MAKARAND R. PARANJAPE
Makarand R. Paranjape, born in Ahmedabad, Gujarat, is a critic, poet, novelista and Profesor at the Center of English Studies of Jawaharial Nehru University, New Delhi.
Crítico, poeta e novelista, é atualmente professor do Centro de Estudos Ingleses na Nehru University, New Delhi.
A presente página foi criada para celebrar a visita do poeta a Brasília, em outubro de 2015, quando fez leitura de seus poemas em inglês e Antonio Miranda leu em português, no evento Chá com Letras, na Embaixada da Índia.
TEXTS IN ENGLISH – TEXTOS EM PORTUGUÊS
Extraídos de
PARANJAPE, Makarand R. Passageiro em trânsito. Transit passanger. Tradução de Gisele Wolkoff e Carlos Alberto Gohn. Coordenação: Laura P. Z. Izarra. São Paulo, SP: Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, 2016. 158 p. ISBN 978-85-7732-280-0
Inland Commencement
It started here, on this raised ground, no doubt
fortified against attack and with clear views on
all sides; the Jesuits tried through conversion
to protect the natives from wholesale subjugation or
slaughter. Some young Indians, weaned away
from ancestral faiths, even became the first priests
of the new colony. In the crypt below the mission walls -
weapons of the local tribes. Where are they now?
All exterminated or absorbed in the swirl of a new
nation. The college, church, garden follow a typical
pattern of missionary colonization, the advance
of civilization, books and tallow candles, bibles and
gold, cloisters and converts. In the middle of it all,
is now a restaurant which you go to when you're done
with the museum. The city spreads out below, engird-
ling the old college with tall buildings on three sides.
You are the only Indian in sight.
Terra adentro
Tudo começou aqui, em terras altas,
bem fortificadas e com visão privilegiada
de todos os lados; os jesuítas tentaram pela conversão
proteger os nativos do jugo e da maciça
chacina. Alguns indiozinhos, apenas desmamados
da fé ancestral, se tornam os primeiros padres
da nova colónia. Na cripta, embaixo das paredes da missão,
armas das tribos locais. Onde estão agora?
Exterminadas ou envolvidas na criação de uma nova
nação. Colégio, igreja e jardim seguem o típico
padrão do agir missionário, o avanço
da civilização, livros e velas de parafina, bíblias e
ouro, claustros e convertidos. No meio disso tudo,
um restaurante ao qual se vai depois de visitar
o museu. A cidade se espraia abaixo, abraçando
o colégio antigo por prédios altos do três lados.
E de "índio1", só resta você.
1 Jogo de palavras intraduzível em português, em que “Indian, no original inglês, se refere tanto a “índio” quanto a “indiano’.
Sunday School
Suddenly at the traffic light, a boy thrusts his fist
through the crack in the window, yelling, "Give me
your wallet, your cell phone, do-it-now\" The startled
driver looks up, fear in her eyes, but seeing just a little
punk, pushes up the window, shouting, "Get lost, jerk,
you don't scare me, go to school, get a life..." A quick verbal
duel ensues, high decibel, violence repelled with violence,
but only symbolic - there's no real threat on either side;
the scrawny boy falls away, running back, opposite
to the traffic, like a dark shade shrunk back to its source
in the dark alleys of the disgraced downtown. Another boy,
juggling for change at another traffic light, bare-chested,
inept, but at least not vicious or threatening. When we park
by the church, a third comes out of the shadows to mind
the car and receive a tip at the end. Inside, a full mass,
sonorous chants, full-throated organ, and assertive
arch-bishop reiterating an unconvincing profession of
faith that loses believers every year - thus a Hindu
from a distant land, a Jewish mother and her atheist daughter,
all kneel together to Gregorian chants of a Benedictine choir.
Catecismo dominical
De repente, no farol, um garoto empurra o braço
vidro adentro e grita - "Me dá
a carteira e o celular, agora!" A motorista
levanta os olhos, assustada, mas vê o
pivetizinho e levanta logo o vidro - "Cai fora,
vai prá escola ou se manda, guri..." Curta batalha
verbal, em altos decibéis, o contra-ataque
apenas simbólico - sem ameaça de parte a parte;
o garoto mirrado se esvai, correndo contra
o tráfego, como sombra escura que se encolhe
nos becos escuros, degradados, do centro da cidade. Adiante,
outro farol e um garoto faz malabares, torço desnudo,
desajeitado, mas ao menos, este não ameaça. Ao estacionarmos
na igreja, um terceiro vem das sombras para olhar
o carro e receber depois um trocado. Dentro, a missa,
cantos sonoros, o órgão potente e um arcebispo
confiante a reiterar, sem convencer, uma profissão de fé
que perde fiéis a cada ano - e um hindu
de terras distantes, uma mãe judia e sua filha ateia,
ajoelhando-se juntos perante o coro dos beneditinos.
