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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

POESIA GOIANA
Coordenação de Salomão Sousa

CIDA ALMEIDA

CIDA ALMEIDA

Nasceu em Jandaia (GO) a 28 de setembro de 1961. Passou a infância entre temporadas na fazenda e os quintais das casas onde residiu em Campinas, a antiga Campininha das Flores, bairro que surgiu antes de Goiânia. É formada em Comunicação Social — Jornalismo e Direito pela Universidade Federal de Goiás. Jornalista com mais de 20 anos de profissão, foi repórter dos jornais Diário da Manhã e Correio Braziliense (Sucursal de Goiânia), Gabinete de Imprensa da Assembléia Legislativa e Universidade Estadual de Goiás. Atualmente dedica-se à assessoria de imprensa e fotografia.

Escreve sobre literatura para sites de cultura e mantém os blogs Caixinha de Alfazema, Cartas do Paraíso e Diálogos da Esfinge, onde publica crônicas, poesias e outras invencionices.

Bibliografia: Flor da Pedra (poesia), Editora Kelps, 2008; mais de 170 colaborações publicadas no Overmundo (maior comunidade virtual de cultura do Brasil), entre poemas, crônicas, artigos e fotografias.

 

CIDA ALMEIDA

A flor da pedra

Bem-me-quer
O querer aflito das pétalas
Ao contrário das voltas
Do meu redemoinho
Palavras palpitam na nudez
Da tua boca de mil cavernas
Em que me perdi e ainda rastejo
Réptil à procura de fendas
Onde brotas medrosa
Onde extingo
A palidez dos dias breves

Mal me queres
Se mal me olhas
Varando por dentro tempestades
Dessas de fazer tremer a razão sóbria
De um copo d’água
As tempestades estão aqui
Na palma da minha mão e são tuas
Noites! Ah, as noites que não te conto
Dessas distâncias palmilhadas
De muro e partidas
Exílio

As espirais da pedra e do sono
Os abismos tecidos com palavras
No fosso dos silêncios
Na fissura das esperas
No desamparo das ausências
Essa coragem sozinha e inútil
Às vezes ternura
Às vezes fundura
Às vezes nada

Um sopro na escuridão
A triturar a flor de todos os enganos.

 

A faca e o diamante  

Afio a faca numa pedra de diamante
O aço e o carbono exigem cortes
Impossíveis dentro da tarde
Em que mil correntes rangem
Mas a que me desespera
Reclama o elo que partiu
O outro lado da ponte
Aquece a espera de um tempo frio
Mudo e ignorado. E isso é eterno!
 

A faca que afio

Contra os fios que não alcanço
Contra a eternidade do diamante
Onde adormecem as luzes raras
Onde a única possibilidade de corte
Está na carne e na tormenta da alma.
 

A faca afiada tilinta
E perigosamente risca
Rompimentos no cristal da tarde
Na raiz das palavras e das artérias
A faca pulsa
Entre dormências e sonhos
A tosca lapidação das feridas
Aquece a tarde
E eu vibro.

 
Senhora da escultura

Uma velha de cócoras
Encolho-me até o limite do feto
E fecho o círculo
A corrente
As algemas
A gema
E a dor de me parir
Sem mãe
Sem luz
Sem sombra
De cócoras dentro do invólucro
Rasgo as minhas entranhas
E liberto todos os espasmos
Os fluidos da incerteza
E tateio um corpo que é só meu
De uma existência sem peito
Sem a manipulação do choro
Sem a mão segura para tocar
As primeiras flores
As diluídas alegrias e todos os dissabores
Da engambelação do leite
De cócoras, ainda, ouço a voz
A única voz e é toda minha
Com essa melodia estranha
Presa como um choro na garganta
Mas sei que não é tempo de choramingo
E engulo a primeira tempestade
Dessa existência em minhas mãos
Ergo a cabeça e abro os olhos
E a luz não é mais uma incompreensão
Para aprendizados de uma vida inteira
E não me queima mais as retinas
A fúria das manhãs
A minha escultura, e de mais ninguém
Silenciosamente erige-se dessa posição
De feto envelhecido
De vida de cócoras
E a coluna vertebral range
Com todas as dores do meu parto
E não engatinho mais
Os primeiros passos
Pulam o lento balé de quatro
E vôo nua
Senhora da minha escultura
E dos meus movimentos
Contra o vento
E desfeita da necessidade
Do véu de qualquer certeza.

