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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

POESIA GOIANA

Coordenação de SALOMÃO SOUSA

  

 

JOSÉ DÉCIO FILHO

(1918 — 1976)

 

 

Nasceu na cidade de Posse (GO), em 08 de janeiro de 1918, e faleceu na cidade de Goiás, em 04 de julho de 1976. Fez o primário em sua cidade natal e em Formosa, e, o secundário, no Lyceu de Goiás.  Na década de 40, atua no nos jornais O popular, Folha de Goiaz e Tribuna de Goiás, e colabora na revista Oeste, que muito contribuiu com a formação modernista em Goiás. Em 1960, os intelectuais indicam seu nome para o Departamento de Cultura, atuando nesse órgão por muitos anos junto à Secretaria de Educação e Cultura de Goiás. Gilberto Mendonça Teles, no livro A poesia em Goiás, assinala que a poesia de José Décio Filho é bem representativa do segundo momento do Modernismo, da fase construtivista, filiada a Carlos Drummond de Andrade, por isso “que, tecnicamente, a sua linguagem poética se filia a esse ritmo natural, amétrico — preciosas contribuições estéticas do Modernismo à literatura nacional”.

 

Bibliografia: Poemas e elegias, de 1953, Prêmio Bolsa de Publicações Hugo de Carvalho Ramos.   

 

 

POEMA VERTICAL

 

Dei um mergulho em mim mesmo,

num pulo de cabeça a baixo.

Tudo lá no fundo está quieto

como os caminhos abandonados;

a paisagem esfumou-se e confundiu-se

num apaziguamento de cansaço.

 

Perdi-me nos atalhos sedutores,

gastei linhas retas e curvas,

inquietações e deslumbramentos.

De místicas visões e amargos projetos

fiz um montão de cadáveres.

 

Quanto trabalho perdido,

quanto tempo dissipado!

Mas de tudo que ajuntei

na mais lírica desordem,

alguma coisa houve de ficar,

alguma coisa que às vezes

se resolve em minha poesia ou em silêncio.

 

 

ELEGIA FEITA NO CÁRCERE

 

Eu conheci a noite

no segredo de todos os seus tormentos.

Vi também as auroras

vestidas de orvalhos.

 

Os animais — entes meus irmãos

me contaram os mistérios

de minha mãe terra.

Os peixes estão dormindo

no seio escuro das águas.

Os pássaros estão cantando

para acalentar minha tristeza

que é o peso do mundo.

 

Do seio profundo do sol

busquei para meus olhos

essa luz inextinguível.

 

Fruí teus beijos

e de tantas outras,

que nem sei quem o amor

há de me trazer

para o meu eterno consolo.

 

Não estou cansado,

mas os homens que tanto amei

me algemaram à solidão.

Vou encontrar a mim mesmo

no fundo da minha origem,

eu voltarei um dia.

 

 

GOIÁS

 

Goiás... que nome largo e longe!

Se o pronuncio da janela

para a noite infinita,

o vento toma-o da minha boca

e o leva aos confins da terra azul.

Lamento, suspiro, convite,

dor gostosa que arrepia os cabelos.

 

Goiás é nome — calor, tão materno

qual sombra de mangueira.

Balanço de rede de buriti

no rancho de palha.

Brisa nos canaviais,

cantiga de roda em noite de lua,

aboio de vaqueiro nos gerais,

trovão longínquo percutindo

na minha nostalgia.

 

E é muito Brasil

assim novo e antigo,

primitivo, alegre e triste,

com suas tolices enxutas, ágeis,

lirismo fundo e manso,

admiração irônica, engraçada,

amor calado, espinhoso,

ternura desajeitada e fremente. 

 

 

BELA VISTA

 

A Leo Lynce

 

Manhã cheia de pássaros cantando

na fronde fresca

das jabuticabeiras dadivosas.

 

À tarde, no ar lúcido da praça,

uma andorinha plaina bem alto

e desce qual uma flecha

para pousar mui tranqüila

na torre cinzenta da igreja.

Ninguém aplaudiu!...

 

 

INEXPLICAVELMENTE

 

Eu não precisava de luares,
porque eles fazem sonhar perdidamente
e eu já tenho a cabeça pesada de sonhos.

Não precisava do teu indeciso amor,
porque o meu amor é imenso e vário,
transbordante e humilde.

Não precisava da ternura
que esperei dos teus lábios,
porque uma voz mais legítima,
voz que se perdeu nas distâncias,
já derramou nos meus ouvidos
rios de consolo e de afeto.

Alegrias, torturas, aflição,
mágoa violenta e crispante,
solidão, desdém, insultos,
noites e manhãs virginais,
caminhos de sombra e de luz,
esperanças, paisagens e ruídos,
esperanças que não mais se esgotarão.
De nada disso eu precisava,
pois tenho tudo dentro de mim
como dádiva do mundo
e herança de outras vidas.

Mesmo assim, porém,
tudo isso procuro ansioso
pra me afligir ainda mais,
para ver se transbordo de uma vez!

 

 

DÉCIO FILHO, José.  Poemas e elegias. 3ª. ed.  Goiânia, GO: Caminhos, 2014.  128 p.  13x18 cm.  ISBN 978-85-68071-02-1   “ José Décio Filho “ Ex. bibl. Antonio Miranda.

 

 

MULHERES E ANGUSTIA

 

As mulheres estão na rua.

Eu apenas olho vagamente,

adiando possíveis aventuras.

Não adianta olhar, mas olho,

por hábito ou porque me atropelam,

às vezes por simples angústia

ou congestionamento de tristezas.

 

As mulheres passam aflitas

às seis horas da tarde.

Algumas sorriem sem endereço,

outras se fecham e abrem caminho,

como recém-vindas de atos culpáveis.

São raras as tranquilas e redimidas,

e os anjos não aparecem.

 

Grande confusão de pernas:

brancas, pretas, morenas, incolores,

pernas que me comprimem o sexo,

amassam-me o ventre e os rins.

Os olhares convergem, divergem,

mordem ancas, seios, braços.

E luta rápida e mórbida,

e da fome erótica das ruas.

 

Amanhã, na repartição,

verei desesperadamente mais mulheres,

que estarão sorrindo, comendo, falando.

Depois batucarão constrangidas

os altos apreços e cordiais saudações.
A noite virá o amor e o sono,

ou mesmo a insónia e o desamparo.

 

 

ACALANTO

 

Hoje estou cansado.

Andei tanto, pensei, recordei,

diluí-me na paisagem,

vadiei pelos céus, pela terra,

pelas águas adormecidas

em sombrias profundezas.

 

Hoje estou exausto

como se meus ombros humildes

carregassem o mundo.

Fique pois quieta, minha amada,

e em teu silêncio palpitante

repousar-me-ei agradecido

 

como a ave que encontrasse o ninho.

 

Debruçar-me-ei delicadamente

na tua ternura inaudível,

olvidarei teu sexo-prazer,

que será símbolo e destino,

recriação da beleza,

magnitude e renovação,

vasto caminho do amor.

 

Fique bem quieta ao meu lado

como se eu apenas existisse

na tua lembrança comovida.

Quero que sejas para mim

como a sombra de uma árvore

ou um rio de outrora.

 

Nesse intenso abandono,

propiciemos a nós mesmos

a participação mais profunda

no seio do desconhecido

apenas adivinhado.

 

Depois, sairemos novos e desprendidos,

serenos e invencíveis

quais frutos da eternidade

amadurecidos pela noite.

 

 

 

Página republicada em junho de 2015.



 

 

 
 
 
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