POESIA GOIANA
Coordenação de Salomão Sousa
JOAQUIM MACHADO FILHO
Nasceu em Luziânia (GO). Publicou os livros A construção da semente e O pássaro que inventou a solidão (1982), que foi Prêmio Bolsa de Publicações Hugo de Carvalho Ramos. Fernando Mendes Vianna julgou-o um poeta “sensível, lírico e humano diante do mundo e da vida. Joaquim Machado não bolina a poesia. A possui toda, gulosamente. Corpo e alma.”
NATUREZA MORTA
Um dia secou a primavera
As cigarras envidradas
emudeceram perpendiculares
nos caules do seu chão
As guitarras secaram
no tronco de suas origens
Apenas o cheiro da resina
retinha o último vestígio
na vertente de enxames exaustos.
POEMA INACABADO
Prenúncio do cio
o céu — um silo de nuvens
na grota gargarejava o igarapé
No rancho
a candeia envolta
pelos gomos das mãos
Os relâmpagos,
ariscas varizes
trincavam a noite
e muito longe
regorgitava o trovão.
As abelhas
na tenda das colméias
misturavam pólen, aroma
e resinas amarelas,
enquanto os grãos falhavam
na disritmia das espiga
Nas narinas do chão
dormem as formigas.
Ardem à toa as labaredas no fogão.
PRECE
Devolva a pedra ao monte,
a lã à ovelha,
a estrela ao céu.
Não colha o fruto de vez,
a colheita espera.
Não machuque a haste da manhã,
a noite não tarda.
Devolva a pedra ao monte,
a paisagem à linha do horizonte.
Nada lhe pertence,
nem as rosas
caídas no amanhecer.
Não colha, eu lhe peço,
o crepúsculo de véspera,
não machuque a haste da manhã.
BALADA DO MENINO TRISTE
O menino cresceu
intrigado com as coisas
Sabia do céu
que existia
mas que não via.
Sabia da menina
que tinha
mas que não via.
O menino cresceu
na ansiedade louca
com a menina nos seus olhos
e o céu na sua boca.
Página publicada em fevereiro de 2009 |