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VALDIR DE AQUINO XIMENES

VALDIR DE AQUINO XIMENES 

Poeta, contista, narrador.  É médico-pediatra. Nasceu em Fortaleza, e reside em Brasília há 25 anos. É autor dos livros O homem submerso (1993) e A solidão da carne (1995), ambos de poesia, e membro da ANE (Associação Nacional dos Escritores) e da UBE (União Brasileira dos Escritores). Homem de branco em noite escura é seu romance de estréia.”

“Há qualquer coisa “flores do mal” nesta obra que me perturba.” Cassiano Nunes

“A cada dia o jovem e iluminado poeta Valdir de Aquino Ximenes faz de seu encontro com a vida a renovação de um martírio e de um compromisso com a beleza do mundo, escondida em jardins secretos”.  Danilo Gomes

 

XIMENES, Valdir de AquinoA solidão da carne. Poesia.  Brasília: André Quicé Editor, 1995.  85 p.   Impresso em papel couchê Matte 120 gramas. Capa em papel Supremo 180 gramas e sobrecapa em papel Vergê 120 gr. A gravura da capa foi impressa a partir de clichê em prelo manual sobre papel artesanal de casca de cebola.  Inclui uma ilustração também impressa em papel artesanal.  Col. A.M. (EE) “ Valdir de Aquino Ximenes “  Ex. bibl. Antonio Miranda


A SOLIDÃO DA CARNE

Na manhã que se renova preenchida
de angústia e melancolia precoces
a solidão leva-me em surda ferida,
lento o raio solar aumenta a sua posse
no meu corpo a recender solidão.
A mão que faz gestos é solidão,
solidão os pés no duro chão.
Os olhos sob ray-ban no cinza das ruas
marejam uma solidão profunda e crua,
como o olhar triste de um cavalo;
da solidão sou inteiro vassalo.
Faz calor nessa manhã de sábado de céu azul
em Brasília, onde caminho na Av. W-3 Sul,
e o meu estômago revolve-se em úlcera e digestão.
Minha boca em rictus é silêncio e solidão,
as narinas aspiram o ar túrgido de solidão,
meus cabelos revoltos ao vento
atestam a solidão, em seu desalinhamento.
Corre solidão no leito das minha artérias,
e no cérebro ela reveste as idéias.
Nas fibras dos músculos tesos, solidão;
nos poros epidérmicos viscosos, solidão,
meu corpo é solidão, infinita solidão,
nessa manhã candanga que em verdade
poderia ser a de qualquer cidade
— Mogadiscio, Paris ou Redenção.
Meu sexo ejacula espermas sem solidão,
a bexiga expele urina e solidão
e no instante seguinte em renovação
acolhe nova solidão, infinita solidão.
As cordas vocais vibram solidão
no cumprir da diária comunicação,
bombeia solitude meu coração;
solidão na articulação do joelho,
no umbigo, púbis, no pentelho,
no mais ínfimo e humilde tendão.
No núcleo celular, nos cromossomos
— origem de estrutura que somos
e onde se esconde nossa herança,
em que mais do corpo venha a lembrança,
solidão, infinita solidão.
Solidão como a do homem no farol
tostado de alucinação e sol,
ou qualquer outra sentida,
pois ainda que na vida
faça o amor aparição,
o homem tem na solidão
sua tragédia definitiva.

Só minha alma não comunga
da solidão do meu corpo lasso.
É porque ela vagueia por espaços
insondáveis aos corpos, onde se inunda
de paz e o que é mau é escasso,
onda há outras almas em alegria funda,
e os sonhos de uma fazem companhia
aos sonhos de outra, em saudável empatia.


INVERSÃO

Coabitam na casa do meu ser
duas hóspedes de muito haver:
as palavras e a solidão.
Ambas me são revelação,
ambas também escuridão,
e abusam da minha parte anfitrião.
Uma conduz à outra em mim,
me sabem os mistérios e confins.

Desconfio, no entanto, dessa intimidade:
eu é que me hospedo nelas, na verdade.

 

Página publicada em dezembro de 2008


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