3/7/2006

 

A pedra

Ribanceira, a pedra
Ribanceira, o dia
Ribanceira, a peneira
Ribanceira!
Um homem garimpa
Na garupa do dia
Pedras miudinhas no vazio da peneira
Ribanceira!
Eu espreito e temo o rolar da pedra
No rolar das pedras do dia
A pedra grande
A impensável pedra
Na fundura da espera
Eu espreito e temo
Eu convivo
Na garupa dos dias
Esses galopes
A vida na peneira
Dos dias, a pedra
No vazio da peneira
Os dias, a pedra
Esse ofício de mãos
Na ilusão da peneira
Na dureza da pedra
O tear trançadinho das fibras
Às vezes inútil a peneira
Cato o precioso irreal da pedra
E tamborilo os vazios
No galope dos dias
Espreito o rolar da pedra
Na ribanceira do meu medo
A pedra inominável
A inarredável pedra.

(1/6/2007)

 

Amendoim, a poesia da vida

         Pra Mário de Andrade e sua poesia

 

O poeta come amendoim
E come a prosa
E mói o verso
O poeta todo prosa
Come amendoim
E seca o verso
O bagaço lírico
A casca grossa da vida
O poeta come
Amendoim de poesia
Palavras torradas na pedra
Palavras moídas na pedra
Palavras travadas na pedra
Come o poeta
A palavra que não quer morar
Na solidão do dicionário
A palavra da rua
A imagem poeirenta do homem da vida
O homem enlameado e gastado da vida
Come o poeta o crocante amendoim
Do homem do sonho come o poeta
O miúdo amendoim dos dias vãos
Rimas pobres da vida na gangorra
Doce gangorra do amor e dor
Gangorra de onde se apanha a flor
Tamborila entre um amendoim e outro
Tamborila entre um verso e outro
O amendoim metafísico
No indizível gozo da língua estala
(A minha é brasileiríssima pátria!)
Crotcrotcrot, ávido o poeta.
Crot, crot, crot, molengamente...
Crot; dor de dente.
Crotcrot... Torradinho!
Espana o poeta casquinhas de eternidade
Que pulam o vazio interminável do tempo
Que atravessam o homem da vida
Que apagam o homem do sonho
Casquinhas tostadas de eternidade
No lirismo do papel
No lirismo da celulose e do carbono
No sopro divinamente humano da poesia
No sopro humanamente divino da palavra
O verbo do princípio do mundo
O verbo da comunhão com Deus
O verbo do suor, do pão e do pó
E a melhor poesia da vida
Come o poeta
Que come amendoim
O amendoim sagrado da poesia de cada dia
Dai-nos hoje e sempre
Se possível, com inspiração
Senão, ah, poeta!
– Mãos ao barro virgem da palavra.
Transpiração!
Atenção ao verbo do suor, do pão e do pó
A poesia não faz cerimônia nem tem hora
Andarilha, ela salta do trem, dos passos do menino descalço
Da natureza morta, da moita onde copulam em falta o dia e a noite
Da casca do seu amendoim, amigo!
Ela vem e se falta o pulso exato de retê-la
Na teia amorosa da beleza de cativá-la
(Sei disso por experiência: há que se esmerar por demais no cativeiro!)
Ela vai embora, simpl
smente se esvai, sem fazer cerimônia, toda prosa
Come o poeta
Que come amendoim
O amendoim sagrado da poesia de cada dia
Dai-nos hoje e sempre
Crotcrotcrot, amém!

(22/6/2007)

 

Rezo

         Para Adélia Prado

Que dor, que pétala, que flor!

