“Sids Oliveira, poeta brasiliense, coligiu a matéria de sua poesia pela vida afora: desde a adolescência com grupos de punk rock, em movimentos sociais, depois com a música em forma profissional, com o grupo Maya Desnuda e agora com o projeto O Grande Barco (www.myspace.com/ograndebarco). Com um livro-cd publicado pelo Círculo de Brasília Editora apoiado pelo FAC-DF e intitulado Um dedo de Prosa, Uma Mão de poesia, Sids e O Grande Barco brincam a valer com as possibilidades de intersecções entre a poesia e a música, a qual denomina de Poemúsica. Vale dizer que o seu veio poético e que a sua ligação com a poesia vem desde o momento em que começou por observar e a sentir-se envolvido com os eventos ao seu redor. Daí então começou a escrever, primeiramente sobre uma ala mais subjetiva para, em seguida, deslanchar numa escrita mais telúrica e social. A sua linguagem ergue-se do olhar de menino que passeia pelo Gama-DF, da sua relação com a sua cidade natal, Brasília-DF e, já adulto, de seu contato com os lugares por onde passou: cidades reais e invisíveis, do profundo em seu âmago”.
Adriana Sacramento
DEPOIS DE TUDO
Foi numa rua da baixa em Lisboa, por volta de um mil novecentos e quinze, que conheci Fernando Nogueira Pessoa. Nosso mestre havia morrido e, por detrás das nuvens, o céu estava mais belo e porque não dizer mais colorido, ainda que não o conseguíssemos ver, sentíamos os seus encantos. Não trocamos palavras, de palavras sabia o mestre que as considerava desnecessárias, salvo quando a falar de seu rebanho guardado, de suas sensações à luz. Fernando mostrou-me coisas de seu desassossego. Eu só entendia o mestre, ainda que não tivesse nada a entender. O mestre, naquele instante, era o tudo a refletir e a reverberar dentro de mim: as nuvens do céu nublado, o céu por detrás das nuvens e essa mania de nos fazer conhecer gente da qual gostamos e seguimos a gostar. Corre-se o tempo e sinto-me criança ao lembrar do mestre e a sentir saudades do Fernando. Há poesia bastante aos trinta e quatro anos de idade pelas ruas vazias e cheias de nada de Brasília, em dois mil e cinco, depois de Cristo, depois de tudo.
ARVORAVA-ME
Arvorava-me pelas árvores, quando menino.
Arvorava-me em dissabores e deleites.
Abraços de subidas, de descidas e de estadas,
e por alongadas, esticadas, riscos, saltos e sustos,
em sulcos, frutos da terra que me desprendia e me conectava
com o arvorar de raízes SolEstreLares.
SIDÉREO
Para Haroldo de Campos, em memória
sidéreo em poeira âmago pelo gama e acima da rua
que só rua que só sua que só nua que só nu por onde
não se andou nem passou nem sonhou andar que o vi
em galáxias de gala galante e galanteador
desconforme do fácil fraseado que por abismos
síntese fotossíntese em papel árvore frutífera de
touros e círculos-não-círculos e por países e plumas
espumas de pedra e fontes e pontes o leão-homem de
campos haroldo aragem interage ao vento concreto
que ventila e poestica poeira póstumum homenagem
em palavras palavrasouro a constelar por si em si
ensimesmado ensimesirmão ensimesóculos
ensimeslivros livre livro livres livroestrelas
livreestrelas estrelascampos camposestrelas
campospalavras palavraaragem do som em som e
silêncio e paz frieden pace paix peace paz(agem)
É DE TERRA O CAMINHO
Já chamaste a Terra de mãe?
É viva a voz que te alcança.
E a que lanças, vive!
Vês o olho antes do olhar?
Estás a todos interligado.
É de terra o caminho que trilhas.
Por quais ruas caminham as respostas?
Perguntaste ao dia pela noite.
Inspira palavras soltas a poesia.
Já cantaste o canto profundo da Terra?
Extraídos de Um Dedo de Prosa, Uma Mão de Poesia. Círculo de Brasília Editora; FAC-DF, 2005. 80 pg.
OLIVEIRA, Sids.Um dedo de prosa, uma mão de poesia. Brasília: Apoio: 2005. 80 p. 20x20 cm. ilus. Projeto gráfico, diagramação e ilustrações: Angélica Lira. Capa: Regina Pessoa. Ilustrações baseadas em fotos de Sids Oliveira e Adriana Sacramento. Inclui CD “O Grande Barco”. Apoio FAC.
SIDS OLIVEIRA - o Grande Barco, A Flora - apresentação durante a Feira do Livro de Brasília, 2009 anunciando a II Bienal Internacional de Poesia de Brasília.
SIDS OLIVEIRA - O Grande Barco -na Pré-Bienal - BIP, na Biblioteca Nacional de Brasília, 2010,
Inlcui "No Meio do Caminho", na voz de Carlos Drummond de Andrade, com intervenção poético-musical de Sids Oliveira e os músicos do Grande Barco.
1ª. BIENAL DO B – A POESIA NA RUA. 26 a 28 de Setembro de 2012. Brasília: Açougue Cultural T-Bone, 2011. 154 p. ilus. col. 17x25 cm.
[...] sorte do mundo Lurdes Pancararu não ter racionalizado
e só brincado, subjetivado, a viver,
sorte do mundo ter quem sonhe e se mantém acordado,
o mundo não é um jogo de dados,
sente sua, sorte minha, ter eu e você.
FINCAPÉ – Coletivo de Poetas.Org. Menezes y Moraes. Brasília: Thesaurus Editora, 2011. 280 p. 280 p.
12,5 X 22, 5 cm ISBN 978-85- 7062-969-
Ex. bibl. de Antonio Miranda
Linha dourada
Para Luz Amorim e Açougue Cultural &-Bone
Linha inútil,
como todo poema,
onda tênue
O homem pede pro pão,
mas quer tomar cachaça.
Livros tomam chuva
na parada com vento
Aram-se campos folhas
cantam o intento:
pode pegar e levar
o dicionário fácil
O folhoso volume
o tomo verde opaco
um Drummond bem velhinho
ou Manuel de Barros.
Pedestre acena a mão,
empulhando Leminski
pro coletivo cego
que segue firme-torto.
No açougue leem-se livros.
cortam-se carnes a gosto:
T-Bone.
LinHa OnDuLaDA... a dEvorarAs, éS DeVoRAdo
ou oNduLas CoM eLA. N pARadA?
Asas
Brasília:
o chão a refletir o sol a clarear o céu
Esse vazio me enche.
Brasília:
o céu a refletir o chão a clarear o sol.
Esse vazio me prende.
Brasília:
o sol a refletir o céu a clarear o chão
Esse vazio de chão.
Brasília:
o chão, o sol, o céu...
Esse vazio na gente.
Brasília:
por entre as quadras do grande pássaro
pulsam-me asas
Asas
Avião
Voando como um pássaro,
Olhando por cima, Brasília
É como um avião.
Só Rindo
Esplanada do povo
Policiais e cassetetes
Só rindo de novo.
Mil Beijos
Protesto
Estudantil
Mil beijos
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Página ampliada e republicada em outubro de 2023
Página publicada em abril de 2008,ampliada e republicada em dezembro 2010; página ampliada em novembro de 2020