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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 




ESMERINO MAGALHÃES JÚNIOR

(1939-1996)

 

 

Nasceu no Rio de Janeiro, em 1º de novembro de 1939. Foi poeta, pintor e compositor. Faleceu, em Brasília no dia 21 de julho de 1996. Era neto do escritor Raymundo Magalhães e sobrinho de R. Magalhães Júnior.Diplomou-se em Letras (Português, Latim e Literatura).Chegou em Brasília em 1960, onde trabalhou como Revisor do Departamento de Imprensa Nacional, Taquígrafo do Tribunal Superior do Trabalho, Revisor e Diretor Substituto do Serviço de Taquigrafia do TST. Foi, também, filiado ao Sindicato dos Escritores no DF e um dos fundadores da Associação Nacional de Escritores. Participou de diversas antologias, e deixou no ineditismo, além de contos e músicas, um livro de poesia pronto para edição. Esmerino Magalhães Júnior deixou uma grande lacuna no meio cultural brasiliense e, por conter vitalidade, tanto social quanto estilística, sua poesia merece melhor exposição pública.

 

Bibliografia:

Ir entre vivos, 1978; Aos trancos e barrancos (peça com textos de escritores de Brasília encenada em Brasília e em São Paulo); Notícias de Inutilidade (inédito, de poesia).

 

 

 

A FÁBRICA DE CERTEZAS

 

Eu era um tanto tolo e a vida imensa.

Quanta coisa por saber e uma infinita crença

nos ismos que catalogavam todos nossos atos.

Quanto mundo, quanta insânia e quanto sonho.

E eu, Quixote de intenções tão desastrosas,

comungava vagas utopias, construía catedrais

de idéias generosas que desabavam mês a mês:

minhas certezas.

Mas para que saber alguma coisa desse mundo

no mar de dúvidas de inúteis astrolábios?

Para que Norte distante dos meus sonhos

me guiaram bússolas, sextantes, alfarrábios?

Quem fabricaria por mim, com precisão,

os meus enganos?

Inútil como exorcizar as pedras excogitar a vida

se a gente tem apenas dezessete anos.

 

 

TREVOS (Trechos)

 

Quase trovas — trevos.

Pequenas solidões que a gente leva

do funeral da aurora até o nascer da treva.

 

E vi teus olhos revestidos de pequenos brilhos

líquidas porções de dor

dilúvio por nascer.

 

Oh, tuas mãos de avencas trêmulas

na aragem imperceptibilíssimas:

o toque em minha mão suavemente elétrico.

 

Caiu do peitoril meu olhar para as dracenas.

Manhã de abril, piados de tiziu

e a vida tão pequena.

 

 

O AVIÃO

 

O avião                  no solo

metálica escultura de um animal absurdo

é um pterodáctilo obeso, cansado,

prenhe de gente com males e malas

contendo pequenas vidas e pequenas fraudes

e o grande medo da loteria sideral.

 

O avião                  no ar

é um pássaro ruidoso, fratulento,

como os grandes prodígios humanos.

O avião é a Torre de Babel edificada em estrondos,

o verme ascendendo aos céus:

o avião é o Homem.

 

O avião                  ao longe

falena argêntea fluindo nos silêncios

faz-me pensar que é uma pequena pena

solta das asas do arcanjo Gabriel

que ao sol flutua com sonhos de Ícaro

e bússula de Dédalus.

 

O avião                  na noite

de vago lume, pirilampo estelar

e seta inserta na sina do horizonte,

o avião, tenho certeza agora,

é um emissário de Deus

para acender a aurora.

 

 

LIVROS

 

Os livros dormem o sono estático das estantes.

Na vazante dos séculos foram palimpsestos,

papiros, tijolos de Alexandria

e fábulas em tabulas marcadas por estilos

cuneiformes, efêmeros, no alforje

do tempo enorme.

 

Mas o que faz estremecerem as estantes

nesses instantes de tremor de avencas

em calmaria plena?

 

Será o crepitar de idéias murchas

sob as botinas da descrença?

Será o apodrecer dos cadáveres

de tantos sonhos abortados?

Será o germinar insistente

das mais alucinadas utopias?

 

 

 

 

XXVII

 

O SARGENTO QUE MATOU GARCIA LORCA

está sentado. A mão direita de seu padre

todo-poderoso na aldeia acena-lhe da porta

da igreja. Corpo ainda modorrento do catre,

levanta-se, pensando no que mais importa:

à tarde, ao vinho, virá o melhor alcatre.

