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 Fonte: diariodonordeste.globo.com/     BARROS PINHO     José Maria de Barros Pinho (Teresina, 25 de maio de 1939)  é político, poeta e contista. Foi vereador em Fortaleza pelo MDB (1979-1982),  deputado estadual pelo PMDB (1983-1990) e Prefeito de Fortaleza (1985-1986).    Enquanto poeta, destacam-se as obras Natal de barro lunar e quatro figuras no céu (1960), Planisfério (1969), Circo Encantado (1975), Natal  do castelo azul (1984 ) e Carta do Pássaro (2004).“A Viúva do Vestido  Verde”, publicado pela Record, foi cotado para o prêmio Jabuti de Literatura.  “Carta do Pássaro”, reconstitui sua infância no engenho de seu avô, às margens  do rio Parnaíba, no Piauí. Membro da Academia Cearense de Letras.     O poema escolhido saiu publicado em LITERATURA – Revista do Escritor Brasileiro, n. 31, de 2006,  editada pelo nosso colaborador e amigo Nilto Maciel.      CARTA DE OUTONO    escrevo para ti que não conheço  no segredo que fere o úmido do  orvalho  na linha azul onde o tempo escreve  a avidez  no papel de nuvem a nuvem mais  branca do céu  o céu de ninguém na existência  profética dos rios  a descer sobre õ vale na terra  morena de teu corpo nu  na semântica do vento na palavra  de augúrio da cigana  envolta no feitiço na sedução do  fruto maduro  em tua boca a flor salgada a  saltar do mar  no relâmpago uma pupila de seda de  teus olhos grandes  se espreita a sombra no último  gosto da espera  uma lembrança de sol arde no  perfume de tua pele  e pássaros tocam flauta de palha  no teu ventre de fogo  a aurora acorda na reticência de  rosas no púbis das estrelas  o teu olhar abre a tarde para o  anúncio próximo da noite  a colina ofegante de teu corpo  afaga a chuva fina em teus cabelos  enquanto a vida planta eternidade  no luar de tua vagina  viajor de sonho contemplo teus pés  pisando pedras no riacho raso  onde borboletas se extinguem  enterneci das na volúpia  das abelhas postas em teus seios  entumecidos de distância  na homilia das águas celebrando  desejos o desejo  interminável das insônias onde as  madrugadas se extraviam               REVISTA  DE LETRAS. Volume 15  No. 1/8 jan. 1990. Dez. 1993. Nímero  comemorativo dos 25 anos de fundação do Grupo SIN.  Fortaleza: Departamento de Letras UFC.                  
                        
                                   ODE AO AMOR DO MAR
 gosto do mar
 pelo  absurdo
 sensual
 de  suas sereias
 pelo  encrespar
 do  vento
 no  ventre
 de  peixes
 abomináveis
 
 pelo lésbico
 despudor
 das  ondas
 violentando
 as  águas
 
 gosto  do mar
 absorvendo
 sol
 na  máscara
 de  bronze
 dos  pescadores
 
 gosto  do mar
 mistério  azul
 das  mulheres-marinhas
 visivelmente  estranguladas
 
 gosto do mar
 concupiscente
 e  paradoxal
 em  seus horrores.
 
             DOMINGO
 hoje é domingo
 o  bom deia da tristeza
 o céu é menos azul
 a  cidade uma criança
 pelos  cantos sem brinquedos
               CANTO DO GALO DE  BARRO                os místicoseram
 tão  solenes
 que  esperavam
 o  galo da matriz
                 cantar
 madrugada
 adentro
 ouvindo
 esse  coro-co-có
 
 e  nunca
 descobriram
 que  o galo
 era  de barro
 
 
         BALADA  SIMPLES DA JANELA DE MARIA           a janelaé  o mundo
 na  aldeia
           o sonhocorre
 nos  olhos
 da  donzela
 
 o  amor
 tem  as sílabas
 da  solidão
 
 a janela
 no  seu edifício
 de  tristeza
 é  o lugar
 onde  maria
 de  tanto esperar
 espera  o pôr-do-sol
 
           Página ampliada em julho de 2020   
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