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MATUSALÉM DIAS DE MOURA
nasceu no Córrego dos Coelhos, zona rural de Urupi, município de Iúna/ES, em 05/06/1959. Advogado, político, homem de muitas atividades.
MOURA, Matusalém Dias de. Benquerença. Trovas. Vitória, ES: Arte da Cura, 2019. 68 p. ISBN 978-85-5926-016-8 Ex. bibl. Antonio Miranda
“Um-poeta-de-todos-os-estilos.” Getúlio Marcos Pereira Neves.
08
Em meus escuros instantes
feitos de dores somente,
tenho em teus olhos brilhantes
a luz que busco... insistente.
25
Manhã de sol e de cores,
abrindo as portas do dia,
a reluzir sobre as flores
nos canteiros da alegria.
27
Guardo aquela piscadinha
que me deste bem discreta
para revê-la, à noitinha,
quando me torno poeta.
88
Correm os dias da vida
de maneira bem veloz,
que, envolvidos com a lida,
nem damos conta de nós.
MOURA, Matusalém Dias de. Córrego dos coelhos. Poemas. Vitória, ES: Arte da Cura, 2018. 38 p. ISBN 978-85-5925-011-3
Ex. bibl. Antonio Miranda
“As metáforas nostálgicas de Matusalém têm cheiro de terra
molhada, canção de córrego preguiçoso, sabor de comida feita
no fogão a lenha, doçura de garapas e das rapaduras,
singeleza e força viril do homem do campo...”
Edson Lobo Teixeira
A LAMPARINA
Uma lamparina
alumiava minha infância noite adentro,
até o sono chegar,
enquanto, concentrado, desincumbia-me de tarefa escolar
que a professora me dava a cumprir.
Pobre, humilde feio,
assemelhado a mim próprio,
aquele farol, bruxuleante,
clareava, timidamente, as letras e os números
ante meus olhos meninos,
todas as noites,
guiando-me pelos caminhos do conhecimento
que, mais tarde, libertou-me da ignorância
e do trabalho bruto de manejar a enxada, lavrando a terra.
Quantas lembranças!... Quanta gratidão!...
Em minhas retinas, ainda estão nítidas
as imagens daquelas noites,
daquela lamparina feita de lata, tampinha de garrafa
e pavio de pano velho queimando querosene
e se tornando a luz do meu caminho.
SOU PEDRA
Sou pedra.
Até aqui sou pedra;
pedra de carne, osso e espírito,
mas pedra.
Pedra bruta a rolar sem destino certo,
a esfolar-me a alma toda
— também de pedra —
estrada afora.
Sim sou pedra.
Até aqui sou pedra.
Preciso ser pedra
para resistir à maldade humana,
à traição, à insensatez, à mediocridade, à provocação,
à inveja e à cólera injustificáveis de alguns;
ao deboche, ao escárnio e ao ódio gratuito
de muitos outros.
Sim, sou de pedra.
Preciso ser pedra para aturar o mundo.
MOURA, Matusalém Dias de. Romanceiro da vila. Poema. Vitória, ES: Arte da Cura, 2019. 32 p. ISBN 978-85-5926-018-2
Ex. bibl. de Antonio Miranda.
“Como forma poética moderna, presta-se ao exercício
da narração de fatos, históricos ou míticos, numa
intenção de epopeia tecida geralmente em prosa poética.”
Getúlio Marcos Pereira Neves
I – A VILA
A vila, nos pés da montanha,
moradia do sossego,
não vê o tempo passar
nas janelas desbotadas
de velhas casas de estuque
que ainda guardam, silentes,
infâncias e peraltices,
grandes sonhos, meninices,
atrás de brancas paredes
queimadas de muitos sóis
dos inclementes verões,
e um amarelo de lama,
marca de uma bola velha,
em brincadeira infantil,
num chute mal acertado
no pau a pique do oitão
por um moleque aprendiz
das manhas do futebol
que hoje volta à procura
de meu ontem mais feliz.
XI – COLOFON
Também sou parte e sou vida
dessa vila imaginária
que construí na retina
de meus olhares antigos,
perdidos e agora achados
nos versos deste poema,
escrito em noite sem sono
com as tintas do lembrar
o ontem, a terra, o caminho,
numa longa travessia
de um chão duro que pisei
viajando pelos dias
até vir chegar aqui
nestas alturas do tempo
que me faz cansado e velho
— poeta, poesia e santo,
nos olhos de minha mãe— ,
a semear benquerença
nos corações que se abrem
às alegrias do mundo,
enquanto o sopro vital
o corpo me sustentar
nesta caminhada longa
que fim, um dia, terá.
