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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


  

POESIA GOIANA

Coordenação de Heleno Godoy

 

 

Fonte: http://www.ubebr.com.br/


CARLOS FERNANDO FILGUEIRAS DE MAGALHÃES

 

Nasceu em Paratinga (BA), em 17 de outubro de 1940. Bacharelou-se em Medicina pela Universidade Federal de Goiás. Fez parte da equipe da revista Projeto Práxis, onde publicou vários de seus trabalhos. É um dos membros da instauração do Movimento Práxis em Goiás. Tem se destacado como crítico de teatro, literatura, cinema, artes plásticas e história da arte. Professor na Faculdade de Medicina de Goiás e Conselheiro de Cultura do Município de Goiânia. Pertence ao Instituto Histórico e Geográfico de Goiás.

 

Bibliografia: Matéria Prima, texto-poema práxis, Departamento Estadual de Cultura, Goiânia, 1968; Via Viagem, romance, Departamento Estadual de Cultura, Goiânia, 1970; Daniel, contos, Oriente, Goiânia, 1976; O Jogo dos Reis, teatro, Oriente, Goiânia, 1978; Eros, poesia, Presença, Rio de Janeiro, 1986; Quarks, poemas, Editora da UFG, Goiânia, 1993; Lampião, texto-poesia para ópera, publicado na Revista Goiana de Artes; Perau, poesia, 2003.

 

A professora Maria de Fátima Gonçalves Lima, ao estudar o livro Perau, diz que “A poesia de Carlos Fernando representa o espírito da lírica contemporânea e, como tal, se afasta da meditação dos conteúdos inequívocos.”    (Apresentação: Salomão Sousa)

MAGALHÃES, Carlos Fernando Filgueiras de.  Eros : poemas.  Rio de Janeiro: Presença, 1986. 93 p.  14x21 cm.    Capa: Eros e Psichâ, escultura de Antonio Canova.   “ Carlos Fernando Filgueiras de Magalhães “  Ex. bibl. Antonio Miranda

 

flor da pele

 

as mãos voam,

os pensamentos caem.

 

seixos rolados

de profundas insânias.

 

mas o desejo é louco e se insinua

entre teias e veias,

toma o Sopro que advém

          do espanto.

 

no toque desta pele algo

estremece,

de súbito, a água se agita

no fundo.

 

Narciso se debruça:

apenas olho a doçura.

 

 

geografia

 

mala sol está se levantando

e porque dormes

sobre tua cabeça resplendor

 

eu viajo de olhos bem abertos

e tua luz me cega

 

na paisagem que vejo

teu corpo é veleiro desgarrado

sem porto nem distância

 

agora

ilha de carne despontando maculada

entre os lençóis

 

 

virtual

 

espelho meu,

espelho seu,

foi sua face

ou fui eu?

 

espelho meu,

espelho seu,

foi sua dor advinha

ou foi a minha?

 

espelho meu,

espelho seu,

foi sua frieza

ou minha tristeza?

 

 

coisas

 

a pouca areia

que o vento sopra

 

a parca sombra

que a luz consome

 

a débil chama

que o amor devora

 

a frágil linha

que a vida tece

 

queimada, assim.

 

 

fetiche 2

 

ali vivi no sol daquela tarde,

o blazer imóvel

                      depois que ele saiu.

 

a cadeira quieta

no calor inda dourado

                  da loucura.

 

                 azul  figura

 

               p   art   ida

 

 

presente

 

um cavalo voando em nuvem plena

uma rosa azul tão sem cultivo

uma estrela recolhida dos telhados

um rio rompendo seu sentido

uma chuva caindo em contradança

um perfume de coisa sem memória

um vento peregrino sem destino

meu coração exposto em tua mão

 

 

                                                  tudo isto em vão

 

 

 

Extraídos de  Eros, poemas.  Rio de Janeiro: Presença, 1986. 93 p.

 


MAGALHÃES, Carlos Fernando Filgueiras dequarks. Goiânia, GO: Editora UFG, 1994.           153 p.  Prefácio por Darcy França Denófrio.  
Ex. bibl. Antonio Miranda

 

 

        sugestão

 

                para Rosana Rattis

 

         deixe a flor
        ser apenas
        a metáfora
        do agora:

                       as horas amenas
                       devoram as rosas
                       sem demora

 

 

        mau dito

 

        amor imperfeito
        em teu peito

        finco minha bandeira

        eu que não tenho
        eira nem beira

 

 

        film noir

 

        soam as horas
        na esquina

        a beleza me cor rompe
        o tempo
        me arruína

 

 

        palimpsesto

 

        sem teto
        centelhas  

        ontem direis
        ouvi-las

        hoje só quero
        vê-las

 

 

        w.c.

