CÂNDIDO ROLIM
José George Cândido Rolim nasceu em Várzea Alegre, CE. Morou em Belo Horizonte, Rio de Janeiro e Porto Alegre. Atualmente exerce a advocacia em Fortaleza. Tem publicados os livros Rios de Mim (Fortaleza: Secretaria de Cultura do Estado do Ceará, 1982); Arauto (Sabará: Edições Dubolso, 1988); Exemplos Alados (Fortaleza: Letra & Música, 1997), Pedra Habitada (Porto Alegre: AGE, 2002) e Camisa Qual (Porto Alegre: Editora Éblis, 2008).
De
CAMISA QUAL
Porto Alegre: Editora Éblis, 2008
decorrência
a um que à mínima
alteração do quadro
grita:
não disse? um outro mecanismo
atua
— demonstro o esforço
de não dar sequer
o primeiro
passo
mínima adjacência
dê vez ao próximo da fila ou
facilite o troco
exame mais demorado
— luz direta
na cara —
contraria a reputação
a custo construída
riso aceno sotaque
tudo falsa
aproximação
se não corresponde
tegumento e
tez
cabeça a óleo
atado a graúdos
adestramentos líricos
jamais neguei ao murro
sua drástica
preponderância
nunca pronto para
uma vontade nado
a grandes braçadas
contra o que se tem
seguro e certo
conto sempre na
iminência
imprestável à
atribuição
ele me aponta uma jóia
poeta de uníssona beleza
não vá você querer
que eu tenha
idêntico impacto
nem tudo parece ser
merecedor de afinco
(entendo o preito àqueloutro
o da predileção: faz
um uso novo da metáfora)
mas não vejo assim
motivo para deitar os pés
elogio à
altura do homenageado
há tanto par ver no visto
que desconfio já
ser passado este indício
de rareza
tente ser contra
o homem e sua tripa
laudatória
cupinagem
cupinchas a
ampará-lo em caso
de resvalo
se vigiam se punem
sempre sob a
lei que lhes faz
sombra
mérito maior é nada
precisar ditar ou
repetir
sermão para distribuição anárquica
não importa seja
este um espaço não
compartilhado do pensamento ou
isso pareça uma atitude nada humana
ou importa
se todas as combinações
estão sendo rastreadas e
meu silêncio dado como suspeito
faço questão de articular
cada vez mais essa matéria
impenetrável de pouco
nenhum valor
calórico
ROLIM, Cândido. Arauto. Sabará, MG: Edições Dubolso, 1988. s.p. 10,5x19 cm. Programação visual: Sebastião Nunes. Ilustração da capa: ”O anjo cangaceiro”, de Zé do Carmo (Goiana, Pernambuco). Miolo em papel craft. Col. A.M. (EA)
O CORAÇÃO DE MUITOS
um cálice do verbo
erguido à força de tempos
inclino à terra
neste peito
a morte busca arrancar
a dentes
solidões que se coiceiam
ondas mordidas por ondas
palavras que sangram
estreitas em malte e nicotina
mais que este coração
que não sabe querer
espero que a Raça
dê-lhes um túmulo mais propício
INDÍCIOS
nunca mastiguei tanto presságio
nem teu sexo ergueu tão alto
a hóstia viva
que trago nas virilhas
teu ventre nunca anunciou tão tarde
outra colheita
como agora
sombra vestígio de sombra
sangrentos estilhaços de hora
POESIA SEMPRE. Revista semestral de poesia. Ano 10. Número 17. Dezembro 2002. Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional, Ministério da Cultura, Departamento Nacional do Livro, 2002. 260 p. ilus. col. Editor geral Marco Lucchesi. ISSN 0104-0626 Ex. bibl. Antonio Miranda
PEDRA HABITADA
I
Pedra
sobre luz de pedra
no ar
a chama crava suas raízes
II
Nervo percutido
eco opaco de
osso
vibração
víscera estendida
ao máximo
III
Do meio dia
a pedra é um salmo
as coisas
a sombra das coisas
IV
Do ar vazio
a mão
metáfora simétrica
arranca signos
com relevo
Página publicada em junho de 2008. Ampliada em agosto de 2018 |