MOURA, Matusalém Dias de. Sonetos da madrugada. Vitória, ES: Cousa, 2020. 154 p. ISBN 978-85-9578-113-4 Ex. bibl.
Antonio Miranda
“Cultor dos versos intercalados, abusa da harmonia
e acaba por oferecer-nos um presente digno dos reis.
Não obstante, a diversificação dos temas, não consegue
ignorar sua característica já demonstrada em outras
produções do gênero: sua devoção ao lirismo.”
Nei Santos Viana
A TRAÇA
Subindo na parede a magra traça,
vagarosa, não tem destino certo,
nem sabe se vai longe ou se vai perto
e se a vida apressada tem mais graça.
Indiferente à glória e à desgraça,
ela percorre o seu caminho incerto
sem correr, como corre o humano experto
na prática indecente da trapaça.
E, nesse caminhar com elegância,
discreta e desprovida de arrogância,
a traça nos ensina a persistir
para que realizemos nosso intento,
não ouvindo do maus o vil lamento
que nos instiga sempre a desistir.
ABANDONO
Olhos sem sono, fico a olhar o teto,
no silêncio do velho apartamento,
que, no passado, foi tão barulhento,
mas hoje, nele tudo é mais quieto.
Insone e só, recordo antigo afeto
que me alegrou a vida, deu-me alento,
fez-me feliz e foi-se como o vento
sem dar adeus, correndo, mas discreto.
E assim, nesse pensar, fico entretido
entre o ontem e o presente dividido,
até que, de repente, chega o sono
dominando-me o corpo por inteiro,
e eu, vencido, me abraço ao travesseiro,
que comigo divide este abandono.
MOURA, Matusalém Dias de. Maio. Haicais. Vitória – ES,Cousa, 2016. 124 p. 14x21 cm capa dura. Prefácio, diagramação e capa: Gustavo Binda. ISBN 9978-85-637446-72-6 Ex. bibl. Antonio Miranda
Aberta a janela -
Laranjeira no quintal
toda em flor.
À sombra da mata -
Vagaroso riacho a colher
folhas secas.
Envelhece do dia
sobre o verde milharal -
Neblina prateada.
Sempre a por do sol
Reverenciando a noite,
girassol se curva.
Casa em ruinas -
Cobre todo o telhado
pé de bucha em flor.
MOURA, Matussalém Dias de. Sonetos. Rio de Janeiro: Edições Galo Branco, 2016. 86 p. 14x21 cm. Apresentação: Anderson Braga Horta. ISBN 978-85-7749-135-3 Ex. bibl. Antonio Miranda
"O tom geral do livro é lírico, predominando a temática amorosa — o amor frustrado, o amor realizado, o amor desfeito —, não faltando as cores da infância, os fastos da família, as incertezas da vida e da morte. A linguagem é natural, quase de conversa. Muito disso pode ser exemplificado num único soneto, que seleciono para ilustração, destacando a beleza do verso final: " [ANDERSON BRAGA HORTA]
AO TEU LADO
Eu não te quero só por te querer,
nem tenho culpa de te amar assim
O que hoje me acontece, podes crer,
é uma vontade que nasceu em mim:
a de ir contigo, enquanto aqui viver,
de braços dados, rumo ao nosso fim,
com nossas vidas, juntas, num só ser,
para a Deus reafirmarmos nosso "sim".
Tu és o melhor bem que me ocorreu
nos momentos de dores e alegrias,
tornando bem mais leve o fardo meu.
E neste lento caminhar dos dias,
passo a passo, seguindo ao lado teu,
encho de luzes minhas mãos vazias.
O LIVRO
Sonhando ser, um dia, alguém na vida,
carreguei muitos livros na sacola,
lá longe, no começo da corrida,
em busca do saber, na velha escola.
E em toda a minha estrada percorrida,
desde menino pobre e rapazola,
o livro me seguiu na dura lida,
o ânimo me dando, e me consola
nas horas mais difíceis da jornada,
apontando-me o rumo a ser seguido
quando a dúvida cruza a minha estrada.
O livro é o companheiro mais querido
daquele que, durante a caminhada,
quer dar à própria vida mais sentido.
