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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

ADELMO OLIVEIRA 

ADELMO (José de) OLIVEIRA nasceu em 13 de maio de 1934, na cidade de Itabuna, na Bahia. Em 1962, sob um júri formado por nomes de expressão da literatura brasileira, como Manuel Bandeira, Austregésilo de Athayde, José Carlos Lisboa e Pio de Los Casares, recebeu o Prêmio Nacional Luis de Góngora com o ensaio Góngora e o Sofrimento da Linguagem. Formado em Direito pela Universidade Federal da Bahia, em 1966. Participou do Movimento Cultural baiano escrevendo estudos, ensaios e poesias para os principais jornais e revistas de Salvador.

Publicou entre outros títulos: Canto da Hora Indefinida (1960); Três Poemas (1966); O Som dos Cavalos Selvagens (1971); Cântico Para o Deus dos Ventos e das Águas (1987); Espelho das Horas (1991); Canto Mínimo (2000), Poemas da Vertigem (2005); e Canto Mínimo e Poemas da Vertigem (2010). Participou de várias Antologias Poéticas editadas na Bahia, no Sul do País e no Exterior. Exerceu atividade política contra a Ditadura Militar, sendo preso por duas vezes e torturado. Foi eleito Deputado Estadual à Assembleia Legislativa do Estado da Bahia pelo antigo MDB em 1978.

 

 

Página preparada por JOSÉ INÁCIO VIEIRA DE MELO

POEMAS DO LIVRO
“CANTO MÍNIMO E POEMAS DA VERTIGEM”

PUBLICADO PELA ESCRITURAS EDITORA, EM 2010

 

 

 

Soneto da Última Estação

(Mitologia Marinha)

 

 

Esta que vem do mar por entre os ventos

Sacudindo as espumas dos cabelos

Vem molhada de azul nos pensamentos

Seu corpo oculta a ilha dos segredos

 

Vem e dança ao andar sobre as areias

Úmidas sob os passos e os desejos

Onde as ancas são ondas em cadeias

Infinitas de luz contra os espelhos

 

Nem precisa de flor nem de perfume

Ela é a própria essência do ciúme

Feita de mito e se fazendo estrela

 

Vem – dança – e passa aos fogos do verão

– Fantasia da última estação

Explodiu na vertigem da beleza

 

 

 

Dever de Casa

Ao poeta José Inácio Vieira de Melo

 

 

Eu sou um velho ator sem palco e sem platéia

Que traz no cais do peito antigas ilusões

E do pouco que sabe interpreta lições

De palhaço que alegra os meninos da aldeia

 

Basta o dia raiar pelas bandas da aurora

– Levanta – bate a porta – e vai ganhar a rua

Tropeça no silêncio em que flutua a lua

Restos de solidão caminhando lá fora

 

Esqueço a dor – o espelho – as marcas do meu rosto

 – Produtos do salário em que se paga imposto

Cobrado pelo tempo e pelas fantasias

 

Andarilho do vento atravessando o acaso

Deixo a tarde no céu – o meu relógio atraso

E assim faço de mim a profissão dos dias

 

 

 

O Som dos Cavalos Selvagens

 

 

Dentro da noite

E pelo dia

Um eco surdo

De ventania

 

Sobe a montanha

Transpõe o vale

– A fúria avança

– A sombra invade

 

Marcas no tempo

Finas esporas

– Um catavento

No fio das horas

 

Patas de ferro

Porta-fuzis

Deixa no vento

A cicatriz

 

Dentes de faca

Olhos de fogo

Cuspindo raiva

Do próprio rosto

 

Destrói cidades

E espanca a luz

Por onde passa

Finca uma cruz

 

Tempo de guerra

Este é meu tempo

– Cavalos de ódio

No pensamento 

 

 

 

Fragmentos de um Devaneio

Ao poeta Florisvaldo Mattos

 

               Beauté sur mês genoux.

                 Et j’ai trouvée amère. – Et je l’ai in juriée.

                Arthur Rimbaud

 

 

Lua

       carruagens de prata

Puxadas por cavalos

Nas colinas

                   do amanhecer

 

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Um dia

             não esqueci as luzes do passado

E nem o gênio obscuro do meu cérebro

                                          se iluminou

Encoberto pelas névoas do acaso

– Abdiquei o trono da Beleza.

 

Troquei as homilias da Bíblia

              as teogonias de Hesíodo

              os cantos de Homero

Pelas metáforas agudas da Paixão.