(Salmodrummondiando)

Coloco a mão no peito
Bem onde dói e choro
Essa dor ressentida dos dias
O que doerá sempre e nunca brandamente
No balanço das horas findas
A minha dor
A minha pétala
A minha flor
Esse sopro no abismo
Que flutua dentro de mim
E rezo
Como se beijasse
A indelicadeza das horas.

 

Dias líricos

O chão vermelho
Socado pela batida dos passos
Pela avidez da vida e do coração
Comendo a poeira fina
Daqueles dias líricos

Os dias líricos
Com o gosto de poeira fina
Na minha alma suada
E a beleza da luz espetando a casa
Nas frestas da madeira
Os contornos da alma

A mulher na janela
Uma criança no braço
Um homem na roça
Os bois pastando
A espera

Exalavam cheiros
Os dias líricos
Lembrança que chegou antes
Da primeira palavra
Dos primeiros passos
Dentro de um saco de linho
Para cortar o medo da vida
Flores do campo e ervas do mato
O ruminar incansável dos bois
O fascínio do pássaro sem cauda
Uma estradinha sinuosa
Que dava sempre nos mesmos lugares
Atrás da casa

O frescor das novidades do quintal
O mesmo mundo
O mesmo poço da alma
Sem saber ainda que fosse alma
E que me habitaria
No sempre depois
Dos dias líricos
Dos dias todos
Um lírio
Na mão do tempo mágico

A memória fantástica
Possuindo a alma antes
Dos olhos aprenderem a ser
E a ver de dentro, como vejo agora

Os dias líricos roubaram
As algemas do mágico do tempo
E se prenderam pra mim
Para a liberdade de um dia assim
De plenitude e reverência de rei
Que espreguiça no parapeito
De uma janela antiga
Aberta para todas as esperas

Do bicho que passa
Da flor que se abre e murcha
Da chuva que cai e escorre
Da alegria que beija
Da dor que vem na aba da vida
Do chapéu do meu avô, que flutuava no meio da boiada

Do homem que vem da roça
E caminha para o nunca mais
– E eu amo o cheiro do seu suor, o primeiro amor do meu nariz, e amo também a sua voz, que embalou os meus sonhos com histórias de um tempo de reis, princesas e rosas.

Da mulher que sempre esteve na janela
E pulou para dentro de uma no infinito
Dos filhos que desceram do braço
Da vontade danada de chorar que me pega nesses dias de lirismo antigo
Aí, escancaro mais a janela
E rumino como os bois que pastavam na minha paisagem.

(2/6/2006)

 

 Segredo

Ela troca de silêncio
Ela troca de segredo
E faz mistério do brinquedo

Quando ela troca de silêncio
Quando ela troca de segredo
Quando ela brinca de mistério
É quando mais penso nela

Na troca de silêncio
Na troca de segredo
... Silêncio e segredo beijam-se
Na mesma pele macia da palavra

Ao vento da poesia.

 

Pela poesia nossa de cada dia 

Rezo poesia
... Pela enluarada manhã
... Pela tarde arregalada de sol
... E pela assombrada noite 

Rezo a poesia que me reza
Credos do sono e da pedra
Na poeira da eternidade
Das palavras breves 

Rezo poesia
... Ramos fecundos
de tristeza
... Ramalhetes de delicadas alegrias

Rezo palavras toscas
... Tempo lavrado
em carne e osso
... Templo de rimas cruas
Alma 

Rezo os dias idos
Os leves dias de poesia
Esse suspiro de Deus
Afagando o barro mole
Da volátil escultura... 

Rezo pela criatura
Atolada na fundura
De Deus sem explicação...
Rezo pelo pó dos ossos
Depois do fim dos ossos
Rezo pelo pó da palavra
Depois do fim da linha
Rezo pela perenidade do passo
Depois de extinta a memória dos passos 

Rezo poesia
Na pedra fria
Da bruta lápide
A impossível espera
Que caminha solene 

E reza a mais dura poesia
Uma escultura de osso
E palavra... Do pó ao pó
A poesia
Sopra de hálito em hálito
Um suspiro de humanidade
Vôo sem ave-marias
Asas sem pais-nossos
Palavras despertando das cinzas
As horas mortas
Da volátil escultura 

Volátil  

Rezo nessa manhã tão minha
A poesia de um olhar
Que escorre no vão da pedra
E brota flor
Enquanto contemplo a paisagem
Enrijecendo na janela... 

