MANOEL CABOCLO
Manoel Caboclo e Silva nasceu no dia 2 de janeiro de 1926, em Juazeiro do Norte, Ceará, filho de João Caboclo da Silva e Rita Zeferina de Athayde. Sua aproximação com os folhetos deu-se no ano de 1938, quando o mesmo foi convidado por José Bernardo da Silva para trabalhar como aprendiz na Tipografia São Francisco. Dedicado ao trabalho, Manoel Caboclo foi gradativamente aprendendo o ofício, trabalhando inclusive no processo de produção dos folhetos da tipografia.
No final da década de 40, Manoel Caboclo deixa a Tipografia São Francisco, indo trabalhar com João Ferreira de Lima, astrólogo, poeta e editor do Almanaque de Pernambuco, que era impresso na Tipografia São Francisco.
(...)
Seus poemas versam sobre os mais variados detalhes do cotidiano vivenciados pela sociedade contemporânea, tais como violência, romances, lutas e histórias de amor, mas foi a vertente religiosa, centrada na figura de Pe. Cícero, a maior parte de sua produção poética.
Fragmento de biografia extraído de
https://memoriasdapoesiapopular.com.br/
MORICONI, Ítalo. Os Cem melhores poemas brasileiros do século. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001. 350 p.
Ex. bibl. Antonio Miranda
O HOMEM QUE DEU À LUZ
A UM MENINO
O poeta é um repórter
De pensamento ligado
Ouvindo o que o povo diz
Fazendo todo apanhado
E sai contando na rua
Tudo quanto foi passado
Se viu na televisão
Contando toda verdade
Que um cientista disse
Que há possibilidade
De um homem ter um filho
Havendo oportunidade.
Agora chegou o tempo
Das coisas tudo mudar
O homem ficar em casa
E a mulher vai trabalhar
Não querendo ter mais filhos
Mandando a trompa ligar
Com esse aperto de vida
Aumenta o peso da cruz
A fome avança no lar
O dinheiro se reduz
Apareceu este meio
Para o homem dar à luz
Começou por Zé Totonho
Maria da Conceição.
A mulher disse para ele:
Vou fazer a ligação
Eu não quero mais ter filhos.
Totonho disse: isto não
Ele disse Mariquinha
Isto você não arranja
Porque deixa a mulher fria
Igual a um pinto de granja
A mulher disse eu vou
Nem que o diabo "franja"
Tem quase setenta anos
Fez agora a ligação
Para não perder os planos
E eu vou fazer também
Para não haver desenganos
Seguiu dali foi ao médico
E fez logo a ligação
Para nunca mais ter filhos.
Totonho disse então:
Saiba que vou embora
E arrumou o matulão
Daquele dia em diante
Totonho se ausentou
E não dormiu mais em casa
Num cabaré de arranchou
Quando menos esperava
Totonho engravidou
Nisto ele conheceu
Que a mulher tinha razão,
Vendo o bucho crescer
Totonho passava a mão
O menino dava pulos
Parecia um tubarão
Segurado numa corda
Totonho em agonia
Se contorcendo de dores
O menino estremecia
E a negrada dizendo:
Zé Totonho vai dá cria?
Chamaram dona Maria
Para pegar a criança
A parteira experiente
Disse logo sem tardança
Pra este menino nascer
Preciso cortar a pança
Mandaram chamar um médico
Que era a única esperança
Quando o médico chegou
De Totonho cortou a pança
No dia 4 de agosto
Nasceu a dita criança
Deu-se um grande rebuliço
Quando o menino nasceu
Às doze horas da noite
Um terremoto se deu
Pro lado do estrangeiro
Que muita gente morreu
Os galos se espantaram
Numa zoada tremenda
Os cachorro alarmaram
Numa enorme contenda
Todo povo admirado
De ver aquela legenda
Nisto o menino falou
Para o povo que assistia
Dizendo meu pai agora
Me leva à água da pia
Porque este mundo velho
Está chegando o último dia
Desde o ano de oitenta
Quando começou o jogo
As coisas mudaram muito
O mundo vai pegar fogo
Já marcado por Deus
Não adianta mais rogo
Logo o menino calou-se
O pai ficou conformado
Dizendo isto acontece
A quem está desempregado
Mas minha mulher trabalha
Vai criá-lo com cuidado
Mariquinha disse: Totonho
A preguiça é um horror
Quando se perde o emprego
Procura outro qualquer for
Pois nunca falta serviço
Pro homem trabalhador
O Totonho lhe respondeu:
O trabalho é muito ruim
Abandonei a enxada
Pode ela levar fim
Quando eu puxava por ela
Ela puxava por mim
É melhor se ter um filho
E durante seu resguardo
Beber caldo de urubu
Comer cururu torrado
Ou ser um guia de cego
De que ir para o roçado
A mulher disse Totonho
Esse ato é muito baixo
Eu não sou bananeira
Pra criar filho de macho
Vou chamar Zé caçador
Para derribar-lhe o caixo
Página publicada em novembro de 2020
|