AMNERES SANTIAGO PEREIRA MAURÍCIO
Licenciada em Letras Clássicas e Vernáculo com bacharelado em Comunicação Social, ambos pela Universidade de Brasília (UnB).Poeta, jornalista e funcionária pública.
LIVROS PUBLICADOS: PEDRO PENSEIRO (novela; Thesaurus Editora, Brasília, 1980); HUMANÍSSIMA TRINDADE (poemas; Edição do Autor, Brasília, 1993); RUBI (poemas; Francisco Alves Editora, Rio de Janeiro, 1997); RAZÃO DO POEMA (poemas; Centro Cultural Banco do Brasil e Gráfica Takano, Brasília, 2000); ENTRE ELAS (poemas, Brasília, 2004. A autora publicou, também, em parceria com três poetas brasilienses, a coletânea EMQUATRO (poemas; Thesaurus Editora, Brasília, 1985).
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1ª. BIENAL DO B – A POESIA NA RUA. 26 a 28 de Setembro de 2012. Brasília: Açougue Cultural T-Bone, 2011. 154 p. ilus. col. 17x25 cm.
Você me faz
escrever mais,
obsessivamente,
como uma louca —
a louca das palavras.
Tantas, tontas, soltas,
ávidas, vertiginosas,
ela me vêm,
excessivas,
mais e mais e mais
dentro da noite voraz.
De
Amneres
Diário da poesia em combustão
Brasília: Athalaia Gráfica e Editora, 2010.
200 p. (Coleção Oi Poema, v. 6)
XXVII
Medo
Um grito rouco na tarde,
um uivo dentro da noite,
um frio seco na carne,
o giz de sangue do açoite,
a torpe face da morte
na rigidez do cadáver,
a solidão do covarde
roendo as cordas da sorte
e a dor de que não se escape
e o amor quando parte ou morre.
XXX
Ciclo
Alguma coisa me invade,
alguma coisa me acorda,
alguma coisa em mim arde,
alguma coisa em mim sopra
e a chama incendeia a carne
e o tempo trota no peito
e a vida faz amizade
com a morte e tudo é perfeito,
pois tudo finda e renasce
e é core e é recomeço.
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De
Amneres
razão do poema
Ilustrações de Lavinia Góes
Brasília?: Tatika, 2000
Livro numa caixa de papel kraft, com um calendário (2001) em folhas soltas numa caixa de CD e 4 cartões postais ilustrados, a exemplo do seguinte:
De
Amneres
Entre Elas
(Projecto Editorial, 2004)
Auto-retrato
Eu sempre andei assim
quase absorta
quase abstrata
quase perdida
Eu sempre entristeci
quase obscura
quase culpada
quase escondida
Eu sempre amei assim
quase obscena
quase extremada
quase exaurida
Eu sempre percebi
ser esquisita
quase obtusa
quase maldita
Eu sempre fui assim
quase uma atriz
sonhando ser o amor
e ser a amada
Eu sempre fui assim
quase exaltada
quase encantada
quase feliz.
Canção ao Sol
Acorda, amor, já é hora,
a aurora já levantou,
no campo, um galo tenor
compõe-lhe a trilha sonora.
Acorda, desperta, é o dia
tecendo as teias da história.
Serão de dor ou de glória
as horas que se anunciam?
Amor, onde te guiam os passos
quando se achega o perigo?
Cuidado, há cacos de vidro
misturados aos abraços.
A vida, amor, são opostos
harmônicos – rosa e espinho,
excesso entranhado ao ócio,
silêncio entre o burburinho.
Toma-me, amor, como um vinho
degustado ao crepúsculo
antes que o tempo, em seu curso,
nos atravesse o caminho.
Marco
Amor,
eu quero um espasmo
um sarro, um beijo, um orgasmo
um soro anti-solidão.
Amor,
eu quero uma mão
um gole, um brilho, um tempero,
vacina contra desespero.
Amor,
me acende o tesão
toca a língua em meu ouvido
sussurra que há salvação.
Amor,
me ancora em teus braços
habita em mim como um marco
um porto na escuridão.
