LENINE FIUZA LIMA
Nascido na Paraíba.
Lenine Fiuza Lima segue uma trajetória de vida singular. Ao tempo em que tem servido ao País através de diversos cargos e funções de relevância, vem-se mostrando um artista completo, desses que manejam vários instrumentos e meios para engrandecer o panorama cultural brasileiro. WASHINGTON ARAÚJO
“Lenine é o humanista sempre pronto a colaborar com as mais elevadas potencialidades do ser humano, disposto a ir à luta contra qualquer maledicência, desrespeito ou desvio do que é bom, honesto, ético e puro.” CELITA OLIVEIRA SOUSA
De
Lenine Fiuza Lima
EM NOME DO VERDE
Brasília: ALDF – Editora Academia de Letras do Distrito Federal, 2004.
86 p ilus. col. Ilustrações do Autor. [inclui poemas e outros textos]
II ...Na unidade
Antes do verde - verde,
queira-se o homem - Homem.
Sem este, o verde - verde
não será cor nem nome.
Será um verde a ver-se,
sem ter ninguém que o chame.
Primeiro, a Humanidade!
Sua vida, seu sangue:
mais que a seiva e a verdade
das folhas, que alguns homens
descoram na paisagem.
A verdade dos homens!
Mas, na totalidade!
- Sua vida e seu sangue
(que morre e escorre) vão-se
sem ter quem pare, estanque.
A verdade dos homens!
Verdade em toda parte
(aqui ou muito longe)
dos homens que têm parte
com a miséria e com a fome!
Homens que cheiram esgoto
e que respiram insetos
e que, entre um morto e outro morto,
morrem por sob os tetos
soterrados nos morros.
III...No sonho
Antes do verde - verde,
queira-se o homem - Homem.
Pois há quem o rejeite,
quem o transforme em vómito
muito antes que despeje
os rejeitos infames.
Mais do que as águas sujas,
acha-se sujo o sangue
desses homens que suam,
entre os vapores, onde
os gases ruins atuam.
Mais do que a terra nua,
o homem está nu, sem nada!
Nada que se construa
e que se chame casa,
e que se diga rua.
O homem está devastado!
E, muito mais que as árvores,
da vida está cortado: í
sem bens, raízes, artes,
ciência e antepassados.
Se com a devastação
as árvores perderam
o pássaro, a canção,
o homem, em sua pobreza,
perdeu bem mais... ou não?
Perdeu o sonho e a fé
na alegria do mundo.
Como um tronco, de pé,
coberto pelo fumo
é que ele está de pé.
E nada sobrevoa
a desnuda cabeça,
senão a névoa fosca
das extintas fogueiras
que lhe queimaram as forças.
E tudo, tão-somente,
para que exista o pasto.
Para que muita gente
também se torne um pasto
verde, na cinza quente.
ANTOLOGIA. 2º. Concurso de Poesia 1992 . Brasília: Sindicato dos Escritores no Distrito Federal – SEDF, Cultura Gráfica e Editora, 1992. Apresentação: Menezes y Morais. 106 p. 15 x 21,5 cm.
Ex. bibl. Antonio Miranda
1º. Lugar no Concurso:
FARDA E ARMA
Não é a farda de fora,
mas a de dentro,
e não a que veste o corpo
— o pensamento.
Esta é a farda que impõe
os regimentos.
Não são as armas que atiram,
mas de outro invento,
não as que atingem explodindo
— mas o silêncio
disparado sobre as linhas
dos documentos.
Não são as armas de sangue,
mas as de tinta.
E não são as que apagam e empoçam
— são as que avivam
a lei que seca o que é seco
pra que se extinga.
Estas, sim, as aramas e fardas
de tão malditas —
são brinquedos na cabeça
recém-nascida.
E vão armando se vestindo
— por todo curso
da vida, que pouco vale,
fantasticamente bruto —
de razões e inteligência
de cada adulto.
Não é a farda de fora,
mas a de dentro.
E não a que veste o corpo
— o pensamento.
Esta é a farda que impõe
os regimentos.
FIUZA, Lenine. I Suma Poética. Brasília: Clube da Madrugada de Brasília, 1967. 36 p. No. 10 030
Exemplar da biblioteca de Antonio Miranda
FUGAS
Número dois
Querer que a folha sem árvore,
vestida de estranha cor,
com semelhança de terra,
sem altitude e sem dor,
seja verde novamente
é voltá-la à árvore altiva,
dá-lhe seiva, dá-lhe vida
sofrida, porque finita,
tal como a vida da gente.
Número três
Podíamos. Podíamos os dois
habitar o silêncio, com o silêncio
do nosso amor que é uma recusa eterna
à oralidade que nos atormenta.
Que grandioso silêncio!... E dois olhares,
silenciosos, na vasta solidão
guardada pela paz de tanta ausência
e da presença apenas dessa união...
Dois olhos frente a dois. A quantidade
única, real, sem gestos, sem palavras.
Tal como a terra e a lua. O sol e a terra.
Tal como o bem amor e a bem amada.
DO OFÍCIO DAS CRIANÇAS,
IMPERATIVAMENTE
É imperativo que se cuide urgente
da semente que se abre com pálpebras.
E lança o ingênuo olhar de caule tenro
entre cílios de folhas verdes e álgidas.
É imperativo que se busque urgente
a água dos dedos, que se escorre amiga
da mão que sé fonte, a fonte mais perene,
com límpidas carícias estendida.
É imperativo que se exponham urgente
ao sol os frágeis braços vegetais,
para que brinquem com os brinquedos quentes,
que a claridade pelo espaço faz.
É imperativo! A terra está cansada.
O tempo se deteve na colheita.
E o que se colhe agora é quase nada.
E a plantação periga ser desfeita.
Mas a semente existe. E existe nela
o olhar de caule tenro, descuidado.
É imperativo que se cuide dela
para um tempo de flores anunciado.
*
Página ampliada e republicada em setembro de 2025.
Página ampliada e republicada em março de 2022.
Página publicada em setembro de 2011
|