ANTONIO THOMAZ
Nasceu na cidade de Acaraú a 14 de setembro de 1868, vigário na sua cidade natal, Estado de Ceará.
TEXTO EN ESPAÑOL -TEXTO EM ITALIANO – TEXTE EN FRANÇAIS
FREIRE, Laudelino. Pequena edição dos Sonetos brasileiros. 122 sonetos e retratos. 2ª. edição augmentada. Rio de Janeiro: F. Briguet e Cia. Editores, 1929. 256 p. 12,5x16 cm. capa dura Impresso na França por Tours Imp. R. et P. Deslis.
CONTRASTE
Quando partimos, no vigor dos annos,
Da vida pela estrada florescente,
As Esperanças vão comnosco á frente
E vão ficando atraz os Desenganos.
Rindo e cantando, céleres e ufanos,
Vamos marchando descuidosamente...
Eis que chega a velhice de repente,
Desfazendo illusões, matando enganos.
Então nós enxergamos claramente,
Quanto a existência é rápida e fallaz
E vemos que succede exactamente
O contrario dos tempos de rapaz :
— Os Desenganos vão comnosco á frente
E as Esperanças vão ficando atraz!
RAMOS, Dinorá Tomas. Padre Antonio Tomás - Príncipe dos poetas cearenses. 3 ed. Fortaleza: Jornal "A Fortaleza", 1981. 176 p. 15,5x21,5 cm. “ Padre Antonio Tomás “ Ex. bibl. Antonio Miranda
VIÇOSA
Nos alcantis da Ibiapaba erguida,
Lá se ostenta risonha entre a verdura
Dos seus vergéis regados de água pura
Da fria pedra aos borbotões nascida.
Ali, sobre um outeiro construída
Na viva rocha, há séculos perdura
A sua igreja — berço de cultura
De uma raça valente hoje esquecida. ..
Quando a gente, volvendo na memória
Desse templo lendário a antiga história,
Os umbrais lhe transpõe a vez primeira.
Julga estar vendo, a percorrer-lhe a nave
A passos lentos, silenciosa e grave,
A sombra augusta do imortal Vieira.
FUNERAL
Vão-na levando para a sepultura,
Amortalhada em brancos véus de linho,
Dentro de um leve esquife cor de arminho,
Ao fulgor da manhã serena e pura.
Carpindo-a segue o vento e, porventura,
Para incensá-la agita, de mansinho,
Ramos em flor, pendentes do caminho
Cheios de sombras e orlas de verdura.
No entanto o louro enxame das abelhas
Vai atirando pétalas vermelhas
Sobre o caixão franzino que a comporta.
Cai das folhas o orvalho como pranto,
E as meigas aves em piedoso canto
Rezam contritas sufragando a morta.
NO CAMPO
(Solilóquio)
Dá-me o sol sua luz e o seu calor me aquece;
Dá-me a terra morada; o rio, a linfa pura;
As árvores, além do abrigo de frescura,
Doces frutos me dão, em farta e longa messe.
Dão-me as vacas leite, e, quando me apetece,
Dão-me a carne também; a ovelha, a vestidura;
As abelhas me dão seus favos de doçura...
Sem que disso lhes venha o mínimo interesse.
Dão-me as flores perfume; e ósculos no rosto
As brandas virações; as aves, seu trinado;
E os homens só me dão trabalhos e desgosto...
Assim falava eu... E um homem que, escondido,
Ouvira o meu discurso, olhou-me admirado,
E perguntou-me a rir, se eu tinha endoidecido.
MEDO DE PALMATÓRIA
Brincam na escola do Armando,
Num reboliço tremendo,
Os dois filhos do Rosendo
A palmatória brandindo.
A castigar o Facundo,
Quando o mais novo, — o Clarindo
De um salto a porta transpondo,
Abriu a boca no mundo...
APAIXONADO
O Fernando da Gonçala
É doido pela Marcela
Mas quando a vê na janela,
Fica mudo, perde e fala...
Com o pensamento a segui-la,
Vai alta noite o pachola
(Quando acha uma escapula)
Rondar-lhe a casa da vila,
E, ao terno som da viola,
Cantar aí uma chula...
EFEITO DO VINHO
Todas as vezes que eu janto,
Em casa do Nascimento,
É pesado e sonolento
Que da mesa me levanto...
E só me queixo do "tinto"
Que ele me serve tão pronto
Para regar o presunto,
Pois, se o bebo, logo sinto
Ir-me à cabeça, e, de tonto,
Não sei mais do meu bestunto...
DOUTOR ARROGANTE
Voltou do Rio; formado,
O Juvencio do Tancredo,
Que — diz-se muito em segredo,
É tolo e mal preparado...
Com seu gênio desabrido
Desagrada o povo todo.
Seu pai, um velho sisudo,
Exclama, compadecido:
— "O meu doutor, pelo modo,
Veio mais besta do estudo"...
BEM FEITO
Embriagou-se o Vilaça
Na barraquinha do Lessa,
E, de atrevido, não cessa
De invetivar a quem passa...
O bodegueiro o atiça
E o cabra mais se alvoroça;
Eis no balcão se debruça,
E diz: — "Eu quero as alviça",
Senão derrubo esta joça,
E gente apanha na fuça"...