 

Aprendi línguas – dialetos

              doutrinas diversas

Folheando tratados

              encerados pelo verniz do tempo.

 

Trágico

             anoiteci nos becos e vielas da luxúria

             debaixo de um céu de diamantes espalhados

             pelo terror enigmático do infinito.

 

Ora lúcido

Ora bêbado

            enterrei sob as pilastras do Coliseu de Roma

                                                        os ossos de Nero.

 

Por onde andei

Enganei as ilusões

– As violetas floresciam nos quintais.

 

Parti

        na penumbra de todos os silêncios

Atravessei os desertos da África

                                          até Áden

E fui morar

        entre cinzas

Na cratera de um vulcão extinto

Onde as plantas não nasciam na terra

E o calor se aproximava do sol.

 

Traficante de aventuras a fio

Eu me tornei um guardador de moedas

Por avareza de sentimentos

E orgulho da alma.

 

Depois de rico

Fiquei pobre de vida

E na penumbra de todos os silêncios

Voltei

-  Arqueado sob o peso de um cinturão de ouro

Mais velho que os dias da morte

Além das marés lavadas de chuva.

 

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Quando eu morrer

Vou invadir o céu

Montar na cauda de um cometa azul

Arrastando correntes de estrelas

E escrevendo no espaço

Os versos de uma canção de amor.

 

Lua

       carruagens de prata

Puxadas por cavalos

Nas colinas

                   do amanhecer.                  

 

 

 

Balada dos Erros de um Profeta

 

Joys laugh not! Sorrows weep not!

       Willian Blake

 

Man, an explosion

Walking therough the night

In rich and intolerable loneliness

Walt Whitman

 

 

Trago para dentro do mundo

Longos dias em manhã

Longas noites sem aurora

– Estrelas caídas de bruços

No vazio

 

Trago para dentro do mundo

A voz – signo obscuro do medo

Grito de silêncio devorado pela esfinge

– Pedra-enigma da mente

Na vertigem

 

Trago para dentro do mundo

O sol – zodíaco das trevas

– Touro selvagem empalhado

Cuja língua vomita da boca  

Sangue coagulado

 

Trago para dentro do mundo

A Terra – bólide errante das esferas

– Assobio de náufragos e transeuntes cegos

Que trauteia um eco surdo nos ouvidos

E nos passos que se perdem

 

Trago para dentro do mundo

A lua – corvo branco da noite

Que ludibria o terror das sombras

Que dissimula a morbidez da loucura

E afia os seus punhais contra o desespero dos dragões

 

Trago para dentro do mundo

Este navio sem origem

– Este porto sem mar

Cuja âncora atraca na raiz das ruínas

Arquivos de ilusão

 

Trago para dentro do mundo

Aquilo que é o meu corpo

Aquilo que é a minha alma

– Sopro veloz de um único suspiro

Entre o início do princípio e o ocaso do fim

 

 

 

Sandálias

Ao jogral Elizeu Moreira Paranaguá

 

 

Onde estão minhas sandálias?

O tempo diminuiu no céu

– Meu corpo, eu o tatuei com penas de arco-íris

 

– Lâmpadas acesas nos pés

Olhos de ventania

– Um pássaro de vôo andarilho

Corrupiava o chão da manhã

 

Onde estão minhas sandálias?

Rosto de sol

– Mãos sujas de terra

 

Até ontem o menino andava

Entre crepúsculos de fogo

Abrindo veredas de lua

 

Onde estão minhas sandálias?

 

Apaguei o eclipse

Que feria meus olhos:

– Vai e tira o sal dos teus cabelos

E amarra minha dor ao colar do esquecimento

Até onde a noite se perder nos redemoinhos do tempo.

 

 

 

Palavras de um Andarilho

 

 

I – O Silêncio

 

 

Se eu pudesse escrever o silêncio

Criaria uma nova língua

– Uma gramática de signos

Signos a compor um espaço do nada

 

Se eu pudesse escrever o silêncio

Viajaria no deserto

Consumindo distâncias e miragens

Para decifrar o segredo

 

Se eu pudesse escrever o silêncio

A imagem nasceria atrás do espelho

– A morte falaria

E em seu redor não cresceria a ferrugem do tempo

 

 

 

II – Os Delírios

 

 

Expulsem de mim os delírios

A Terra foi varrida por um turbilhão de ódios

– As veias extravasam músculos

E mancham de sangue as cortinas

                                              deste palco

 