 

O sargento que matou Garcia Lorca

vai à missa domingueira e genuflexo

é o herói da aldeia. A legenda nunca morta

revive nos serões, nas tascas: três balas no plexo,

sem ao menos tremer de leve os dedos,

dono e senhor dos seus e outros medos.

 

O sargento que matou Garcia Lorca

é um velho forte, alto, e na taverna

mais cresce ainda quando o vinho emborca,

contando história antiga aos outros da caterva

(o moço efeminado, trêmulo, de gelo),

quando viril, com seu fuzil e o zelo,

matou de vez a consciência porca

do sargento que matou Garcia Lorca.

 

 

I

 

E QUE SE VAI DIZER DESSE MENINO

que era puro e não fumava,

que acreditava em presidentes

e colecionava figurinhas?

 

E que se vai dizer amanhã

quando viajar a notícia

que ele não crê mais nos pilares

das certezas uterinas, que violentou

a última metáfora, dessas que agasalham

verdades em linha reta, tão antigas?

 

E que se vai dizer quando souberem

que andou com moças no escuro

e transbordou a cólera no muro

e disse coisas não codificadas?

 

Que se vai dizer desse menino?

 

 

MEMÓRIA SUBURBUNA

 

xv

 

Há uma casa no Méier

com pedras antigas

e muita personalidade:

um senhor de colete na varanda

e cabelos brancos.

No Méier há uma casa de pedras aparentes

e sentimentos ocultos.

 

 

 

MAGALHÃES JR, Esmerino Jr.  A fábrica das incertezas. poemas Goiânia: Kelps, 2018.   66 p.  Capa: Silvia Magalhães.    ISBN  978-85-400-2379-6  Ex. bibl. Antonio Miranda

 

A poesia de Esmerino Magalhães Jr. se insurge, pelo vigor da expressão e pelo ritmo tempestuoso, contra o marasmo, contra a acomodação dos bem-comportados poética e politicamente. Seus versos são brados que ressoam, clarins que despertam. Não lhe faltam, porém, o tom lírico, o mergulho no mundo interior. E como nota Alan Viggiano, "podemos sentir ainda dois aspectos neste feixe de poemas: um rever nostálgico da infância [...] e o desencanto diante da mediocridade burocrática, da mentalidade estreita do cotidiano".

Wilson Pereira

 

 

LIVROS

 

Os livros dormem o sono estático das
estantes.

Na vazante dos séculos foram
palimpsestos,

papiros, tijolos de Alexandria

e fábulas em tábulas marcadas por estilos

cuneiformes, efémeros, no alforje

do tempo enorme.

 

Mas o que faz estremecerem as estantes
nesses instantes de tremor de avencas
em calmaria plena?

 

Será o crepitar de ideias murchas
sob as botinas da descrença?
Será o apodrecer dos cadáveres
de tantos sonhos abortados?
Será o germinar insistente
das mais alucinadas utopias?

 

 

 

A fábrica de certezas

 

Eu era um tanto tolo e a vida imensa.
Quanta coisa por saber e uma infinita crença
nos ismos que catalogavam todos nossos atos.
Quanto mundo, quanta insânia e quanto sonho
E eu, quixote de intenções tão desastrosas,
comungava vagas utopias, construía catedrais
de ideias generosas que desabavam mês a mês:
minhas certezas.

 

Mas para que saber alguma coisa desse mundo
no mar de dúvidas de inúteis astrolábios?
Para que Norte distante dos meus sonhos
me guiariam bússolas, sextantes, alfarrábios?
Quem fabricaria por mim, com precisão,
os meus enganos?

 

        Inútil como exorcizar as pedras
        o excogitar a vida
        se a gente tem apenas dezessete anos.

 

 

 

A idade da razão

 

A Jean-Paul Sartre

 

Oh, pássaro veloz da juventude ludíbrio dos sentidos

deixando à beira da estrada o túmulo das ânsias pretéritos coagulados.

 

Incognoscível apenas eu por mim mas o amanhã plausível criado à imagem e semelhança de minhas esperanças.

 

Ah, houve uma infância que disse:

—     Serei livre!

E houve um dia atrás em que pensei:

—     Serei grande!

Sentia em mim o borbulhar ingénuo

de tantas certezas inconcussas

e minha vida deslizava docemente...

—     Em direção a quê?

 

Naves de papel, folhas, vácuos, futuros,

parece que tudo escorre

para o bueiro em frente à mercearia.

 

 

 

 

Página ampliada e republicada em novembro de 2018



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