JOSÉ ROBERTO DA SILVA
José Roberto da Silva (Poços de Caldas - 25/07/1946) inspirou-se no movimento de Poesia Concreta dos anos 60. Em SP - com Flávio Maía, Silvio Caccia-Bava, Tim Urbinatti e Bete Ferrari - produziu o Show Articulação (USP-1973), canções e poemas contra o golpe no Chile.
Editou em SP o livro de poemas Hora Estancada (1974), parceria com Flávio Maia, em gráfica clandestina. Publicou poemas in folio - Alamerica, São Pauto, Diário de Campanha - lançados no Sesc-Fábrica Pompéia e alhures e algures.
Também com Flávio M aia, iniciou programa de poemas na TV Cultura - SP, instantaneamente proibido pela censura (i975). No Rio, 1977, editou Textos O, folheto com textos de Luís Artur Toríbio, Eduardo Mancaz, Tim Lopes e Cia. e o folio La Marinhera, poemas com xilogravuras de Bete Ferrari.
Em SP e Sul de Minas, foi co-editor com Netinho Barbosa do jornal Uai, com apoio do jornal Movimento (1980). Em Brasília, 1985, colaborou na 1a edição da revista Bric a Brac e integrou álbum-coletânea de poemas em silk screen - edição de L. A. Toríbio, arte de Reza e gravura de Hermuche - chancelado pelo Ministério da Cultura.
Editou pela Thesaurus Sementes da Memória — os rebeldes de 68 (2007) e o caderno Fotos de 68. Atualmente, colaborador- articulista do Jornal de Brasília
Excertos do MINIBIO de José Roberto da S.:
Vim do Rio para BsB em 1977 — Jornal do Brasil. Fugi em 78 e jurei não voltar jamais. Voltei vitorioso em 85: redemocratização. Ando porque não
tenho raízes. (***) Não faço trovinhas. Cultivo trovões. (***) Sou da ENA — Esquerda Não Alinhada, Libre -Pensador. Optei pela Democracia. (***) Sou ocidental e admiro muito o oriental. (***) Falo Portauzil – Português do BraZil. Reciclo-me para ser Observador e Desinfluencidor Digital. (***) Se eu morrer, digam que vi o mundo, o ouvi; provei e gostei.
***
Ouço diariamente o noticiário das galáxias
A previsão do tempo na cauda dos cometas
***
Afinal, apenas dos hojes posso me recordar
Os amanhãs ainda não existem
Nem um de nós perdeu a fé nesses
Seres sensitivos extra-sensoriais.
Aquelas cartas não se escrevem mais.
É UM POETA PARA SER LIDO E RELIDO. DEVEMOS APRENDER COM ELE, SEGUI-LO! VENER – AÇÃO... ANTONIO MIRANDA
SILVA, José Roberto da. Diário blue do B. Brasília, DF: Thesaurus Editora, 2013. 126 p. 13,5x21 cm. Ilustração da capa”acrílica sobre tela de Pablo Tarquinio – “Vila Madalena”. ISBN 978-85-409-0250-3 “José Roberto da Silva” Ex. bibl. Antonio Miranda
Toda curva tem um centro
Foram as duas pontas do vento
o arco retesado daquele amor
(06 08 08)
19 02 08
Por amor às criaturas do verbo crer
criadas
venerava eu a cor do sangue
admirava a arquitetura das espáduas,
a moldura
dos ombros envolvendo teus seios
amava a humana frágil figura
amava tuas coxas ambulantes
o conjunto dos sorrisos e titubeios
Amava nossos egos tropicais
em sentido trigonométrico amorais
amava teu casaco de lã uruguaya
pendurada na maçaneta do armário
Pois hoje tudo é décor design fashion geometria fria
o triângulo dos teus pelos castanhos
a quadratura chanel dos cabelos
e a coleção de pincéis de lontra
O crayon sumido sob o calendário
sinuosas hachuras de nanquim
você e eu preto e branco dentro de mim
um pouco de frenesi
um tom de anil lazúli
As palavras que me brotavam de ti
me perseguiram como o cão siamês
E a palavra amor é cava e surda
solta altissonante
casa do dragão delirante
(12 05 08)
33 tributos à Orides Fontela.
O tempo é a boca
cheia de ser;
devora-me, por favor.
*
O avesso?
e por acaso sou Caim de mim mesmo?
*
O caos, quando olha no espelho,
finge, de um modo irritável,
que não me vê.
*
Se eu fosse árvore,
teria caules, raízes,
poemas de flores na primavera, incêndios na seca.
*
Quando eu penso no pensamento,
são duas paralelas onde jamais me encontro.
*
Arqueologia do crânio:
somos todos mandíbulas treinando assovios.
*
Fabriquei telhados;
ainda aguardo uma explicação das andorinhas.
*
Som, mais som; tonitruanie.
Não temo os ruídos.
*
Os ossos também envelhecem.
Sorrateiramente, sob as peles,
as unhas crescem.