Venho do genoma na cadeia de milênios

E tudo que sou e sempre do que fui nunca serei

– Homem-Enigma eu me dissolvo em pó de argila

Regido pelo terror dos céus e pela angústia

                                                            do acaso

 

E vede amigos que até rio do brilho do sol

Para quebrar a morbidez da lua

– A história é tão sinistra que se oculta atrás da porta

Onde o grito da metáfora transpõe o ritmo

                                                           dos astros

 

Expulsem de mim os delírios

– Sou um átomo de luz nas trevas

A tropeçar em vão no chão das horas

Que repetidas se propagam na vastidão

                                                     do nada

 

 

                                                        

III – A Morada

 

 

Minha morada são os caminhos

– Nas cidades fico à sombra dos parques

– Nos ermos à beira dos rios

– Nas montanhas sou pastor de solidão

 

À noite entro na casa dos delírios

Onde os sonhos se esvoaçam

E o terror é causado no cérebro

Pela vertigem da Via-Láctea

 

A manhã põe em fuga as andorinhas

Que vão desaparecer no crepúsculo

– A porta do céu não é o paraíso

Onde queimo os pés nas pedras do caminho

 

 

 

Elegias da Solidão

Para Ricardo, meu filho

(Im Memoriam)

 

 

Primeira Elegia

 

 

Eu tinha medo

                        mas invadi o silêncio

Impenetrável da noite

Até cuspi no chão o sal da vida.

 

Pequenino

                 devagar

                              encontrei as luzes do tempo

E caminhei alegre

                             antes da aurora nascida

Os cabelos tão louros de ventania

Trafegavam na cabeça

                                     de flor

                                                os olhos peregrinos.

 

Os anjos temporários

                                   de alegria

Adiantaram com pressa

                                       os teus passos para o infinito

A mãe e o pai olhando a cruz do próprio enigma.

 

Eu tinha medo

                        mas invadi o silêncio

E me crucifiquei no porto

                                         era a partida.

 

Tantas horas se debruçam sobre as horas

                                                                  de travessia

 

Agora não me pergunto

                                       nem te perguntaria

Em cada palavra de riso

                                       em cada signo de verbo

Em cada lágrima

                            em cada gota de delírio.            

 

 

 

Segunda Elegia

 

 

Eu

     translúcido

                       corri pelo rio das areias

E na penumbra da tarde

                                      sou testemunha da aurora

 

Este grito de silêncio

                                  é uma flor da água no espelho

Uma bolha de vento sopra

                                          alma etérea navegante

Esquecida nas veredas azuis do céu

                                                         nos teus cabelos

Tão louros de tinta de ouro

 

Agora vi os sonhos do mar

                                           as eternas espuminhas

Nadando de alegria

                                sobre as ondas de canções da inocência

 

Eu

     translúcido

                       a lua se partiu em quatro metades

Para alcançar de ânsias nos olhos

                                                      a claridade da manhã

 

 

 

Terceira Elegia

 

 

Aqui

        por este caminho

Os pássaros e as estrelas em meus ouvidos

Os teus cabelos de milho

Agora se levantam neste grande labirinto.

 

Aqui

        por este caminho

Até o pranto e o mar se perdiam de azul

E as espumas brincavam nas areias

Grande poeira de sal e maresia.

 

Ontem

           tão antes

                         eu não era esperança

Crivei no peito o espinho da lágrima

Este orvalho da manhã

                                    escondido de alegria.

 

Agora

          eu beijo em vão  o chão e os pés

Uma flor

              um lírio-d’água do rio

E atônito te procuro entre as dobras do tempo

Enfim

          Eu sou a solidão nas cercanias.

 

 

 

BREVE ROMANCEIRO DO NATAL no ano de mil novecentos e setenta e dois do  nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo.   Salvador: Editora Beneditina Ltda, 1972.   ilus. s.p.   22,5x 30 cm.    Ex. bibl. Antonio Miranda.

 

        

MEU NATAL DE SEMPRE

 

 

Ficou na sombra a casa onde morei
As árvores do quintal, a ventania
E eu, pequeno ainda, me recordo
Quanto chorei, quando cantar devia.

 

Ficou no céu o tempo que sonhei:
Sapato de verniz dependurado
Num saco bem vazio de esperanças
Qual pacote amarrado pelo vento.

 

Não finjo o sonho em que me sustentei
No portal da janela de meu quarto:
As bolas de borracha coloridas
(Revólver de brincar de detetive).

 

 

 

 

 

Poesia religiosa e mística / cristã - Natal

 

Página publicada em março de 2011. Ampliada em setembro de 2019

 

 

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