POESIA GOIANA
Coordenação de SALOMÃO SOUSA
EVANGELINO MEIRELES
( 1882 – 1922 )
Profissão: Funcionário Público - Serventuário da Justiça
Nascimento: 10 de fevereiro de 1882, Santa Luzia (Luziânia), Go.
Residência: em 1882, Santa Luzia (Luziânia), Go.
Filiação: Salviano Alves da Costa e Brígida Alves Meireles
Vida Política e Parlamentar Deputado Estadual, 9ª Legislatura (1921-1924); Líder da maioria, gov. João Alves de Castro.
Outras Informações: Um dos principais lideres do Partido Democrata. Tabelião em Luziânia.
Publicações: Almanaque de Santa Luzia. Um dos principais colaboradores do jornal ‘O Planalto’, editado em Luziânia.
Falecimento: 1 de dezembro de 1922, Luziânia, Go.
Poema extraído de:
ALMANACH DE SANTA LUZIA / organizado por Evangelino Meirelles e Gelmires Reis. Typographia d'O Planalto (1920)
NA FONTE
Nas praias sedosas
De gramas mimosas
Da célere corrente
Diviso corada,
Já muito cansada,
Donzela ridente.
Vestida de tanga
O braço sem manga,
Vem a pobrezinha.
E lá numa sombra
Sentada n´alfombra
Está a avozinha.
Depois vem chegando
Alegre, cantando,
O mano José
Que traz os bolinhos
Redondos, quentinhos
E o rico café.
A virgem febril,
Vermelha, gazil,
Achega-se à avó.
E todos, contentes,
Os bolos inda quentes
Devoram sem dó.
Paixão visionária
Morrera minha noiva.
Eu, triste, alucinado,
Vagava aqui, além, de dor contaminado.
E, nesse vaguejar de louco, em certo dia,
Fui ter-me a campo agreste, eu só, sem luz, sem guia.
Era bem noite já, fazia em derredor
Silêncio tumular de agoiro portador.
O tom crepuscular que afaga o ocidente
Após a queda imensa do Astro-Rei potente.
Baixara além, nos Andes, às águas do Pacífico,
Deixando atrás de si um estrelar mirífico.
Um bufo gaguejante, ao lado meu, tristonho,
Vibrava um salmo triste, a resvalar, medonho,
Um divergir de idéias em pandemônio irado,
Bailava tenebroso em meu pensar cansado...
E sempre resistindo àquela tentação,
Andei aqui, ali, em plena indecisão.
Já pela madrugada, ao despertar festoso
Do passarinho álacre, na embriaguês do gozo,
E quando no levante, em áureas pinceladas
Estratos se pintavam ao som das alvoradas,
Resolução cruel na mente entontecida
Se me antolhou sinistra e forte e decidida:
— Morrer às próprias mãos!...
Era este o meu recurso,
Era esta a apelação,
Para terminar o curso
De minha grande dor...
E firme, resoluto,
Os olhos a chispar, sem perda de um minuto,
Um cano niquelado e frio e assassino,
À fronte, então uni,
O meu atroz destino
Ia fechar-se ali.
Mas antes da explosão,
Um vulto de mulher, em forma de visão
(Talvez a minha amada), junto a mim parou.
E teso, muito ereto, os lábios descerrou.
E num falar cortado e triste e pavoroso,
Deixou sair do peito, em ritmo vagaroso
Esta oração funérea:
"Mortal, não sejas louco;
Aqui no velho mundo o teu viver é pouco,
E assim cortar o fio da vida, que é só uma,
É contra a natureza, é contra a régia e suma
Vontade do bom Deus, em cujo seio habito
Na grande paz etérea e pura do infinito...
Vai-te embora feliz e não perturbes mais
Aquela que hoje frui prazeres imortais.
Essa afeição carnal, da terra o baixo amor,
Nos páramos de Deus, não tem nenhum valor".
Depois de assim dizer, a tal visão gelada
Na brisa evaporou-se e eu não vi mais nada!
Ainda hoje, com franqueza, bem me custa a crer
No estranho "rendez vous" daquele amanhecer...
Página publicada em dezembro de 2019
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