HUMBERTO FIALHO GUEDES
Livro de Celina
Ilustrações: Calasans Neto (especiais para o livro).
Salvador: Edições Macunaima, 1985
96 p. ilus. 27 x 20,5 cm. Tiragem: 2000 exs.
Realizado com a ajuda de Celina, a viúva do autor.
Projeto editorial de Myriam Fraga.
Assessoramento editorial de Carlos Cunha.
N.° CINCO
Deita o corpo, amada, em abandono
como quem parte — como quem morre
oferta o lábio, descobre a face, desnuda
o seio — e com a erva
do teu ventre tece o meu retorno.
Deita o corpo, amada, em abandono
e descansa a mão que passa
— permiti o gesto livre, o meu repouso
e por um instante estanca o jorro
deste amor que me sangra e em que me morro
por tanto sangue derramado, e tanto gozo.
Lisboa, 1969.
N.° SEIS
Que em mim não sei, amada, quanto
me dói de ver-te não ver-te mas saber-te
ainda que distante tão perto tão presente.
e por não ter-te mais saber-te conhecer-te.
Amada-amante que não tenho por distante
ausente que em mim não chore e mais não cante.
Ante o seio quente o peito arfante
o ente sente amante que não mente;
simplesmente, sofre a dor presente do que teve antes.
E se em ante e ente canto-te somente
é pra matar em mim este terror cortante
este temor fremente — canto cantante
de amar-te e ter-te e tão constantemente
ou vir a perder-te por não ter-te simplesmente.
Lisboa, 1969.
SONETO
Aqui, amada, faço do teu corpo o meu
repouso; pouso meu lábio — e ouso
e uso e só sobre o teu seio me debruço:
Pálpebras ligeiras velam por meu sono.
Aqui existo. Aqui, exatamente aqui, onde
à tessitura das horas me converto em ritos
toda a floração dos meus desejos
de ancestrais origens me antecipam.
A quem pertence o seio, amada,
sob o meu lábio? Que de tal modo
como torres magoadas me confundem.
As auréolas do teu ventre submisso
que não sei se de mim ou de ti mesma
o seio e o lábio, amada, em que me perco.
Bahia, 1970.
Página publicada em maio de 2011
|