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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 
FERNANDO BRAGA

FERNANDO BRAGA

 

 

Fernando Braga (dos Santos), nasceu em São Luis do Maanhão em 29 de maio de 1944. É formado pela Faculdade de Direito do Dstrito Feedral, com pós-graduação em Ciência Política na Universidade de Brasília (UnB), e estágio em Direito Penal Comparado pela Universidade de Paris-Sorbonne. Publicou em poesia: Silêncio Branco, 1967; Chegança, 1970; Ofício do Medo, 1977; Planaltitude, 1978; O Exílio do Viandante, 1982; Campo Memória, 1990; O Sétimo Dia 1997 e Poemas do tempo comum, 2009.  

 

 

 

Liberdade

 

até as pedras negam

a paternidade

da terra.

 

no chão, não há reforma

nem raízes.

 

os homens fingem

acreditar em Deus,

enquanto as crianças

sonham com esfinges

e mitos,

porque adormecem com fome

 

quero uma enxada

e um arado,

porque onde piso

até as lágrimas

proliferam.

 

quero a união dos povos

e o amor de irmãos,

porque dito a paz

e não acredito em esmolas.

 

quero ajuda para construir,

esperança para modificar

e depois gritar:

liberdade! liberdade!

(Chegança/1970)

 

 

Longe noturno

 

Meus olhos emigraram para São Luís

minha cidade pavorosamente triste,

onde um meio de céu esconde o rosto

de Deus das vidraças da planície.

 

Vim aqui tornar-me em arbusto

onde sou o argonauta deste verde.

 

Morto pão esquecido sobre a mesa

foi minha ceia incrivelmente tarda.

 

Noturno vinho em resto abandonado

ferve-me o corpo hipertencialmente

reto, nesta noite sem data dalguma

safra onde me disponho não mais sentir-me.

 

(Ofício do Medo/1977)

 

 

Linhas sobrepostas ao plano

 

1

 

Do plano finito

os céus eu componho

cerrado de pedras

de aço antiplano

no verbo do nada

no tudo que exponho

exercício de exílio

desterro altiplano.

Agouros no espaço

perdidos nas dores

com o credo do úmido

em chão prateado

 

alentos de vida

em versos de amores

à vésperas da morte

o choro dourado.

Pesadelo de insônia

terrível agonia

meu rosto na sombra

do teu evangelho

naufrágio de sinos

em cruel letargia

despenco da nave

do ser-me mais velho.

.......................................................

                                                        (O Exílio do Viandante/1982)

 

No campo da memória

1

 

No campo memória,

eu aro a palavra

que se me apura;

no canto cerrado,

o poema me lavra

e se me depura.

 

E assim eu canto:

I

 

Galopa meu verso

neste canto cerrado,

em campo memória,

e vai beber nas fontes

dos Caruanas

a organicidade líquida

de São Luis,

para que eu possa

cantá-Ia neste meu desterro.

 

A ilha liberta-se

pela memória piramidal

de Bequimão

e pelo romanceiro .

de amor e morte

dos Timbiras

e da Canção do Exílio.

 

Na Quinta da Vitória,

a metáfora sousandradina

apura-se na memória

de São Luís,

como uma açafata

de pedra e cal.

 

Ah! minha cidade!

 

Quero estar

nestes versos

por quilombos

escravos.

na dimensão

de sombras,

onde atreva

entrave,

na entrevada

raiz.

(Campo Memória/1991)

 

Fernando Braga

 

De
Fernando Braga
POEMAS DO TEMPO COMUM
São Luis: Edição SECMA, 2009.  115 p. 
Prêmio Gonçalves Dias de Literatura - Poesia


 

Poema essencial

 

A mensagem que trazes no rosto

diz-me de auroras em redor da vida,

e da dor que choras pelo teu herói.

 

Um véu de solidão te mata o sorriso

e dos teus olhos crispam fogo e luz.

 

Teus lábios me levam às paredes

das bordas conventuais, bronzeadas

com a textura das idades eternas.

 

Ajoelho-me diante do místico oratório,

e reverencio-me ao deleite antigo

                     das pernas sem portas.

 

 

 

Pesca com meu filho

 

Eu e meu filho Nando vamos á pesca

no Rio Corumbá...

 

Na paz líquida da expectativa,

lembro-me dos versos de Raul Bopp,

quando o Nando, em um tom curioso estabelece

este diálogo:

 

- Pai!

- Quéque-tu-qué, meu filho?

 

E ele se achegando a mim como os olhos brilhando,

fulmina esta pergunta:

 

- me conta mais uma vez, pai,

como é mesmo o Mar de São Luís?

 

 

 

  Na madrugada em que José Ribamar de Silveira

    foi voar na zona do meretrício e teve as asas

      derretidas pelo luar de prata de São Luís.

 

José Ribamar de Silveira

servidor da Estrada de Ferro

         São Luís-Teresina

uma certa noite vestiu

o terno de linho branco,

               perfumou-se

e foi dar uma volta

na Pensão da Maroca,

na zona do meretrício.

