LUIZ CARLOS DE OLIVEIRA CERQUEIRA
Nasceu no dia 28 de janeiro de 1935 em Monte Serrat, Mun. de Governador Levy Gasparian - RJ. Premiado em pintura, crÔnica e poesia.
Livros editados: "Solidio das Horas" (1990)- EDITEL Listas Telefônicas, Curitiba; "Além da Curva, a Saudade" (1997) - idem; "Quando Houver Nunca Mais" (2002) - Thesaurus Editora, Brasília.
Participou de muitas antologias no Brasil e em outros países, destacando-se as editadas pelo Instituto da Poesia Internacio nal, Porto Alegre; "Brasília; Vida em poesia" (1996) - Valci E ditora, Brasilia; "Pensar em Arte e a Arte no Pensar" (1997) - Univ. de S. Francisco, Bragança Paulista; “Espejos de la Pa labra/Espelhos da Palavra" (1999) - SUReditores, Montevideu; "Letras de Babel" (2001) – Ediciones Pilar, Montevideu; "Prêmio SESC de Poesia" (2002) - Edit. do SESC- Brasília. É verbete da "Enciclopédia de Literatura Brasileira" (2001), de Afranio Coutinho e J. Galante de Souza, São Paulo;"Dicionário de Escritores de Brasília" (2003), org. por Napoleão Valadares.
Extraídos de
SOLIDÃO DAS HORAS
São José dos Pinhais, 1991
FATALIDADE N° 84, OP.78, N° 1
Há sempre um dia em que partimos.
Nesse dia levamos conosco uma lágrima de esperança
e para os que sentem a nossa ausência,
deixamos, num sorriso, a saudade.
Você vai partir — eu queria esconder isto de mim,
queria mentir para a minha ilusão;
você vai, de malas prontas, tomar o trem da esperança;
você vai partir sorrindo, sorrindo...
Talvez nem se lembre de ter saudades,
talvez nem saiba mesmo que alguém terá saudades,
pois há uma espécie de fatalidade em nossas vidas:
— Há sempre um dia para sentir saudades,
pois há sempre um dia em que nos partimos
LAMENTO N° 26, OP.71, N° 1
Por que pranteia, mar amigo?
Por que soluça assim, desesperadamente?
Vê como a gaivota está triste por vê-lo triste?
Por que chora, mar, meu confidente?
Por que sua vaga já não mais brinca na praia,
no rochedo?
O mar sem responder, agonizava na sua imensidão...
Lembra-se, mar, daquelas noites calmas
Em que ela vinha-lhe trazer suspiros?
Recorda-se, mar, daquelas frases de amor,
Daqueles olhos convictos, daquelas mãos
alongadas?
O mar sem nada dizer, entristeceu, afogando-se em
sua profundeza...
Olha, mar, para o espelho das suas próprias águas
e veja seus olhos rubros de tristezas,
Veja suas mãos repletas de vazio,
Veja a praia, nas noites calmas, como a feia sem ela,
veja no espelho das suas águas a saudade refletida...
Chora, mar, essa amargura!
O mar nada quis ver; seus olhos se fizeram dois mares de agonia...
Olhei o mar, a praia, o penedo solitário.
Órfão do amor, amparei-me na lembrança — saudade dela...
O penedo encobriu-se em mortalha de algas,
a praia afogou-se sob a onda pesada e fria,
e o mar acenou-me com um branco lento de
espumas.
Voltei para mim e me fechei na minha própria memória.
O mar, a praia e o penedo fizeram-se silentes e, comovidos, se abraçaram...
Lembra-se, mar, quando ela vinha lhe trazer suspiros?
Feliz, você fazia espumas brancas para enfeitar a praia,
para ornar aqueles beijos tão macios... Feliz, você brincava na areia,
mandava a brisa trazer caricias...
E ela gostava e, como o queria, e como me amava!
O mar de tudo lembrava; sabia ser mar na sua
imensidão, sabia ser imenso na sua lealdade...
Enfureça-se, mar! Manda o vagalhão fazer barulho!
Manda o vento forte levar meu grito!
Manda a gaivota, o albatroz — seus mensageiros —
falar com ela!
Sacuda a nau; desperta os peixes!
Faca dela ouvidos!
Comova o rochedo solitário!
... Depois disso, se ela não voltar,
aqui voltarei em noites iguais àquelas,
aqui virei devolver a saudade
E nos seus imensos bravos, mar, depositarei a minha tristeza...
E o mar sem nada dizer, debruçou-se
soluçando sobre as areias...
CANTILENA N° 61, OP.77, N° 1
Lua, faz rastro de luz sobre o mar
E me conduza àquele recife distante.
Faz caminho cor de prata e leve-me ate lá;
Quero viver no arrecife, naufragar-me na solidão.