Volátil criatura.

 

Palavra de mover montanha

(Poema recolhido na ventania das ruas)

 

Toco na poeira das ruas: imagens cruas
Toco na poeira do tempo: imagens nuas
Na poeira das ruas: imagens cruas me tocam
Na poeira do tempo: palavras nuas me entalham
Na poeira de tudo: o pó das ruas
Na poeira de mim: o pó purificado das cinzas
(frágil escultura no sopro tortuoso de Deus)

O pó na perenidade do tempo
Das minhas palavras ao vento
Que movem, de leve, bem de leve
A dureza inominável da montanha.

(14/5/2007)

 

Carpintaria

Pulvus et umbra sumus

Um serrote, um punhado de pregos e tábuas para um caixote.
Uma imagem, um punhado de dor e palavras para um épico.

Espalho, embaralhando a vista
Serrote palavras pregos imagens tábuas dores e a vaga idéia de um caixote.
Espalho-me e embaralho a vida.
Impulsivamente vou triturando as tardes
No vai-e-vem do serrote a madeira tosca da vida
Monótona a cantiga do exercício em que dou duro
Na madeira temperada para o corte.
Inebriante é o perfume que exala da madeira machucada.
Sigo o perfume dos dias tenros e vou amontoando tábuas ao sol cáustico
Da vaga idéia de um caixote.
E aquela inamovível crença de um punhado de pregos tilintando no bolso
Moeda aliciadora para trocar por ouro no fim da linha.
Esqueço os pregos
Vivo a embriaguez dos dias tenros à exaustão dos sentidos
Vou ficando esperta, expandida e eloqüente
Animando palavras para tocar matéria vertente.
O serrote nunca esteve em minhas mãos.
A lucidez cortante no finíssimo cristal da noite.
Havia me esquecido, pó completo
A ilusão embaralhada entre tábuas pregos serrote imagens dores e palavras.
Eu, que pensei que dava duro na madeira, descubro o nó profundo
Ali, inarredável.
Tudo ao contrário.
A madeira sou eu, humildemente servindo ao corte e suas profundezas.
E a vaga idéia que me animava os dias, o seguir em frente
Vai mostrando ferrenhamente os cantos
A profundidade do passo
Uma escultura que se esculpe sozinha
O meu caixote.
Eu, que guardei tanta coisa, tanta dor e palavra.
Eu, que fiz da vida versos endiabrados, esculpi estilos e ousei carpintarias
Velaria, pacificamente, as águas turvas?
Não, claro que não. Ainda tenho os pregos.
Os pregos que tilintavam no bolso, roçando sedutoramente as coxas
Com a idéia de troca por ouro no fim da linha
A lucidez ressoando cortante no finíssimo cristal da noite.
Foram-se os pregos junto com os dias perfumados de esperança
A madeira machucada
O pó calcificado dos sorrisos na memória irretocável dos dentes.
Poeira
Matéria vertida do fundo do poço da vida.
Poeira vermelha do que se gastou e se esculpiu
Na lâmina frágil da corrente sanguínea
Misturada à paz da terra
O barro, origem da mãe-terra, para a palavra quente do meu corpo
Pó precioso da vida
Calcinado retorno à eterna caverna
Poeira liberta do caixote do grande medo
Espalhada ao vento que sopra as tempestades dos meus prosaicos dias
Burilados entre versos no atrito de aço do que tilintava no bolso
A fixação das pontas
A vaga idéia
Anima e animus se fundindo na lama do esquecimento
O incontornável nó cósmico.
E me anima como nunca a vaga idéia
O perfume dos dias breves
A poesia da vida que escorre indiferente ao poema e ao caixote.

E tilinto para a posteridade do esquecimento.
A poesia da vida segue se esculpindo, indiferente ao poema e ao caixote.

(25/7/2007)

 

Página publicada em fevereiro de 2010

 

 


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