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BERNARDO ALMEIDA
Bernardo Almeida nasceu em Salvador, no ano de 1981. Passou a infância em Recife, mudando-se para São Paulo na década de 1990. Em 2001, retornou à cidade natal, onde vive até o momento. E poeta, fotógrafo digital (desenvolve imagens artísticas sob o conceito da hibridez), escritor de contos, roteiros e tiras, compositor e livre pensador. Mantém o site Bernardo Almeida (http://www.bernardoalmeida.jor.br/home.php), no qual expõe poesias, reflexões e imagens híbridas. Estreou em 2005 com dois livros, Achados e Perdidos/Crimes Noturnos (poesia) e Acorde Violento (contos). Participou das antologias poéticas
Labirinto de espelhos (2007), Caderno Literário Impresso (2008), O Imaginário do Mar e do Navegador (2009)
MELO, José Inácio Vieira de, org. Sangue Novo: 21 poetas baianos do século XXI. Organização, seleção e notas de José Inácio Vieira de Melo. Apresentação Mayrant Gallo. São Paulo: Escrituras, 2011. 246 p. 14x20,5 cm. Inclui os poetas: Alexandre Coutinho, André Guerra, Bernardo Almeida, Caio Rudá de Oliveira, Clarissa Macedo, Daniel Farias, Edson Oliveira, Érica Azevedo, Fabrício de Queiroz Venâncio, Gabriela Lopes, Georgio Rios, Gibran Sousa, Gildeone dos Santos Oliveira, Janara Soares, Lidiane Nunes, Priscila Fernandes, Ricardo Thadeu, Saulo Moreira, Vânia Melo, Vanny Araújo e Vitor Nascimento Sá. Col. A.M.
DE TODOS OS DECANOS INSANOS
E PROFANOS
Na minha casa destampada
Baratas surgem das panelas
Rugem nas madrugadas
Têm tamanho de ratos
Na sala, morcegos rondam
Cadeiras aleijadas e abajures sem luz
Tateiam, bêbados, os prantos do escuro
Em círculos incompletos — devoram o absurdo
Os pisos não participam do festim
Pedem apenas para ser trocados
Súplica negada!
No prédio, não há janelas
Mas televisões
Cujas telas são auditórios
Em que o palestrante profere
Um discurso pornô
Em sincronia
Com os reais ruídos
Do amor
Aqui, nas madrugadas
Da Bahia, em Salvador
Não existem santos
Talvez cheguem como tais
Mas morrem sempre mundanos
Nada a expiar, somos todos perdidos
Processo de canonização interrompido
Pêlos eflúvios sexuais
Pela efusão da libido
Embebidos em êxtase
Peristáldcos excessos
Na cidade que é mãe
E amante do poeta
Que é tia. e mãe
Das minhas netas
Devotos do prazer
Todos os santos amuados
Converteram-se em vivazes peregrinos
Em busca do deus humano do orgasmo
Que redime o pecado
Sem tentar curar ou glorificar
Aquilo que já está salvo e satisfeito
Ceifado, deglutido, envenenado e celebrado
Pela carne nua da hóstia
Banhada nos mares hostis
Relutantes e resolutos
Da pia batismal oceânica
Na qual deitou a cabeça
Do nome de nascença
Dessa terra lúbrica
Que se fez povoar
Pela indiferença
ALMEIDA, Bernardo. A utopia do carnaval sem fim.
São Paulo: Editora Penalux, 2020. 84 p. ISBN-13: 9786599207686 / ISBN-10: 6599207685
Poemas do livro "A utopia do carnaval sem fim", do autor baiano Bernardo Almeida, editado pela Penalux (SP), como sugestão de publicação. A capa da obra é do artista plástico Miguel Cordeiro.
