GLAUBER ROCHA
Cineasta genial do movimento do Cinema Novo. Polemista, espírito arrebatado. Pouca gente sabe que deixou também poemas de sua lavra fértil e vertiginosa, com a fluidez nervosa com que também movia a câmera, no turbilhão agitado de suas idéias. Os poemas surgiram oportunamente com o título sugestivo de POEMAS ESKOLHIDOS DE GLAUBER ROCHA, numa edição da Alhambra (1989) organizada por Pedro Maciel, em Brasília. Digna de colecionadores.
ROCHA, Glauber. Poemas eskolhydos de Glauber Rocha. Brasília, DF: Editora Alhambra, 1989. 93 p. 14x21 cm “ Glauber Rocha “ Ex. bibl. Antonio Miranda
Kapital Song
o pássaro sagrado é velho feio
doente e fraco
o pássaro sagrado que vive
dentro de um ouro no alto da
árvore que entra nas nuvens
Com as penas da coroa deste pássaro
se faz a coroa da eternidade
Pássaro
Este passaro atrai Cocteau. Águia de
Galos
cantar galos auroras moventes
galos de lorca galos de luz
galo pedrês galo gullar
galo de festa galo caribe
galos daqueles carajos dourados
galo espora galo esporra
galo terreiro na rinha feroz
galos galinhas na boca do dia
cantando brigam galos de guerra.
Roma ferragosto de 1973
querido tom
dentro de mais um mês lhe faço uma carta porque tenho um projeto genial que precisamos fazer juntos.
No momento, depois de ter chorado algumas vezes ouvindo matita perê, aqui vai meu agradecimento
Saudade
nas horas tristes de exílio
me onsolo com Antonio Carlos Jobim
Norte Sul Leste Oeste
eu pra você
você pra mim
a e do paraíso
Tom Jobim
os sonhos de Villa Lobos
desaguam do piano
nas veredas do violão
Antão Carlos toca e canta
mata a morte
viva paixão
Antonio Carlos Jobim
meu companheiro de sertão
nas horas tristes de exílio
me consolo com Tom Jobim
Norte Sul Leste Oeste
eu pra você
você pra mim
ave do paraíso
Tom Jobim
o sopro de Vinicius a voz de João
desintegram dissonantes velhas estações
renascem da floresta ao litoral
gemidos pios assovios sons notas cantos
da bossa cada sempre cada vez mais nova
da marcha da valsa do samba da roda
do frevo do choro do coco do baião
do romanceiro do maracatu
do cantochão
das sinfonias das terras do sem fim
do silêncio eterno dos espaços infinitos
do verso
da prosa
do amor
da flor
de Nara
de Norma
de Lara
d'eu pra você
de você para mim
Sabiá do Brasil
Antonio Carlos
Tom Jobim.
Glauburu*
(ps - o eu pra você/Você pra mim é roubado de Oswald de Andrade mas na natureza nada se perde, nada se cria, tudo se transforma na prática eterna do materialismo histórico e dialético ). Roma, agosto de 1973
*apelido do Glauber.
Desejo
Querida você
Profundamentaberta
Num beijapaixonado
Sem memória
E futuro
Queria
O prazer desintegrado
No infinitamor
De nossos corpos
Desconhecidos
Queria um rio negro
Outro branco
Contanto a Vytoria
De uma tragycomedia morta
Queria o maramoroso
De tua pele viva
E a poesia da madrugada
Los Angeles, março 1976
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