 

        poço imundo
        de cabeça
        posso à beça
        m
          e
            r
              g
                u
                  l
                   h
                     a
                       r

 

 

 

                              no fundo

 

 

MAGALHÃES, Carlos Fernando Filgueiras de.   Perau. Poesia.  Goiânia, GO: Editora Vieira, 2004.  302 p.  15,5x21,5 cm.  Capa: Laerte Araujo Pereira. ISBN 85-89779-02-5  Ex. bibl. Antonio Miranda

 

fragmentos


impassível e aleatória corroendo
em traços desbastados lentamente
a ferrugem dos anos erodindo
o inconsútil tecido sobre o abismo
de nós dois
agora separados

a porosa memória a tudo escapa
na duração das coisas e minúcias
no gesto cruel do imponderado
uma paisagem ali já esquecida
entre as folhas prensadas de algum livro
dos muitos dos jazigos das estantes
o que fora fogo e força, rosa e esplendor

 

 

marinha I

 

desmancha-se o véu
que me separa
do céu

nenhum barco
há no cais

 este horizonte sem nada
perfeito demais

 

 

reprise

 

as formas com que Eros
me engana
a máscara múltipla
ali circunscrita
me reclama

aquelas normas
eu as incendeio
e ainda assim
só resta
o que odeio

mas só fica esta aura
ali sentida
suspensa
entre a maneira
que vejo
e invejo
o risco que fica
entre o marcado
e o inacabado

o arremedo
que sinto
e não tolero
a dimensão
de toda a ocasião
o lugar incerto
onde minto
o meu instinto

 

 

 

 

POESIA SEMPRE. Número  31 – Ano 15 / 2009.  Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional, Ministério da Cultura. 2009.  217 p.    ilus. col. Editor Marco Lucchesi.  Ex. bibl. Antonio Miranda

 

                                                Noturno

 

No quintal sombrio
 Pássaros e coisas
Quedam-se mudos
Ante o cristal
Ainda aceso
Da tarde escarlate

 

As vozes do tempo
Silentes ficaram
Assim de repente

 

Alongam-se as montanhas
Suas formas estranhas
Até à minha porta
Querendo entrar

 

 

Cais do porto 1

 

 

Quantas vezes me sentei ao lado teu
Ali na cama líquida que transportas
Quantas vezes fiquei imóvel estrela
Pregado em meu céu de fantasia

 

Já não sei quantas foram todas elas
No mergulho do infinito céu noturno
Ou vendo barcas serenas deslizarem
Com as garças passando em pleno voo

 

No abandono do aconchego e da infância

Podia-se sonhar diuturnamente
Com as terras para além daquelas serras
Que a vista me deixou apascentar

 

Mas as águas que eu queria já passaram
No brilho cravejado de ilusões
Estrelas novas surgindo se renovam
Sem nunca ter de Vésper aquela luz

 

E retendo aqui comigo como faço
No escrínio desta aurora o seu vestígio
Me consolo e me levo tardiamente
De volta ao regaço desta estrada
Deste nada ao esquecimento

 

 

 

Imagino

 

 

Às vezes, quando o sol entrega o dia
Ao claro espelho da eterna lua
Ou quando a brisa varrendo o pensamento
Deposita em seus cantos a lixívia dessas horas
Em falso procuro dissidente
0 que restou de nós em nossa marra
Feita do tecido puído em que tornamos

 

Às vezes, quando a noite já não é mais o prenúncio
Das alvas daqueles loucos dias
Imagino o que amávamos tanto e que tanto
Derrotado foi nas faldas do passado e do engano.

Mesmo assim procuro esse impossível anelo
Entre os desvãos do vento em lenços desfolhados
Na certeza de jamais reter na volta
As adoradas rosas, só nossas, camufladas entre o que fora
A jornada da luz nos afagos do corpo
 E o que restou do breve tempo
 Em qualquer canto clandestino da memória

 

Aí o desespero impera e perco teu sorriso nunca mais achado
Por mais que me castigue a dor o seu lavor insano
Que malvada desgasta a imagem da matéria antiga
Eu me volto e de repente ali estás
Incorruptível naquele ser de pomo apodrecido
E me refaço imediato volvendo o cristal daquelas horas
Que ali também ficaram no outro fruto do futuro

 

Toda vez que às vezes imagino e vejo nelas
Escorrer o sumo da vitória do presente sobre o ocaso
Que nos faz de tão ausentes encarnados no agora
Mesmo assim querendo e tendo
Toda a força de minha alma
Nunca pensei que tive o que sonhei vivendo
Tanto hoje quanto outrora

 

 

 

 

Página publicada em junho de 2017; Página ampliada em outubro de 2018

 

 


 

 

 
 
 
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