CHICO PINTO
(Francisco José Pinto dos Santos, 1930-2008)_
Francisco José Pinto dos Santos (Feira de Santana, 16 de abril de 1930 — Salvador, 19 de fevereiro de 2008) foi um advogado e político brasileiro que exerceu quatro mandatos de deputado federal pela Bahia e se destacou como integrante do “grupo autêntico” do Movimento Democrático Brasileiro que pregava uma oposição mais contundente ao Regime Militar de 1964 em contraposição à postura comedida do “grupo moderado”. Era conhecido também pelo epíteto de Chico Pinto.
Filho de José Pinto dos Santos e Inácia Pinto dos Santos, ingressou no PSD e nele permaneceu até a chegada do bipartidarismo por força do Ato Institucional Número Dois outorgado pelos militares em 1965. Nesse interregno foi eleito vereador de Feira de Santana em 1950 e em 1954 graduou-se em Direito pela Universidade Federal da Bahia atuando como advogado.
Eleito prefeito do município em 1962 teve o mandato cassado e assim fez opção pela oposição após a queda de João Goulart em 31 de março de 1964 e nessa condição fundou a seção baiana do MDB em 1966. Eleito deputado federal em 1970, logo divergiu da orientação moderada existente no partido e foi um dos fundadores do “grupo autêntico” do MDB cuja postura sinalizava uma ação mais contundente em relação ao poder militar. No episódio que culminou com a “anticandidatura” de Ulisses Guimarães à Presidência da República em 1974 defendeu a tese de que o partido necessitava denunciar a situação política do país, entretanto compartilhava de uma visão segundo a qual concorrer com o General Ernesto Geisel no Colégio Eleitoral seria legitimar os esbirros do regime de exceção, razão pela qual defendia a renúncia de Ulysses momentos antes da sessão, mas como o MDB se recusou a assim proceder foi um dos vinte e três parlamentares oposicionistas a se absterem da votação.
O ano de 1974 foi marcado por um acontecimento ímpar em sua biografia, pois na véspera da posse de Ernesto Geisel em 15 de março, Chico Pinto concedeu uma entrevista à Rádio Cultura de Feira de Santana na qual denunciou a ditadura chilena de Augusto Pinochet numa manifestação considerada ofensiva pelas autoridades brasileiras. De imediato o Departamento Nacional de Telecomunicações (DENTEL) determinou o fechamento da emissora (que seria reaberta em 26 de julho de 1985) e o governo abriu um processo que resultou em seis meses de reclusão em julgamento realizado pelo Supremo Tribunal Federal em 10 de outubro de 1974. Após cumprir a pena no 1º BPM de Brasília foi submetido a oito processos e também a Inquéritos Policiais Militares atuando em causa própria.
Reeleito deputado federal em 1978 foi um dos fundadores do PMDB sendo elevado ao posto de Secretário-geral do diretório nacional da agremiação. Conquistou novos mandatos de deputado federal em 1982 e 1986. Faleceu na capital baiana vítima de câncer.
VIOLÃO DE RUA (II) Poemas para a Liberdade.- Textos de Affonso Romano de Sant´Anna, Alberto João, Clovis Moura, Félix de Athayde, Ferreira Gullar, Francisco José Dias Pinto, Geir Campos, Heitor Saldanha, Homero Homem, J. J. Paes Loureiro, Joaquim Cardozo, José Carlos Capinan, Luiz Paiva de Castro, Moacyr Felix, Reynaldo Jardim.. Rio de Janeiro: Editôra Civilização Brasileira, 1962. 113 p (Cadernos do Povo Braslleiro) 10,5x17 cm. Desenho da capa: Eugênio Hirsch.
(mantendo a ortografia da época)
INFERNO
"História comum dos heróicos irmãos que sobrevivem der
dos seringais da grande Hiléia."
O Inferno começa ali.
Inferno de mortandade,
maleita, fome e patrão.
Inferno de eterna dívida,
que jamais se acabará,
pois, se acaso morre o pai,
o filho trabalhará.
Em lugar nenhum do mundo,
carne-sêca, chita e facão
valeram tanto dinheiro
e tamanha escravidão.
Ê bem verdade que o padre
alivia o sofrimento,
prometendo em troca disto
o céu, como pagamento.
Ele diz que também sofre,
mas sofre um pouco melhor.
O duro é sofrer no mato,
sem pão, conforto e remédio,
sofrer cortando seringa,
sendo chupado sem tédio,
sofrer dando o sangue a vista
pra dois grandes sugadores:
mosquito e seringalista.
Sofrer sabendo que o filho
vai crescer analfabeto,
sofrer sabendo que o mesmo
está reservado ao neto.
Isso, para não citar
os jagunços do patrão,
sucurí, índio, enchente,
governo, banco, fiscal,
que nos tiram, secamente,
o pouco que se ganhou
suando no seringai.
De vez em quando o patrão
manda chamar a Maria
e faz uma preleção
sobre a tal democracia.
Pergunta se eu tenho andado
com história de comunismo,
e diz em tom de ameaça
que isto é beira de abismo.
Depois que a Maria volta
quase sempre traz presente,
não pra mim, para a Joana
que é mulher do Vicente.
O coronel é bondoso
com as esposas da gente!
Outro dia tomou conta
do filho do Zé Pretinho,
que por um estranho milagre
nasceu lourinho, lourinho. . .
Mas somente o mulherio
tem direito a regalia:
— homem nasceu pra sofrer! -
e ninguém lhe contraria.
O doutor que é da cidade
não pode imaginar,
o que é ser miserável,
viver morrendo de fome
e morrer de trabalhar.
Mas o pior de tudo isso
é que a gente não tem tempo
de assistir a Santa Missa
como manda a religião,
e se morrer de repente
vai purgar todos pecados
pela vida divertida
no calor do Fogo Eterno.
E começa o outro Inferno...
Página publicada em março de 2014
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