Foto: http://www.unb.br/
NELSON MARAVALHAS JUNIOR
Professor da UnB desde 1987. PhD em Teoria e História da Arte pela University of Kent at Canterbury (Inglaterra) e MFA pela The School of the Art Institute of Chicago (EUA). Realizou mais de 13 exposições individuais em diferentes instituições e galerias onde se destacam a Superior Street Gallery de Chicago, o Museu de Arte Contemporânea USP/Ibirapuera de São Paulo e o Museu de Arte de Santa Catarina, em Florianópolis. Publicou dois livros sobre seus desenhos e pinturas: Interferências e A Tarefa Infinita. Entre 2009 e 2011 foi Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Arte da UnB. Em 2011 foi indicado para o Prêmio Investidor Profissional de Arte – PIPA e lançou seu novo livro EXPERIMENTAL, edição de luxo com imagens e textos de sua autoria.
Mais informações sobre Nelson Maravalhas Junior: http://www.maravalhas.org/
MARAVALHAS JUNIOR, Nelson. Experimental. Brasília: Programa de Pós-Graduação em Artes da Unb, 2011. 224 p. ilus. col. 16x23 cm. Projeto gráfico: André Maya Monteiro. Capa dura e sobrecapa. FAC- Fundo de Apoio à Cultura, Secretaria de Cultura – Governo do Distrito Federal. ISBN 978-85-89698-30-6 “ Nelson Maravalhas Junior “ Ex. bibl. Antonio Miranda.
TRIPLA DEGOLA MÍTICA
Vestido de mendigo, entrei por um dos lados
da caverna dos pigmentos cromáticos,
saí pelo outro completamente pintado;
despi meu vestido de mendigo,
vesti meu manto de místico.
Saí do outro lado com a medusa na mão.
Suas cobras como cabelo
enroladas em cada dedo
como anéis inteiros,
como argolas na nuca
da mulher-girafa.
Ponho aquela cabeça sobre a baixela da mesa de um banquete. Os convivas perplexos, como Herodes após a dança das guloseimas lúbricas, se afastam com gestos enfáticos. E no côncavo de um escudo, entre secos & molhados, olhos de um Holofernes magoado olham Salomé correndo, escapando do labirinto.
PINTOR TAQUÍGRAFO (OU PNEUMATOLOGIA)
O obsceno anjo toma a rude mão
e a guia nas volutas de uma caligrafia torpe.
O Santo quase tomba, vesgo e assustado, do seu banco estalado.
-Lascivo(a) menino(a), ele não pode escrever certas palavras.
Uma vez quis sozinho introduzir o bisturi e elaborar a obra sonhada:
os dedos ficaram hirtos, a mão caiu!
Responde o anjo/musa
- Dito agora com todo meu esforço e emprego a palavra "ditar" como
autor de livros profanos. Não posso perder o auxílio de taquígrafos,
amanuenses e copistas, pois a palavra "rápido" já não basta.
Continuarei a ditar tapando os ouvidos para não ouvir latidos, pois a
elegância do traçado vem da audácia repentina do ditado, e esta
depende só do deus do acaso - o deus que nos é mais caro!
O PINTOR FILÓSOFO LÓGICO
Diagramando processos mentais,
como terá presumido
o suposto substrato físico?
Puramente especulativo,
põe de lado os gráficos frios
da subjacente fisiologia
e cria psicológicas hipóteses.
Esmagando gemas entre vidros,
tingindo tecidos de linho
imitando o camaleão dos mecanismos
conclui o porquê e os meios
das insanas mentes
que a sua sã esquadrinha.
NEFELIBATA
Para E.S.
Fotografias de nuvens
não produzem ruídos;
o fotógrafo de nuvens é silencioso:
calçado em meias gordas
anda pelo chão de gotículas.
Olha o deslize lábil e surdo
de cirros sobre o óleo azulado.
Cúmulos de lã branquíssima
absorvem qualquer tumulto.
Nimbos molhados de cinzas
tremem como gelatina.
Fotógrafos de nuvens
não fazem barulho.
O DESENHISTA
Ele, o sujeito,
divide o corpo em partes
e destas partes, partículas,
número sobre número.
Encontra os modos da figura,
suas proporções mútuas
e inumeráveis comparações de linhas,
além do céu, além de todo limite.
Pensa algo mais antigo que qualquer tempo
e algo mais vasto que qualquer lugar.
Página publicada em março de 2015
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