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LÊDA MARIA
LÊDA MARIA FEITOSA SOUTO nasceu em Fortaleza, Ceará. Formada em Pedagogia e Jornalismo. Atualmente, jornalista do Diário do Nordeste.
Textos extraídos de
REVISTA DE LETRAS. Volume 15, no. 1/8, jan. 1990 / dez. 1993:
Quero
escrever um romance de cordel,
ter parentesco
com o cruzeiro do sul,
e
desfazer manipulações e lógicas.
Quero
alcançar aquele farol luminoso
que vai garantir meu vòo noturno
por entre nuvens e florações.
E o meu corpo
corre léguas
procurando o alcançar.
Cruzo riachos,
espinho-me no agreste,
banho-me na chuva do caju,
escondo-me na capoeira e adormeço.
Ao amanhecer,
fitarei o azul infinito do céu
e a estrela damianhã
me entregará você
com gosto de fruta da estação.
Ele
chegara sem nenhuma imposição
Vestia-se de bege e panos crus,
para esconder
sua doce selvageria.
O humor passava ao lado
e palavras com estampas florais
ocupavam seus lábios,
todas as madrugadas.
Suas mãos escorregadias
produziam minhas emoções
e toda a magia do seu canto
atingia o canto dos pássaros,
misturando-se
ao tricô compassado dos meus desejos.
O saldo devedor
de tua ausência
tem que ser corrigido
pelo índice
dos desejos do meu corpo,
muitas noites
banhado em lágrimas
ou envolvido
em surrados lençóis de solteiro.
No caminho em minha volta
esqueci lembranças
dupliquei memórias
não tenho mais
aquele olhar sem traços
nem vestes consumidas
despi-me,
olhei em redor
quis conhecer o deserto
e habituei-me às buscas
do meu olhar desvendado
um corpo sensível
que hoje vibra
para ser processo, pouso,
caminhada, encontro,
eternidade.
Ele foi o único
a combinar sem exigências
a cor da palha em ton-sur-ton
desse despertar sensorial
com os relatos do meu corpo.
De combinar nosso pudor,
com a dança de bailarinos indisciplinados.
De projetar grandes aventuras
na mesma tonalidade do nascer e pôr-de-sol.
Foi o único
a criar propostas sábias,
energizar respostas,
caminhar descalço
e aceitar o inverno
nas sobreposições de nossas roupas,
jogadas sempre na areia morna
de cada amanhecer.
Acertei contigo
um salário de afeto,
a inflação corrompeu a calma
mas
acertamos no desviar dos caminhos
o patamar dos cálculos,
criando uma receita amorosa,
que rende até hoje
e renderá sempre
três novos e valiosos dividendos.
A inflação
começa a demolir
o poder aquisitivo do povo.
Pior que isso
é teu silêncio demolindo
corpo, mente e coração
todos os dias, em todas as moedas.
Plano de seguro
internacional,
será que ele pode atingir
a longa viagem
das nossas estações de felicidade?
Austeridade fiscal e monetária,
um fato ameno
diante da austeridade de tuas palavras
economizando verbos e provérbios.
Política de valorização da moeda.
Sou muito mais
a política de estabilidade
dos teus braços.
Descompasso do passo-a-passo
beirando a devassa e o devaneio.
Diabo figurado de domácias coloridas,
anjo traidor, doutrinado,
sem tocar flautas e louvar as estrelas.
Passo apressado
apressados passamos entre mistérios.
Quem sabe na alvorada
tenhamos calma para fotografar
os pés mergulhados
nas águas cristalinas
do mar de Jericoacoara.
Página publicada em julho de 2020
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