EDUARDO PRAGMÁCIO FILHO
Eduardo Pragmácio de Lavor Telles Filho é poeta e advogado cearense.
Poesia voltada para temas universais, grandiosos, existenciais, com forte expressão imagética, e que se utiliza do discurso metaliterário para fazer da poesia uma segunda pele, um mistério, um tormento que o poeta , romanticamente, procura domar (...) RODRIGO MARQUES
Poemas extraídos da obra
OBLÍVIO DA ILUSÃO.
Fortaleza: Edições Poetaria;
Editora Imprece, 2007.
INVASÃO
Essas imagens perdidas na noite
antes me despertavam encanto,
agora me trazem tormento.
E quando me tocam,
a rosa arranca o espinho,
a taça rejeita o vinho
e o tempo se cobre,
rapidamente,
com um lençol branco de linho.
A imagem
escorrega até a ponta
dos meus dedos,
no íntimo da palavra,
invade o papel.
SONHOS E VERMELHOS
O outro lado da janela esconde
sonhos e vermelhos,
protegidos por paredes brancas
a sustentar o teto mais que perfeito.
O vidro separa o olho
do beijo,
quando a moldura escura envolve
o jeito invisível de pensar.
O verso empalhado
revela o único desejo:
é o início do beijo,
sem boca, sem língua,
do abraço sem braços,
da lágrima sem choro.
o outro lado da janela esconde
sonhos e vermelhos,
verbos sem conjugação, palavras sem sentido,
às vezes substantivos,
como se fossem em vão.
TEMPO
O meu tempo é tempo demais para mim.
Escrevo cartas, poemas, recados.
Às vezes acho que não tenho fim.
DISFARCES
A busca
incessante
dessa perfeição
mutante
nada mais
importa.
A porta é sempre
(entre)aberta
e quase atinge
o céu
para aqueles que
(ar)riscam
o papel.
A angústia,
filha primogênita
da dúvida,
é um dos disfarces
da busca.
POSSIBILIDADES
Um cardápio de sonhos
aberto sobre a mesa
redonda e invisível,
onde o alimento é palavra,
possível chão ou precipício.
A escolha é dolorosa
e dela parte uma distância insalubre.
É como flutuar
sobre um mar de medos
e espera da queda.
É onde os pés afundam,
nas dunas
— que se movem na palidez
dos ventos.
GERERAÚ
I
Doeu-me
quando arrancaram
os farpados e os arames.
Doeu-me
quando impuseram
um muro de medo e de pedras.
II
Das carnaúbas ficaram
as espadas de seus talos
e a glória imaginada
de batalhas vencidas.
As carnaúbas guiavam,
na aridez do solo,
a fertilidade involuntária
das tardes de sábado.
As carnaúbas
não sucumbem às parabólicas.
III
Uns carrapichos
agarravam-se nas pernas,
experimentando a urbanidade.
Outros carrapichos
defendiam-se,
evitando a invasão,
inevitável,
da modernidade.
IV
A casa
já não é mais velha
nem nova.
A casa
se equilibra sobre
os alicerces de tijolos
e contrastes.
A casa
guarda um mofo
requintado
e a escrita poderosa dos tempos
(e agora um número na rua).
V
Nas estradas do Gereraú,
os rastros de uma época,
que não se apagam assim com esse asfalto.
Página publicada em outubro de 2007.
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