HARMONIA CONJUGAL
Com a Joana se atraca,
Para dar-lhe uma sapeca,
O seu marido — o Maneca, —
Ela do coz puxa a faca,
E ele a tremer todo fica,
E, em brados, a filha espoca:
— Mamãe, você está maluca?!
Mas a Joana replica:
— Menina, cala esta boca,
Deixa de asneiras, Biluca. —
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A MORTE DO JANGADEIRO
Ao sopro do terral abrindo a vela,
Na esteira azul das águas arrastada,
Segue veloz a intrépida jangada
Entre os uivos do mar que se encapela.
Prudente, o jangadeiro se acautela
Contra os mil acidentes da jornada;
Fazem-lhe, entanto, guerra encarniçada
O vento, a chuva, os raios, a procela.
Súbito, um raio o prostra e, furioso,
Da jangada o despeja n´água escura;
E, em brancos véus de espuma, o desditoso.
Envolve e traga a onda intumescida,
Dando-lhe, assim, mortalha e sepultura
O mesmo mar que o pão lhe dera em vida.
O PALHAÇO
Ontem, viu-se-lhe em casa a esposa morta
E a filhinha mais nova, tão doente!
Hoje, o empresário vai bater-lhe à porta,
Que a plateia o reclama, impaciente.
Ao palco, em breve surge... pouco importa
o seu pesar àquela estranha gente...
E ao som das ovações que os ares corta,
trejeita, canta e ri, nervosamente.
Aos aplausos da turba, ele trabalha
para esconder no manto em que se embuça
a cruciante angústia que o retalha.
No entanto, a dor cruel mais se lhe aguça
e enquanto o lábio trêmulo gargalha,
dentro do peito o coração soluça.
VOLTANDO A CASA
Passei um mês, um mês inteiro, fora
Do meu lar, sem ouvir meus passarinhos,
Sem ver o louro bando de amiguinhos
Que aí deixei! Cruel, longa demora!
Mas, afinal, eis-me de volta agora,
E na ânsia de ver os coitadinhos,
Que suspiram talvez por meus carinhos,
Fustigo o meu corcel, que o chão devora.
Avisto a casa além, dobro a tortura
Que dela me separa... Oh! que ventura
Eu sinto na alma ao ir-me aproximando!
Chego ao portal, puxo o ferrolho e entro,
E me recebem pela sala a dentro
Crianças rindo e pássaros cantando.
REZENDE, Edgar. O Brasil que os poetas cantam. 2ª ed. revista e comentada. Rio de Janeiro: Livraria Freitas Bastos, 1958. 460 p. 15 x 23 cm. Capa dura. Ex. bibl. Antonio Miranda
/No livro aparece como
ANTÓNIO TOMÁS
CAMPESINA
Uns aromas sutis na veiga espalha
A mansa brisa. Suga a loira abelha
O lindo cálix de uma flor vermelha
Que o puro rócio matutino orvalha.
O vento sul do bosque a cima esgalha
E o frio lago azul a sombra espelha;
Triste e saudosa muge a branca ovelha
Cujo cincerro finos sons chocalha.
Loira matuta vem buscando a trilha
Da fonte — um fio d'água que marulha, T
razendo aos curvos ombros grande bilha.
Em pleno viço a mata escura abrolha.
Se o vento ali perpassa em doce bulha,
Treme um pingo de luz em cada folha.
TEXTO EN ITALIANO
Imagem: www.artemery.net
Extraído de
MIRAGLIA, Tolentino. Piccola Antologia poetica brasiliana. Versioni. São Paulo: Livraria Nobel, 1955. 164 p. Ex. bibl. Antonio Miranda
CONTRASTO
Quando si parte, nel verdor degli anni,
E s'inizia il cammino delia vita,
A noi dinanzi, la speranza invita,
E ci restano indietro i disinganni.
Allegri, soddisfatti, senz'affanni,
Si prosegue la splendida salita.
Ma ecco le vecchiaia, inavvertita,
Che uccide le illusioni, coi malanni.
E allora ci accorgiamo, chiaramente,
Che l'esistenza è rápida dimora.
E succede l'opposto, esattamente,
Delle ore giovanili, ormai lontane :
Il disinganno ci precede ognora
E la speranza indietro ci rimane.
TEXTE EN FRANÇAIS
FRÓES, Heitor P. Meus poemas dos Outros. Traduções e versões. Bahia, 1952. 312 p. Ex. bibl. Antonio Miranda
CONTRASTE
Quand nous partons, dans la vigneur de l´âge,
Par des sentires charmants e radoucis,
Nous trouvons les espoisres sur le passage...
Nous laissons em arrière les sourcis!
Riant, chantant, peut-être pas très sages,
Nous progressons superbes, éclaircis...
Mais voilà l´âge mur et ses présages
E tout espoir que sombre sans merci!
Nous comprenons, tout em nous émouvant,
Combien l avie est brève et mensongère...
Et qu´alors il se passe, bien souvent,
Du temps de la jeunesse le contraire:
Nous portons nos soucis — tous en avant;
Nous portons nos espoirs — tous en arrière!
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http://www.antoniomiranda.com.br/poesia_brasis/ceara/ceara.html
Página ampliada e republicada em junho de 2022
Página publicada em abril de 2014
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