[Enviados por Bruno Schwartz]
I
Quantas almas em revoada
Na escalada sem tino ou prumo
Ao cimo desconhecido da alvorada
Rediviva frustração iluminada
Na recomposição do ocaso
Na dissimulação do caos
Mas não há fronteiras na eternidade
Nem picos na solidão do infinito
Inconsciência a quedar nos cantos aflitos
Pulverizando a ilusão na razão da humanidade
Fúlgido conflito a derramar saudade
No contraturno da esperança
A morte nos alcança
Festa e dança
Nem todos querem viver
Remoto
O som do mar
a ricochetear
nas fronteiras
invisíveis
da inóspita imensidão
Chão em desintegração
queda, apupo, alienação
E o oceano, em derrisão,
impassível - a compor
a canção da criação
do infinito
Íntima transformação
no ínfimo átimo universal
II
Estranhos eram
Até que fizeram
Sexo e dois filhos
Desconhecidos
Viram familiares
Até que acordam
Arrependidos
Entreolham-se
Ofendidos
Cenho franzido
E partem separados
Sempre enganados
Um de cada lado
Retornados estranhos
Como outrora foram
Um para o outro
Par dissonante
Pai e mãe
Dos desconhecidos
Que produziram
Autópsia
Caminhamos com os mortos, enquanto expiramos
Esperamos a eternidade e perecemos nos torvelinhos dos anos
Que fogem ao que vivemos, como se eternos fôssemos
Falhamos e nos entretemos, tão logo o erro se faz efêmero
Fosse um raro verso fúlgido a crepitar na órbita do sol
Desalojaríamos o futuro, sem compreender o fulcro das eras
Não sem danos, escalamos a escarpa do astro venerando
Íngreme soluço da inexatidão a vociferar crueldades
Aspergindo, anonimamente, generosidades
Nos maremotos dos ânimos, nas veredas da incompletude
150 megatons
Eu era forte quando negligente
negava a influência indolente
do tempo sobre a existência
era ventania, braço cortado
apartado do corpo
a remar contra a maré
era bravio e independente
perene, inteiro, transversal
eu insurgia e contemplava
não queria ser aceito ou acolhido
eu evitava ser especial
o mais lembrado, o escolhido
eu não queria nada de menos ou de mais
tinham-me como indiferente
eu não era nada além de livre
e esse pouco que eu tive
era o infinito que me bastava
estava só – e não tinha consciência
do que era a solidão
a tristeza não passava de um condão retórico
sobre um ponto de vista cadavérico
no deserto estratosférico da multidão
Gólgota
Você procura pelo futuro
no fundo de um cesto de lixo,
pendurado em um poste apagado,
e encontra nada além do rastro
do escuro insensato de dias anteriores
"Ninguém mais compra
badulaques folclóricos"
"Quem vai pagar
pelo que ninguém quer
sequer de graça?"
Quem se apieda e se importa
não frequenta as ruas
nas quais você trabalha
e transborda
Dando informações
imprecisas a turistas,
você ainda
guarda e lava carros
Deambula aturdida
apressando o passo,
sem destino esperado
Na fornalha dos trópicos,
quando o tempo fecha
e a dificuldade aperta,
você pede – e não disfarça
Mas fica injuriada
ao ser confundida
com uma esmoler
Os seus braços inchados
estão completamente atados
às armadilhas da estrada,
tão lotada de bifurcações:
encruzilhadas nas cruzadas da existência
Você é a penitente persistência,
contrastando com a indiferença
de quem já desistiu
Você é um paradoxo,
que encorpa na miséria,
enquanto grassam
as pilhérias de toda a sorte,
a se confortar na tragédia
No repasto, apascento o ânimo
você pena, mas não definha
engorda de barriga vazia
e sorri - recobrando
por um átimo
a consciência
do que poderia ter sido,
se tivesse nascido
em outro lugar
parcos e porcos
descarno o sol da tua pele ofendida e vazada
pelo orgulho afável da noite sem fim
imaginação desértica a inflar sem sangue
para tudo tornar dispensável
erra o vento que nos move de lugar
empurrando-nos ao contorno inconcluso da morte
choramos como brigam os bons amigos
enterramos pedras no paraíso
como corpos celestes embevecidos
dispensados na cratera
do pó interestelar da manhã
que rejuvenesce na espera –
quando a guerra se esmera
ao enrubescer cretinos e assassinos
progredimos
enquanto a ordem vocifera e determina desalinhos
parcos e porcos, na terra, em desgraça
ditam os caminhos que os fazem prosperar
I
O amor é uma ponte
de solidão e delírios
estendida
entre dois precipícios.
II
Só quem conheceu a indiferença
sabe o peso da certeza do arbítrio
III
As escolhas são estradas
que nos circunscrevem
IV
o ansioso
quer colher grãos
antes de ser vagem
V
Nem tudo
O que cala
Necessariamente
Consente
O silêncio corta
Inclemente
O eixo
Da piedade
VI
Quem grita
faz da escrita
um muro
de sussurros
VII
A vida é uma paródia
do apocalipse
VIII
Cada pessoa que morre
manda um recado
para toda a humanidade
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Página ampliada e republicada em dezembro de 2022
Página publicada em dezembro, por orientação do organizador da antologia.
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