*
Olhei na caverna da Fonte dos Amores.
Não eras a minha,
eras a sombra da Terra.
*
Argis, urgis, furgis, sorvis.
Mastigo palavras.
*
Às vezes penso que eu sou eu,
me assusto comigo mesmo.
*
Estou aqui, exatamente aqui.
São tantas esquinas, tão poucas raízes.
*
No fim, toda a água evaporará.
Portanto, não cremem este corpo.
Ele mesmo irá se esboroar por seus próprios poderes,
pequeno, ardente punhado de terra e orvalho.
*
Deixem-me ao menos os ossos,
memórias em cálcio e mudas,
colunas silenciosas que já estiveram eretas
sobre as quais viveu meu ser.
*
Sobre a terra nua,
oscilando entre a gravidade do magma e a suavidade do sol,
no pequeno bloco de granito, coloquem meu nome
e digam que vim, vivi, gostei
e, sinceramente,
sei que retornarei para concluir o solo de flauta
do poema de amor que ainda não decorei.
*
A flor, o sol, o amor, a lua,
eles estão lá, como sempre.
E eu estive aqui.
*
Com exceção das serpentes marinhas,
não devo explicações a muitos outros mitos.
Mas, por favor,
libertem os pequenos demônios inocentes
encarcerados nos búzios.
*
Seria bom que os anjos existisscm.
Eu despencaria mais tranquilo
em meus abismos.
São dois pequenos anjos flanando as asas ao rés do chão,
no quintal do Brique,
cão, clerical e maldito.
*
Antes das florestas, muito antes,
eu já fabricava frutos doces.
*
Criei a seita das mãos tapando os olhos.
Nem um de nós se iluminou.
Apenas um zumbido azul saiu pelas orelhas.
Seriamos como nuvens atravancando os portões?
*
Não me perdi na arte de pensar.
Os pensamentos se perderam por conta própria.
*
De todos os artefatos,
ainda prefiro a poesia.
*
Sobre a luz que está dentro de mim,
procuro o interruptor.
*
Estou fabricando deus,
faltam-me as maiúsculas incandescentes.
*
As pedras que a terra cria
também terras se criarão.
*
Eu faria crepúsculos em preto e branco,
algumas árvores transparentes,
as cores dentro de baldes, em fila.
*
Quando você entrou no navio
decidi ser farol, filha.
»
A razão da natureza
pode ser um sim, pode ser um não.
*
Agora, o invisível me comove.
*
Desisti das constelações.
Agora é face a face, estrela por estrela,
gota por gota de sangue.
*
São tantos e são os sete oceanos,
basta-me apenas o atlântico dos teus cabelos.
*
Eu sou,
mas tem me dado um trabalho danado.
*
Se eu fosse um gigante,
pularia de montanha em montanha
beberia água pura nas nuvens de setembro.
*
Não sou eu, não são meu gritos.
É o silêncio que me empurra pelas costas.
*
Eu picado por um colmeia de amnésias
e, oculto, o mel da poesia.
*
“Os insetos raros”.
Eis tua frase contraditória.
Eis tua rua sem nossa história.
*
A sombra atrás do espelho,
ela,
procura um corpo na luz.
*
Ontem eu já sabia,
e hoje continua a ser inútil.
*
Rabos, crinas e pic-nics:
sempre com a ponta dos dedos.
*
O poeta pode estar só,
porém procura no infinito.
2006-2007
Para Nathanael de Moura Giraldi
e Antonio Luiz Fontela.
SILVA, José Roberto da. Babilonika: Monalisa Malabares - Antinômio Tártaro – Oráculos Urbanos. Brasília. DF: Thesaurus Editora, 2016. 85 p. 12,8x19 cm. ISBN 978-85-64494-80 “José Roberto da Silva”
Ex. bibl. Antonio Miranda
MalabaresMalabaresMalabares
Malabares malabares
meu corpo em chamas
na porata dos teus
quinhentos bares
teu corpo de água
inflamando
um por um
meus sete rubros
mares
o fósforo,
rápido quando aceso
dentro
de um grão de areia,
incendeia
a pedra incandescente
grená vermelha
minério mineral
jogos
fogos de artifícios
labaredas nos teus orifícios
úmida onduleia
e sereia
Últimos gritos
O prazer foi o sabor da
noite baunilha
a luz era noturna
áurea lua que nos brilha
la plata argêntea
la plata é pura
Havia o sereno do céu
na grama do gramado
quadras blocos e ruas
lubriluminosos abismos
mergulhados em brancas noites
tuas pernas nuas
Aos poetas
Poetas
hospedeiros das palavras
as mais belas
estranhas
doces
flutuantes dores
em cores malhadas
coaguladas
posadas
verdes vertebradas
ao rés e fundo
capim no chão deste mundo
Havia sorrisos nas bocas felizes daqueles
anônimos artistas e poetas
e um sinete de rubro gelo marcado com
beijos em cada testa
Depois, dissolveram-se em
palavras criadas pela provisória carne
Hoje, nada mais, para nós, deles nos resta
(31/03/2012)
1ª. BIENAL DO B – A POESIA NA RUA. 26 a 28 de Setembro de 2012. Brasília: Açougue Cultural T-Bone, 2011. 154 p. ilus. col. 17x25 cm.