(Un)Settling Down
He came first, checking into a decent hotel
to make a good impression on prospective
employers. After finding a job, he moved
to a cheaper hotel, little knowing that it
was in the red light district. "Red light?
what does that mean", he wondered until
he saw what the women did, by the hour
or by the night: "I was curious. I thought,
I am their neighbour, I should get a discount..."
At first everything was unfamiliar
but still known. Then his wife came too;
there were years of struggle. Once they even
gave it all up to go back, but, at the last minute
stuck it out. Finally, they struck pay dirt...
Now in a large house by the lake,
he explains it all
he had seen his future
long before any of it seemed possible ...
and from that certain prospect waited for the present
to work itself out.
As I looked at him, I knew that the future
he meant was not the present -
this success story of his, which he had
just narrated,
but something far greater
that none of us could
as yet guess at, where
he had already arrived.
A vida na cidade
Ele chegou primeiro, registrando-se num hotel decente
para causar boa impressão em possíveis
patrões. Depois que encontrou trabalho, mudou-se
para hotel mais barato, ignorando o fato
de que estava na zona de prostituição. "Zona vermelha?
0 que isso significa", perguntou-se, até
que viu o que as mulheres faziam, por hora, ou
noite adentro: "Fiquei curioso. Pensei,
sou vizinho delas, devo ter um desconto..."
No começo, tudo parecia estranho,
ainda que conhecido. Depois, sua mulher veio;
houve anos de luta. Certa vez até
desistiram de tudo para regressar, mas, no último minuto, recuaram. Por fim, acertaram o pote de ouro...
Agora, numa casa imensa próxima ao lago, ele explica o ocorrido
ele tinha visto o futuro bem antes de tudo se passar...
e a partir do futuro certo esperou que o presente desse um jeito de acontecer.
Enquanto o olhava, eu sabia que o futuro de que ele falava não era o presente -a história de sucesso, que ele acabara de narrar,
era algo muito maior que nenhum de nós pode ainda imaginar, e onde ele já havia chegado.
Carnaval: Salvador da Bahia
It was a long night, I confess,
but it is over now, as is the parade.
The costumes, drenched in sweat,
have lost their sheen; the performers,
half-undressed, look exhausted, their
transparent body stockings shorn
of sequins. The tourists who swung
and staggered are gone. In the harsh
daylight, the enchantment is fled.
Dancing long and hard, my limbs
are sore. All my words are dead.
I don't know where I mislaid myself.
A mist clouds my sight, my head
reels, and my heart is so empty,
wrung, wrinkled, and drained,
fit only to be stretched like a rag
on the common clothesline to dry.
Stumbling, I look for home.
Will you take me into your arms,
heal my broken spirit, uncross
my eyes, exorcise the evil that
blinds me, win my vision back?
I know there will be sadness when
we meet, but let it at least be beautiful.
Let the children who listened to my
songs learn the price of freedom:
it is always better to return,
to belong, than to be lost or forgotten.
Carnaval: Salvador da Bahia
Foi uma noite longa, confesso,
mas agora já acabou, como o desfile.
As fantasias, encharcadas em suor,
perderam seu viço; as folias,
seminuas, parecem exaustas, seus
corpetes transparentes despojados
de lantejoulas. Os turistas que dançavam
e cambaleavam ja partiram. Na áspera
luz do dia, o encantamento se volatiza.
Tendo dançado muito, as pernas
me doem. Minhas palavras estão todas mortas.
Não sei onde me perdi.
Uma névoa escurece minha visão, a cabeça
gira e meu coração está tão vazio,
retorcido, enrugado, esgotado,
bom apenas para ser esticado feito um pano
no varal comum, a secar.
Trôpego, anseio pelo lar.
Você me recebera nos braços,
curará meu espirito, abrira
meus olhos, exorcizara o demônio que
me cega, recobrara minha visão?
Sei que haverá tristeza quando
nos encontrarmos, mas que seja ao menos belo.
As crianças que ouviram minhas
canções, que aprendam o preço da liberdade,
E como é sempre melhor retornar,
melhor pertencer do que se perder ou ser esquecido.
Epilogue Saudade
Finally,
a rainy day,
a housebound friend,
an unfinished conversation,
some regret,
but much to cherish,
and, all too soon,
time to leave -
living, throbbing cities,
so deeply loved,
now saudade.
melhor pertencer do que se perder ou ser esquecido
Epílogo: Saudade
Finalmente
um dia chuvoso,
um amigo confinado em casa,
uma conversa inacabada,
um certo lamento
mas muito a comemorar
e, em pouco tempo,
hora de partir -
cidades vibrantes e vivas,
tão adoradas,
já, saudade.
Na foto: Edmilson Caminha, Antonio Miranda, Abhay K. , Makarand R. Piranjape, Lilia Diniz e, Zenilton Gayoso na sessão do Chá com Letras, Embaixada da Índia, 14/10/2016, em Brasília. CLICK s/foto para ampliar.
Encontro de três poetas: Makarand R. Paranjape (ao centro da foto) em visita à Biblioteca Nacional de Brasília com Abhay Kl (à esquerda) e Antonio Miranda.
Página publicada em outubro de 2016
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