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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


GUSTAVO DE CASTRO

GUSTAVO DE CASTRO

 

Naturalmente, Gustavo de Castro não sabe ainda muito bem quem é, mas tem se esforçado muito para isso. Como parte desse esforço, escolheu  voluntariamente a poesia e a espiritualidade como caminhos para o autoconhecimento. Foi este esforço também que o fez fazer jornalismo, filosofia, doutorado, escrever livros, amar, plantar árvores, ter filhos, viajar, virar monge, professor e editor. Atualmente, dedica-se ao sentimento do Tempo e da Graça e à prática do que é Belo. Por conta disso, tem tido uma existência igual à dos passarinhos. Noutras vezes, parece mais um jabuti.




De

os ossos da luz
Brasília: Casa das Musas, 2007

 

LIXO VALIOSO

 

Vou-me escrevendo agora com as letras da dor, redigindo poemas a sangue. A palavra não me dá frescor. Antes, me é aflição. A palavra nunca me deixa em paz. Para que ela me acomodenecessitra que eu agite.

 

Lavo a calçada da casa onde moro todos os dias de manhã, para que minha impureza invada o mundo.Minha impureza é a palavra. Minha indelicadeza, poesia.

 

 

DONANA

 

Chegavas quando o parque estava deserto.

Nenhum brinquedo te favorecia.

 

 

                     OLÉLIA

 

                   O tempo abriu sua boca

                   e o mar das horas cheias

                   desaguou

                   em todas as suas ocasiões

 

Veio dizer que as ligas do Tempo

eram musicais

necessárias

como o amanhecer das vigílias.

 

Veio dizer que seus pés vão embora

no beija-flor azul canhoto.

 

 

CAOS E CAIS

 

Há regiões do cérebro que não servem para nada.

 

Acho que penso com elas.

Minhas conexões são eternos lapsos

entre o caos que

e o cais que desconheço.

 

Se eternistante caos

instantequero cais.

 

 

SILÊNCIO

 

Reservar uma hora do dia para falar.

Nas outras, falar de boca fechada.

 

Reservar um instante do dia para calar.

Nos outros, calar de boca fechada.

 

Reservar uma vida inteira

para aprender a calar por inteiro.

 

Nas outras, calar as metades.

 

 

O AMOR

 

O amor é um sapato

que nunca se ajusta

a nós. Com ele,

não sabemos caminhar.

 

 

OBSERVAÇÃO EMPÍRICA

 

Quem ama de verdade alguém,

esse alguém que se cuide!

 

 

LONGE LUGAR

 

Se o círculo começa onde termina,

onde começa o que não tem fim:

 

 

SER LIVRE

 

O mais livre do meu escrever é que não preciso concordar comigo.

 

 

COMO SABER?

 

Nos teus calados planos

andas braços dados

com os enganos?

 

De
Gustavo de Castro
POEMAS VIS
Brasília: Casa das Musas, 2010
ISBN 978-85-98205-63-2

 

1. azeviches
(fragmento)

Talvez porque eu seja triste em tudo, cultivo a alegria como
bem supremo! Adoro quem sabe gargalhar desgovernadamente.
Sim, sei que são um tanto aborrecidos explodindo (ora vejam!)
sua alegria para todos os lados, como se fossem macacos. Mas,
sinceramente, ainda prefiro a simiana forma de lidar com o
mundo, do que o relincho, o urro, o miado ou o grunhido.

Ser feliz em público às vezes incomoda.



2. estanhos
(fragmento)

As violetas nunca crescem no meu jardim.
Preferem as sacadas da vizinha, os xaxins
Amadurecidos no jarro velho, lá tranquilos
No antigo Casarão.

Quando as violetas surgem nos buquês
Ou chegam entrelaçadas no roça-roça
De seus fios, ou quando, lá tranquilas
No antigo Casarão.

Na primavera, surgem devotas
Nas sacadas lajes varandas
aí sei — bem sei

Violetas são devotas da tristeza.

*
Em mim há o ar
Abafado
Cujo tempo
Aturdido
Amarelou

Em mim há o ar
Absurdo
Atabalhoado
Cujo tempo
Curtido

 

CONHECER UM POETA


José Castello
O Globo

[sábado, dia 30 de Janeiro 2010, Caderno Prosa e Verso]


As informações, na última página, são mínimas. O autor é professor de estética e dá aulas na Universidade de Brasília. É seu segundo livro. E eis tudo. Contenho o impulso de pesquisar o nome de Gustavo de Castro na web. Decido ler seu livro, “Poemas vis” (Casa das Musas, Brasília), sem nenhum apoio externo. A seco.


Vou direto aos versos. Na página 26, não com uma resposta, mas com uma pergunta, Gustavo me ajuda. “Três formas de abaixar?” E oferece, em seguida, três respostas. “A primeira forma é abaixar para cheirar a flor”, diz. Aproximar-se, se render, ceder espaço ao que é. Chegar a cada coisa, e ali ficar, quieto.


