Fonte da foto: http://jivmcavaleirodefogo.blogspot.com/
KÁTIA BORGES
Nasceu em 1968, em Salvador, Bahia, Jornalista, mestre em Teoria e Crítica da Literatura e da Cultura pela Universidade Federal da Bahia, trabalha no jornal A Tarde, na Bahia. Publicou o livro De volta à caixa de abelhas (2002).
A LUA E A NOITE
Fuga. É só no que penso.
Um ponto, pêndulo,
no qual se dependura a vida toda.
Ainda criança, lendo Poe.
As letras escorrendo, veias adentro.
Caminhos de estranheza veias adentro.
A vida toda lendo,
dependurada em um pêndulo.
A vida toda trancada fora, por dentro.
NOSSA SENHORA DOS ESQUISITOS
Para a Senhora, minha santa,
é que rezo todo dia,
acendo velas, faço romarias,
Nossa Senhora dos Esquisitos.
Clareai meus passos na terra,
desarmai o arco e flecha
nas mãos de meus inimigos.
Amparai, ó estranha santa,
aqueles que são benquistos
na legião que te segue,
onde os caminhos se perdem
ou desembocam no abismo.
PAZ
Invento a paz: panos brancos nas janelas.
Os burgueses da pensão estranham – canto.
Eu, que nunca cantei.
Atendo no balcão os mortos todos,
procurando achados e perdidos.
E vivo. Eu,
que nunca ousei.
O luto, que cobriu de negro
este quarto, hoje é passado.
Enterrado no quintal dos fundos.
Que as crianças entrem e desarrumem tudo,
rasgando em algazarra meus retratos.
AO SOL
Sair ao sol,
encarar o dia,
sem medo das sombras
que insistem.
Sim, sair de dentro
e ver a rua e o mundo,
com ruídos, entre dentes,
buzinas, rangidos, vômitos,
sob a luz que escorre
na cidade quente.
No meio fio,
sentar e apreciar a paisagem,
com seu tanto de Guernica, de guerra civil
mascarada por rostos
sorridentes.
Sair ao sol,
enquanto chove
intermitantemente.
Página publicada em dezembro de 2009
|