 

Lá pelas páginas tantas,

José Ribamar de Silveira

encontrou-se com Rosidete

e com ela bebeu e dançou

            a noite inteira,

quando, então, de madrugada,

a comeu com inhame e mel.

 

E quando tudo já se passara,

José Ribamar de Silveira

    Cansado de ensaiar

             o mais que perfeito,

subiu para o mirante do sobrado,

e lá resolveu imitar o Zelão das Asas.

 

E se jogou. Levou consigo

alguns arranjos de faiança,

bicos de telhas e pedaços

de ripas.

 

E todos, mulheres e fregueses,

e mais sádicos e masoquistas,

         e gigolôs e vadios,

levantaram os olhos para o céu

para verem o que não acreditavam.

 

Até o Jeremias deu uma trégua

               à patrulha da polícia,

para que os soldados comandados

pelo tenente Vieira,

         assuntassem aquele anjo

                  de estranha espécie,

e tivesse olhos de ver.

Depois, o estrondo e o silêncio.

 

José Ribamar de Silveira

           caiu de bunda bem no meio

     da Praia do Desterro,

por onde os holandeses

                       invadiram a Ilha.

 

E ali ficou besuntado de madrugada

                 e mareadinho de sereno.   

 

 

 

 

 

BRAGA, Fernando.  O Puro longe. Poemas.  Caldas Novas, GO: Editora Gráfica Criativa, 2012.  83 p.  12x20 cm.  Col. A.M. (EA)

 

 

O homem em círculo

 

A roda gira a gerar o giro

do círculo, que prende o grito

no giz do risco.

 

Gestos causais do nexo,

pedras de sal-gema e sexo.

 

Mordaças a morderem

as máscaras,

por trás dos muros,

no varal do tempo,

para que a palavra ou o grito

se liberte, túrgido e trêfego,

era assim que entendia o poeta

de A Terra Devastada,

porque enquanto gira,

o mundo se transforma.

 

 

Sonho de um talvez

 

Há qualquer coisa em mim

a dizer-me o que sou...

 

Cá bem por dentro de mím,

a roer-me, uma fantástica

coisa que não tem nome

diz-me que é isso o que fui.

 

E me vejo numa multidão,

de azul desesperadamente

entre pessoas que nunca vi...

 

Não me sei, talvez, ou poeta,

ou a dormir sem acordar nunca.

 

 

O que somos

 

Sou feito de sangue e vísceras,

como o porto é feito de choro e pedras;

 

Sou feito de tronco e membros,

como o navio é feito de ferro e esperas;

 

Sou feito de carne e ossos,

como o mar é feito de sal e abismos;

 

Sou feito de razão e sentidos,

como o rio é feito de margens e mangues;

 

Somos todos poetas de espaços contidos,

feitos de sonhos e ajustes...

 

 

A dimensão do tempo

 

Pousa um pássaro

no fio do telégrafo.

 

O pássaro é pássaro,

nada além que pássaro.

 

O Morse não há mais,

apenas só no espaço,

o poema e o pássaro...

 

O poema em si existe,

agora, também o mouse,

na dimensão do tempo,

 

mais ainda leva o vento

a pipa e o barco lento,

 

pelo imenso do não sei onde,

ou pelo intenso do nunca mais!.

 

 

 

  

BRAGA, FernandoMagma.  Goiânia, GO: Kelps, 2014. 78 p. 15x21 cm.   ISBN 978-85-400-1119-9   “ Fernando Braga “  Ex. bibl. Antonio Miranda

 

 

EXERCÍCIO DO AVESSO

 

Quero apenas estar-me longe,

do ser-me que me quer tão perto

e ser levado como folha ao vento

dos fastios que de meu recendem.

 

Bem longe, onde estarei por certo,

sentir-me salvo dum outro quando

e reinventar-me n' outro ser humano,

n' outro poeta, e n outro Fernando.

 

E voltar mais breve e inconsútil,

sem querer-me mais-que-perfeito,

do que fizera, quisera, fora e era...

 

E repensar no que já me passara

a soltar-me do que já me prendera

e viver mais do que já vivera!    

 

 

ALÉM DO VERBO

 

Estou no meio do verbo

que me divide, eu sou e fui...

De pele e osso cobri-me

e serei de sobras;

não me trouxe e nem me levei,

fiquei comigo,

com meu tempo e modo,

sem dividir-me,

por isso, indizível, sobrevivi.

Minhas duas metades

são cartesianas

e separadas por alguns graus...

Não sou integralmente inteiro,

porque um olho fugiu do outro,
para deixar esse outro a vaguear;

e eu, sozinho, no resto ou pouco,

apenas vejo minhas circunstâncias

através dos óculos de Sancho.

 

 

 

 

 

 

Página preparada por Zenilton de Jesus Gayoso Miranda e publicada em outubro de 2008; ampliada e republicada em maio de 2010.; ampliada e republicada em setembro de 2012. Ampliada e republicada em dezembro de 2014.



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