Soneto
Antes que o tempo transborde
antes que a nascente estanque
antes que o desejo murche
e o outono se achegue. Antes
Que os olhos se embaracem
sob o impacto da velhice
(como se a alma dançasse
e o corpo só assistisse)
Antes que a luz esmoreça
antes que o dia anoiteça
toma-me, amor, uma vez mais
Antes, amor, que eu te esqueça
antes que a chama adormeça
como a espuma se desfaz.
Catedral
Uma asa
um ipê
uma ponte
o planalto:
vasto horizonte
Uma garça
uma orquídea
um bombeiro
o cerrado:
sopro vermelho
Uma praça
uma tribo
um pardal
os letreiros:
zona central
Uma puta
a polícia
um doleiro
a malícia:
setor hoteleiro
Um mendigo
uma infâmia
um menor
a insônia:
pátria do pó
Um protesto
um político
um turista
esplanada:
golpe de vista
A alvorada
tinge a catedral,
mãos em prece
sobre a Capital
Comovido o olhar
singra o leste,
onde um rúbido sol
resplandece
e o Congresso
quase alcança o céu,
duas conchas
entre arranha-céus
Dois candangos,
planalto central
e um relâmpago
e uma dor sideral.
Tanatos
Corpo mutilado
carne seca
esqueleto
ossos estéreis
boquiabertos
onde tua alma
árida caveira
onde o recheio
de uma vida inteira?
Resto de homem
destinado ao pó
não te reconheço
embora roas
minhas idéias
reflitas
meu cansaço
espelhes
meu estupor
embora quebres
embora doas
embora estales
quando te envergo
nos rituais do amor.
Ainda menina
vi teus contornos
em úmidos
laboratórios
escolares
na morte anunciada
do meu avô
e no entanto
só te encarei
muito mais tarde
no rosto inerte
de um meu irmão
naquela tarde.
Hoje, assisto-te
como a um filme
de terror
em cenas de guerra
em olhos de fome
na ferocidade
do bicho homem
caveira já te sonho
caveira já te sou
em certas noites
insones.
Espio-te
nas entrelinhas
de minha face
penetro teu vulto
tua intimidade
reconheço-te
no que em mim
é pó
no que em mim
é carne
e até te cuido
e até te agrado
buscando-te o vigor
para que não quebres
antes do tempo
e que me abrigues
quando se achegue
a idade.
Hoje, livro-te do perigo
com o comedimento
da maturidade
até que venha a morte
e minha alma leve
de ti se aparte
e enfim, então,
já nos veremos
face a face
de um lado
meu espírito pleno
de outro
tua débil
durabilidade.
Assistirei às despedidas
dos meus irmãos
e ao teu enterro
ainda grudada
à minha carne
e te direi adeus
e subirei aos céus
pois que te conheço:
corpo mutilado
carne seca
esqueleto.
Poemas do livro Entre Elas ( 2004, Projecto Editorial)
GRUPO OIPOEMA na Pré-Bienal Internacional de Poesia, Brasília 14 e 15 de outubro de 2010
No alto: Angélica Torres Lima, Bic Prado, Nicolas Behr. Sentados: Cristiane Sobral, Luís Turiba, Amneres.
TEXT IN ENGLISH
Extraído de
NEW BRAZILIAN POEMS. A bilingual anthology after Elizabeth Bishop. Translated & edited by Abhay K.. Preface by J. Sadlíer. Rio de Janeiro: Ibis Libris, 2019. 128 p. 16 x 23 cm. ISBN 978-85-7823-326-6
Includes 60 poets in Portuguese and English.
Aboutfaith
Let it be,
the wound will heal
the chest will resist
and the sun will still shine
and then I will build
the bridge to cross
to the other side and follow
the fortune of loving more
as long as life exists.
Sobre fé
Let it be,
a ferida há de estancar,
o peito há de resistir
e o sol ainda há de brilhar
e então hei de construir
a ponte onde atravessar
ao outro lado e seguir
a sina de mais amar
tanto mais vida existir.
Página ampliada em novembro de 2020 |