Monaaaaalisamonaaaaalisaaaaamonalisa
morda-me molemente
a mente
a carne é frágil
a carne é lisa
oh monalisa
a carne crua
cruamente
atropelada
na rua
a carne brancamente
loucamente coça
enrosca
e sua
oh monalisa
a face sorridente
acende luminosamente
e nua
onaaaaalisamonaaaaalisaaaaamon
você era meu pão de Kant
a presa marfim do elefante
minha estrela de Hollywood
energia quark estonteante
areia aveia aquário
abóbada do meu planetário
íon por íon inflamário
tão perto e tão distante
voz ciciante no me baixo-falante
apoesiatempuderapoesiatempuder
emnossas breves vidas
caóticas coloridas
eletrobiônicas babilônicas
cosméticas performáticas
transatônicas
nosso federal desejo pré-sideral
atonal
pois são vidas afônicas agônicas
em dias terrestres terríveis
de emoções
astronômicas
oh angustiformes canções
pulando sem rede nesses
cotidianos trapézios triangulares
das nossas quadrilhas julinas felinas
tragicamente carnava-rocambolescas
sobre-aquáticas e plásticas
pagando a prestações módicas
velhas camas conjugais clássicas
monalisamalabaresapoesiatempuder
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SILVA, José Roberto da. Fios macios metálicos. Capa e ilustrações: Bellla Santiago. Brasília: Tagore Editora, 2023. 96 p. ilus. ISBN 978-65-84821-42-2. Ex. bibl. Antonio Miranda
Areias de neón
A minha sombra é testemunha dos meus dias ao sol.
Oculta pela noite,
Tece essas tênues telas ao redor dos meus enredos.
***
Se mergulho em águas frias,
Aqueço-me em teu corpo quente.
Uma noite basta para gerar infinitos dias.
***
Por ser jovem,
O amor escorregava em minhas mãos
Como um sabonete.
***
Tuas melodias em minhas letras,
Cantigas de pássaros ondulando mantos de seda.
***
recuso-me. Com veemência e com firmetude.
A levitar,
ainda é cedo para que eu tenha entendido.
O mar,
porque as pessoas sorriem quando se devia.
Chorar,
talvez eu seja portador de uma mensagem.
De amor.
(06/05/14)
Fulgor
Fulgor
O sumo vermelho desses reflexos
Grená azul siena
A cútis superfície moura morena
Era bom falar nas coisas serenas
A penteadeira era um toucador de camarim
Tua face — eis a tela
Moldura
Um gesto da mão no ar vazio
Repita aquele antigo texto
Não olhe assim para mim
O tempo também já foi um rio
Botões e pós-de-arroz
Uma pitada de rouge
Asa pálidas de serafins
Eu viajava através dos espelhos
Buscava tua face dentro de mim
Tudo eram excessos e labirintos
Pois nem eu sabia que eras assim
Femens Sapiens
Foi quando ela percebeu uma saída para a fragilidade
Do nosso entendimento
Da nossa frágil vida
Constante era apenas o sol e a lua
Os cursos dos rios confiados em chegar ao mar
A teimosia dos lagos em estancar naquele lugar
No entanto a terra tremia
Havia vulcões e ventanias
Felinos rondavam atraídos pelas novas fogueiras
A note cegava nossos olhos
Caminhávamos sobre a terra
Vermes e frutas, raízes e mel
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SILVA, José Roberto da. galopreto (um corpo rústico brasileiro). Brasília: Trampolim, 2024. 100 p.
ISBN 978-85-5325-077-6 Ex. biblioteca de Antonio Miranda
Certidão
Fui criado bem aí, todos podem me ver
Aí, ao longo desse dédalo de canteiros
Couves apendoadas, frescor de alfaces
Venerosa alva Flor de Lis, suave Dália
Penso que já fui verde tal como essas favas
Flores róseas sobem pelo mourão da porta
Tão frágil e velha ao sol no limiar da horta
*
Às vezes uma luz brota em mim
São esses lampejos que não vejo
São pequenos oásis de memória
Serenos assim
Você conhece essa calmaria
Eu a vejo quando olho o céu
O céu de dia
Deito-me na grama fresca da calçada
Essas brancas nuvens na montanha
Sou eu mesmo, um corpo moreno
Há um pouco de luz no que vejo
Então não sinto nenhum medo
(01/08/15) – Bistrô Le Calmon)
DOIS POEMAS ILUSTRADOS NA CAPA FINAL DO LIVRO:
*
Página ampliada e republicada em março de 2024.
Página ampliada em maio de 2023
Página ampliada em novembro de 2020;
Página publicada em julho de 2011; ampliada e republicada em julho de 2016; ampliada e republicada em outubro de 2016
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