MARIANO COSTA REGO – O.S.B.
BREVE ROMANCEIRO DO NATAL no ano de mil novecentos e setenta e dois nascimento de Nosso Senhor Jesu3 Cristo. Salvador: Editora Beneditina Ltda, 1972. ilus. s.p Ex. bibl. Antonio Miranda
NATAL DOS MOCAMBOS
Ao amigo e irmão D. Hélder Câmara
As chuvas trouxeram as águas
por entre as fendas das palhas:
Úmidas réstias de todas as dores
de todas as mágoas
de todos os natais
passados em abandono e solidão.
Nem mesmo diante do grito das coisas
na face molhada das palhas
Os homens percebem
que há fome
nus e dor
Que também há Natal
para os que não têm sequer
um presépio
para o filho que vai nascer
amanhã.
E quantos são pobres por dentro
Pobres do amor que não lhes damos
do respeito que lhes negamos
do mistério da vida
palpitante e escondida
que eles jogam para trás
como cabelos.
Eles são pobres
Porque nós vendamos os seus olhos
E só deixamos passar
o humor das lágrimas
e dos desejos de ver.
Também eles têm Natal.
Natal sem velas e sem presentes
mas Natal.
Sem neve de mentira
mas Natal.
Sem bolas de cores douradas
mas Natal.
Sem repique
repique de sinos
mas Natal.
Natal sem gosto de Natal.
É tão frágil o cendal
Que venda os seus olhos
E é tão forte a luz
Que vem do Natal.
Seus desejos e lágrimas
— tão puros e transparentes —
Tocam o mistério das coisas
A presença latente nas formas e nas cores
Desnudada à luz
Que vem do Natal.
Poesia mística – religiosa - Natal
Página publicada em setembro de 2019
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