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 MIGUEL MELGAREJO   Quem foi Miguel Melgarejo, um dos primeiros a versar  sobre a Nova Capital do país na mesma hora de sua inauguração?  Nenhuma informação sobre o autor nesta edição  tão bem cuidada, cujo conteúdo está longe de ser apenas descritivo ed muito  menos panegírico. Nasceu em  Almuñecar (Granada),Espanha, em  1914Publicitário,  jornalista, roteirista para televisão e, sobretudo poeta, autor bilingue,  pertence à União Brasileira de Escritores.   Chegou ao Brasil como exilado, depois de participar da guerra civil  espanhola como militar republicano. Regressou a Espanha em 1977 e ampliou sua  carreira como ficcionista, desde Granada. Não temos notícia de seu paradeiro  depois disso, e não há notícias dele na Internet mais recentes.  Publicista,  periodista, cineasta, guionista de televisión y, sobre todo, poeta, Melgarejo  es autor bilingüe y pertenece a la Unidad Brasilera de Escritores.     DeMiguel Melgarejo
 Alvorada - um canto a Brasília.
 Ilus. Domingos Logulo.
 São      Paulo:  Editôra Fulgor, 1960.   109 p.  ilus.
   MERCADO
 Na porta
 conclave de mendigos cegos
 os olhos bem abertos
 
 No interior
 enxame de moscas
 ao redor da carne seca
 do peixe seco
 dos homens do Nordeste seco...
 Cheiro  acre de suor do trabalho cheiro cortante da pinga da folga.
 Cachorros  disfarçados de lama e de sarna.
 Apertada  teoria de rostos brancos
 amarelos
 escuros
 e pretos
 vozes  que falam em quilosem dúzias
 em cruzeiros...*
 Operários  fracos de olhos ávidos
 mulheres  grávidas de passos de chumbo
 soldados  e prostitutastodos engrossando o cardume voraz
 da necessidade quotidiana.
 
 
   Imagem fotográfica da Vila Amaury  durante a construção de Brasília,depois invadida pelas águas do Lago  Paranoá.
 
 VILA AMAURI*
   Aquela  noite (como  cada noite) rente  ao lago Vila  Amauri dormia seu sono de plenitude enquanto  o imenso olho liquido sereno  e disforme espiava  as casas de tábua.   Um  milhão de rãs emprestava  suas vozes ao lago para  adormecer a Vila que  saturada de cansaço deixava-se  embalar enquanto  o liquido esticava  sua língua infinita.
 Atrevida a  água forçava as portas  rondava  as janelas  instalava-se  nos quintais...   Só  ante as crianças  que  dormiam um pesado sono de  cansados anjos-candangos foi  que o lago deteve seus passos e  na clara voz das águas falou:   "Desculpem mas  as cabeceiras apertaram e  aqui estou eu"   "Ué!  o  lago falando debaixo da cama" —  disse o candango — e  carregando enxoval e mobília foi-se  embora...   Agora sob  as águas do lago  Vila  Amauri espera  uma  legião de barcos.     *  "cruzeiro" era a moeda oficial brasileira corrente naquela época da  construção de Brasília.**Vila Amaury era um povoado de casebres provisórios em que viviam os  "candangos" (povoadores migrantes durante a construção da Nova  Capital). Quando iniciou-se o alagamento da área para o surgimento do Lago  Paranoá, uma represa com as águas de rios da região, a Vila Amaury foi  "afogada", inundada e seus moradores transferidos para cidades  satélites. Talvez este seja o único poema a registrar aquele acontecimentos  histórico.
   Página publicada em dezembro de 2010 |