MOURA, Matusalém Dias de. 50 Poemas escolhidos pelo autor. Rio de Janeiro: Edições Galo Branco, 2016. 120 p. ll14xl21 cm. (Coleção 50 poemas escolhidos pelo autor, v. 67) Ex. bibl. Antonio Miranda
SER PEDRA
Sou pedra.
Até aqui sou pedra;
pedra de carne, osso e espírito,
mas pedra.
Pedra bruta a rola sem destino certo,
a esfolar-me a alma toda
— também de pedra —,
estrada afora.
Sim, sou pedra.
Preciso ser pedra
para resistir à maldade humana,
à traição, à insensatez, à mediocridade, à provocação,
à inveja e à cólera injustificáveis de alguns:
ao deboche, ao escárnio e ao ódio gratuito
de muitos outros.
Sim, sou pedra.
Preciso ser pedra para aturar o mundo.
DOMINGO À TARDE
Todo domingo à tarde
há um silêncio de igreja
no velho casarão,
quebrado apenas pelo badalar do relógio
marcando as horas,
num canto da sala.
Domingo á tarde
a casa inteira cochila de barriga cheia.
MOURA, Matusalém Dias de. Seleta de trovas. Cachoeiro do Itapemerim, ES: Ed. Cachoeiro Cult, 2017. 125 p. 13x20 cm. Capa: Douglas Peixoto. ISBN 978-85-62843-44-0 Ex. bibl. Antonio Miranda
09
A requebrar pela rua,
a moça, muito assanhada
— saia curta, quase nua —,
enlouquece a rapaziada.
13
Não saberia dizer-te,
eu juro, não saberia,
se, acaso, viesse a perder-te,
de que forma eu viveria.
30
Saudade chega discreta
e no meu peito se aninha.
Sabendo que eu sou poeta,
se torna parceira minha.
MOURA, Matusalém Dias de. Sonetos insones. Vitória, ES: Cousa, 2018. 68 p. 13,5x21 cm. Editor: Saulo Ribeiro. Produção editorial, projeto gráfico, diagramação e capa: Gustavo Binda. ISBN 978-85-9578-039-2 Ex. bibl. Antonio Miranda
O TEMPO
O tempo, inexorável, vai passando,
subtraindo os meus sonhos mais queridos
e transformando-os em cristais partidos
sobre os caminhos que vou palmilhando.
E, assim, sem sonhos, por aí, lutando,
com os pés, a alma e o coração feridos,
juro, não sei se encontro mais sentidos
para seguir em frente pelejando.
Quanta dificuldade, quanta dor,
dia após dia, tenho de transpor
para continuar seguindo a Luz...
Às vezes, paro e choro no caminho,
sinto-me triste, vejo-me sozinho,
mas logo volto a carregar a cruz...
CHÃO ANTIGO
De volta ao chão antigo em que nasci,
revi a “casa-mãe” desabitada,
coberta de cipós, abandonada,
guardando a bela infância que vivi
Feliz, naquelas serras de Irupi,
sem saber que era longa a minha estrada
e muito dolorida a caminhada
até chegar à Luz que persegui.
E assim que a revisita terminei,
trêmulo de emoção, ali, chorei
um choro de lembrança e de saudade
dos dias barulhentos de menino,
vividos no costume campesino,
plenos de paz e de simplicidade.
MOURA, Matusalém Dias de. 44 poemas curtos. Vitória, ES: Arte da Cura, 2017. 56 p. 14x17 cm. Capa, projeto gráfico e editoração: Caco Appel. ISBN 978-85-5926-006-9 Ex. bibl. Antonio Miranda.
É A VIDA!...
O porta retrato
guarda um sorriso de amor
que o tempo matou.
AUSÊNCIA
Sem tua companhia
não há caminhos a seguir.
Nem poesia...
MOURA, Matusalém Dias de. Haikais para Guilherme de Almeida. Vitória, ES: Cousa, 2017. 68 p. 11,5x17,5 cm. ISBN 978-85-9578-018-7 Ex. bibl. Antonio Miranda
Luar
Brilha a lua cheia,
discreta, para o poeta.
Meia-noite e meia.
Outono
Na rua, caída,
já morta, próxima à porta,
folha retorcida.
Silêncio
No tronco se agarra,
silente na tarde quente,
alegre cigarra.
Contemplação
A nuvem correndo
encobre, e logo descobre,
a lua nascendo.
Página publicada em agosto de 2017; ampliada e republicada em abril de 2018.
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