A proposta de Gustavo me remete aos versos de Alberto Caeiro, que nunca me canso de ler: “A Natureza é partes sem um todo,/ Isto é talvez o tal mistério de que falam”. O poeta se abaixa e cheira. Uma flor, e não outra. Isso, e não aquilo. Ali se detém, em silêncio. Nos dias de hoje, em que somos levados a querer tudo e não conseguimos parar, isso é bem difícil.
Propõe Gustavo uma segunda maneira de abaixar. “A segunda forma é abaixar a crista”, diz, sem meias palavras. Diante da coisa — uma flor, uma cidade, um poema —, se resignar, aceitar. Não desejar mais, nem procurar mais. Conter-se. “Menos, meu amigo”, ele escreve.
Nesse ponto, me voltam os versos de Marianne Moore: “O sentimento mais profundo sempre se mostra em silêncio;/ não em silêncio, mas contenção”.


Eu os reencontro em “Silêncio”, um dos “Poemas reunidos”, de 1951. Piadas do acaso: o ano em que nasci.
Última proposta de Gustavo: “A terceira forma é o exercício do abismo: de vez em quando observar os vendavais”.
Coisas de que fugimos: ventanias, tempestades, desastres naturais. Não fugir, permanecer e observar.


Ainda não sei quem é Gustavo de Castro, mas começo a entender o que ele busca. Na página 37, em um pequeno poema, ele me dá mais um sinal. Escreve: “Oh Vera/ Nem toda maçã/ Apodrece/ Nem toda laranja/ É de sumo/ Nem todo limão/ Emagrece”. As garantias? Não temos, mas hoje quase todos se recusam a aceitar isso.


Escapam os poetas, que por isso são poetas. Segue Gustavo: “Nem sempre a verdade/ É a realidade/ Vera”. E ainda: “O real que se vê/ Não se crê/ Vera”.
Para que serve a poesia, senão para desarranjar nossas medíocres convicções? Os grandes cientistas sabem disso: você chega a um ponto, mas não deve se dar por satisfeito; logo outro abismo se abre e o antigo ponto de apoio, que parecia tão firme, se esfarela. E você despenca.


Mais um salto e volto a Alberto Caeiro, que me ajuda a ler Gustavo: “Procuro despir-me do que aprendi/ procuro esquecer-me do modo de lembrar que me ensinaram”. Não, não é fácil.
É humano que não se consiga. Mais humano ainda que não se queira. Mas a poesia nos incita a uma aproximação.
Poetas desconhecidos incomodam.
Ficamos aflitos: — É bom? É ruim? O leitor espera que eu o ajude nessa decisão.
Um leitor quer saber onde pisa, ou se angustia. Crescemos assim, nossos pais nos ensinaram a não falar com desconhecidos.


Devemos imediatamente conhecer, ainda que isso mate o que desejamos conhecer.
Sugere Gustavo, em outro poema: “Submerso nas cores, o destino do poeta é ser porta-voz da noite”. Ecos tardios do Romantismo. Na Brasília do século XXI? E por que não? Em seus versos, Gustavo propõe um “exercício do abismo”. Sua ideia me joga de volta em “A atração do abismo”, ensaio do catalão Rafael Argullol sobre a paisagem romântica, que leio em uma edição da Acantilado, de Barcelona.
Ganhei o livro de Flavio Stein, que o trouxe de Buenos Aires. Não consigo parar de ler.
Diz Argullol: os românticos praticam uma “contemplação da contemplação”.
O objeto dos românticos é a noite, isto é, um não-objeto. Não contemplar isso, ou aquilo — permanecer na própria contemplação.


Sabiam os românticos que o obscuro, servindo de moldura negativa, delineia e acentua a luz. Uma boa imagem é a sala de cinema. Para que nos concentremos na pequena tela, é preciso que, pelas bordas, acima, abaixo, atrás de nós, a escuridão domine.
Contemplar a contemplação é observar esse homem (Gustavo de Castro) que, precariamente, se apoia em um pequeno foco de esperança. Tanto que escreve poemas. A poesia não é tudo. É quase nada. Mas dela um poeta não se arrasta.


Continuo com Gustavo: “Quando a cortina de fumaça passou, tudo ficou vazio. Voltei então a me ver. O nada para me espelhar não necessitava de nada”.
Só o poeta dispensa a cortina negra.
Talvez nem ele: só em contraste com a memória esfumaçada, o espelho vazio enfim se imponha.
Vejam vocês como é difícil! Você começa a ler um poeta desconhecido.
Abre as primeiras páginas, pisa os primeiros versos, cheio de receios e de esperanças.
Deseja, logo, conhecê-lo. Gostei.
Não gostei. Avança, mas os versos o atropelam. Não estão ali nem para que gostemos, nem para que desgostemos.
Estão ali à espera de uma leitura.


