o estilo. Numa montagem de palavras desdobráveis, que é mais do que simples estilhaços ou acidentes tipográficos, o poeta propõe funções. As linhas/colunas de seus poemas experimentais adquirem valores e possibilidades próprias que não podem ser chamadas de versos. São vocábulos giratórios como uma estrutura de átomo. Dele já se pode dizer:

não mais o poema expressando objetos, mas o próprio poema sendo usado como objeto versátil. É quando o espaço perde o sentido de representação para ganhar a funcionalidade. Esse sentido construtivo é que nos oferece opções em lugar de hipóteses metafísicas. Com isso queremos dizer que o poeta ao desprezar as conexões gramaticais, passa a utilizar do espaço em

branco não como mero suporte das letras, mas de direções e ligações permutáveis. Assim é que a leitura de seus poemas se faz em invenção de direções dando oportunidades criativas de leituras para o consumidor, diferente da tradicional opção metafísica da interpretação. Seus poemas encerram o ciclo modernista em Mato Grosso e começa a estabelecer base para um novo rumo de nossa cultura.

 

          Particularizando: o poema, CAMPUS DE UNIVERSIDADE, ao ser dedicado para Gabriel Novis Neves, passa a esse Reitor, como um documento histórico, a responsabilidade da consciência (a idealidade em nível universitário) e a mentalidade criativa de toda a juventude matogrossense. É que hoje não existe mais barreira entre gêneros. O que

separa, nos dias atuais, um poema de uma pintura? Hoje, superado o sentido definitivo de obra acabada (estilo mais verso), e a separação de géneros, o poeta não é quem escreve poemas, mas o que proporciona ACONTECIMENTOS (HEPPENINGS).

 

 

 

SILVA FREIRE.  Águas de Visitação.   3a. ed.  Cuiabá: Adufmat, 1999.    153 p    14x19,5 cm.  “Edição póstuma”.  Col. Bibl. Antonio Miranda


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Imagem extraída  de

DIAS-PINO, WlademirA lisa escolha do carinho (Rio de Janeiro: Edição Europa, s.d. 
            20,5x20,5 cm.  33 f. ilustradas  (Coleção Enciclopédia Visual).   Inclui versos de
            poetas brasileiros



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