Lua, faz rastro de luz para eu passar,
Quero ficar só no isolamento desta noite;
Quero ouvir o marulhar das águas profundas,
Quero escutar as sereias cantando, cantando...
Lua, faz caminho cor de prata e me leve ate lá;
Deixa-me dedilhar tristezas nas minhas cordas vocais,
Deixa-me fazer cantilena para as estrelas do mar,
Deixa-me escutar as sereias chorando, chorando...
Lua, faz rastro de luz sobre o mar,
Faz caminho cor de prata e me conduza ate lá.
Quero ficar só na solidão desta noite
Dedilhando as minhas tristezas, Dedilhando, dedilhando...
ADEUS N° 99, OP.79, N° 16
O trem-de-ferro esta partindo,
Engolindo os trilhos da distância;
Vai deixando um rastro comprido de saudade,
Apitando em cada curva que se esconde.
La vai o trem-de-ferro sumindo
Pelas campinas da sua tristeza,
Deixando rastro de saudade marcado no céu,
apitando, apitando, pelas curvas dos seus pensares.
Bem distante, apagando-se na lonjura
vejo o seu adeus - quanta tristeza! quanta tristeza!
Quisera, nesse momento, ser trem-de-ferro
Chegando, de fumaça branquinha, apitando,
apitando!...
LETRAS DE BABEL 3. Antología multilíngüe. Montevideo: aBrace editora, 2007. 225 p. Ex. bibl. Antonio Miranda
SONETO No. 96, OP. 214, No. 2
Por que penetraste na redoma sagrada,
do meu amor, oh, pássaro azul — doce encanto,
dos meus olhos, diáfana luz encantada
que se ilumina e cega e que me queima tanto?
Tu chegaste, anjo azul, lindamente emplumada,
pálida e sensual, a espargir o teu canto;
ave-do-paraíso, orvalho da alborada,
estrela a relucir em teu celeste manto.
Ao teu fulgor curvaram-se deuses e eu;
o mar fez parar as ondas e arrefeceu
a fría solidão que habita seus abrolhos.
E ofuscado com brilho da azul plumagem
o poeta, sorrindo, viu na tua imagen
bem maior brilho na luz dos teus lindos olhos.
Falecimento: 12 DE FEVEREIRO DE 2019
CERQUEIRA, Luiz Carlos de Oliveira.. Além da curva, a saudade. Curitiba: Editei Graf. e Ed., 1997. ISBN 85-85329—03-3 90 p. Ex. bibl. Antonio Miranda Doação do livreiro e amigo Brito.
Imagem. Desenho feito a lápis pelo autor representando
Santa Cecília (6/6/55)
SONETO No. 47. OP94
Um soneto para a minha partida:
Uma lágrima para cada amigo.
Uma última visada, doída,
Para a minha sala — berço e jazigo...
Foi uma longa jornada, comprida,
De lembranças caminhando comigo.
Alegrias, mágoas — coisas da vida,
Que esquecer nem que deseje, consigo.
Um soneto para o que vou legar:
O telefone, a cadeira indefesa
E tantas outras coisas que hei de deixar...
Um soneto repleto de tristeza
Para o amigo que de mim lembrar
Deixarei no lenho da minha mesa.
Brasília, 15/12/91
PÉRGULA LITERÁRIA VI. 6º. Concurso Nacional de Poesias “Poeta Nuno Álvaro Pereira.” Valença: Editora Valença, 2004. 202 p.
Ex. biblioteca de Antonio Miranda
ELEGIA No. 160, OP. 115
O certo é que haverá sempre
uma porta aberta para o fim.
Quando o meu corpo de cansado morrer
que não me atormentem rezas insanas....
Quero das flores os tons coloridos,
o singelo pranto de corações sentidos.
Quando o meu corpo de cansado fenecer
que não me atormentem fumarentas velas...
Quero sentir os pássaros beijando as flores,
quero sentir as flores esparzindo odores.
Quando o meu corpo, então, já cansado
tombar, que não me ergam marmórea tumba...
Quero que me cubram com terra somente
e que me vele pequenina estrela silente.
Quando a alma do meu corpo se libertar,
que rezas nem velas me venham atormentar...
Que venha o frescor da brisa beijar os restos meus
pois estarei feliz assim, tão somente assim
e penetrarei na amplidão do meu Deus
que nunca exigiu nada de mim,
que jamais me prometeu castigos ou penas...
E me soltarei pelas campinas do meu Deus
onde os meus sentimentos perfumarão os ares;
onde os meus sonhos se realizarão enfim;
onde se iluminarão os meus cismares.
E habitarei o coração do meu Deus
que não tem forma, nem sons, nem cores
mas possui a invisível força do vento;
Deus que só me induziu semear amores
e parece só existir em meu pensamento.
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Página ampliada e republicada em janeiro de 2024.
Página publicada em agosto de 2008; página publicada em setembro de 2020
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