Volto, ainda uma vez, a Alberto Caeiro: “O que me apontaram nunca estava ali: estava ali só o que estava ali”. É pouco, mas é. Talvez por isso, Gustavo chame seus poemas de “vis”. O próprio poeta os menospreza, os toma como coisa menor. Apesar disso, ele escreve.
Escreve e publica. Por quê? Encontro uma resposta em outro de seus versos: “Quem ama verdadeiramente não busca refúgio em ninguém”.
Muitos, hoje, se dedicam à poesia na esperança de vantagens. De refúgios. É como ostentar um título, uma descendência, ou uma conta bancária, imaginam.


Volto ao amigo distante que, às vezes, me telefona para dizer: “Hoje escrevi um poema extraordinário”. Gustavo faz o oposto: já no título de seu livro, anuncia a debilidade do que oferece. Algo assim: “Não sei se presta, mas está aí. É o que posso”.
Foi o que me levou a seu livro. Um poeta que conhece a delicadeza do que faz, e não foge disso. Atitude de poeta, e não de esnobe, ou de hipnotizador.


Poemas que atravessamos, sem a ilusão de que irão nos acolher para sempre, ou resolver nossas aflições. Lemos, viramos a página. Volto a Marianne Moore: “Nem era insincero ao dizer: — Faça de minha casa sua pousada./ Pousadas não são residências”

 

Recomendamos:

CASTRO, Gustavo; DRAVET, Florence.  Comunicação e poesia: itinerários do aberto e da transparência.  Brasília, DF: Editora da Universidade de Brasília, 2014.  220 p.  15x22 cm.  ISBN 978-85-230-1124-6  Capa e diagramação: Tela Tanto Mar.  Inclui os capítulos: Abertura; Comunicação, Poesia e Pensamento; Poética dos fundamentos da comunicação; As dimensões do profundo na comunicação; Para quê Poetas?; A casa aberta da linguagem — ensaio do método.  “ Gustavo de Castro “ Ex. bibl. Antonio Miranda

 

Recomendo este livro aos estudiosos da poesia, da comunicação, da ciência da informação. Para ampliar a visão do fenômeno poético, da poiesis, da criatividade. Os autores explicam (vai um fragmento, leiam mais no livro...): “Este livro entende a comunicação como um fenômeno estético. É impossível compreender a comunicação em nosso tempo se não privilegiamos as emoções, os afetos compartilhados e os imaginários. No choque entre o imaginário e a reflexão filosófica encontramos um novo caminho para a comunicação: o da poesia.”

II BIENAL INTERNACIONAL DE POESIA DE BRASÍLIA – Poemário. Org. Menezes y Morais.  Brasília: Biblioteca Nacional de Brasília, 2011.  s.p.  Ex. único.

 

 

Cabe ressaltar: a II BIP – Bienal Internacional de Poesia era para ter sido celebrada para comemorar o cinquentenário de Brasília, mas Governo do Distrito Federal impediu a sua realização. Mas decidimos divulgar os textos pela internet.

 

 

O poema espera

 

o tempo certo

a palavra certa

o silêncio certo.

 

Poemas são esquecimentos

acompanhados de gavetas.

 

Exibidos que são

amam se publicar

em assopros.

 

A minha poesia é prosada

 

como a pedra,

presente como o nada,

variada como a água

das temporadas.

 

Quando fica estancada

também é podre e empoçada.

 

 

 

Meu compromisso é com as almas

 

Não com os homens. Nada devo a eles.

Mas às almas devo muito.

Devo a minha identidade,

o meu estado desaparecido.

 

Fui engolido pelo céu

 

tornei-me alimento dos deuses.

 

Então que sabor tenho?

Que cagada serei?

 

Se o céu se alimenta de mim

Eu de que lhe nutro?

 

Se o céu me masca a mim

Eu de qual árvore sou fruto?

 

 

Nunca estou sozinho

 

Vidas habitam em mim.

Na cabeça, caspas.

Nos pés, bichos.

No estômago, vermes.

 

Quando me sinto só,

tenho por companhia

dissabores.

No corpo, cansaços.

Na alma, obsessores.

 

Nunca estou só.

Digo, só comigo.

 

Tenho as ideias bêbadas dos amigos.

 

E dois ou três vazios

como abrigos.

 

Às vezes o poema não se deixa terminar

 

Faz questão de ser assim para mostrar

quem manda.

 

Mas, no fundo, nenhum poema tem fim.

Apenas se abandona para prosseguir

noutro poema escrito em qualquer parte

por qualquer um.

 

 

Página ampliada e republicada em abril de 2019

 



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