SIMÃO PESSOA
Poeta e humorista, cronista, blogueiro, compositor e escritor nasceu, em Manaus, 1956. Formado em Engenharia Eletrônica, na UTAM. Dedica-se ao jornalismo cultural e à atividade de produção e criação publicitária. Apaixonado por rock na adolescência, sua poesia foi muito influenciada pela música. Foi leitor e divulgador, em Manaus, da geração Beat americana e da poe¬sia marginal brasileira. Produziu artesanalmente seus primeiros livros. Estreou com o livro de poemas Old fashioned, 1977. Tem vários livros em prosa: Manual do espada, 1999, Folclore político do Amazonas, 2000.
Poemas extraídos de:
A POESIA SE ENCONTRA NA FLORESTA. I Encontro Amazônico de Poetas da América Latina. Trad. Thiago de Mello. Manaus: Editora Valer e Governo do Estado do Amazonas, 2001. 384 p.
Agônica
Pés rudes pisam terra & torram
em torvelinho
a erva.
Rés terra negra fica & fere
em febril gesto
a vida.
Só força bruta cede & sarja
em sarrabulha
a sebe.
Só coivara resta (réstia de luz)
em lúgubre
floresta.
Constatação
Tudo temos feito todos:
palavra e afeto afago
de ninar em nicho raro
(e nada fez efeito feito)
todos temos feito tudo:
missa no portal portas
de falar das favas mortas
(e nada fez sentido sido)
de tudo temos sido todos:
amigos de fé e coragem
no fel febril da cidade
(e nada melhorou nada)
de todos temos tudo sido:
trigueiro mear de peão paneiro
prenhe de pão
(e de tanto dar-se, nada deu-se...)
Sateré-Maué
Sateré-Maué que foi feito ao povo?
(na imensidão da selva permanece morto)
Sateré-Maué que foi feito ao povo?
(veio o homem branco com braço de fogo)
Sateré-Maué que foi feito ao povo?
(muitos se mataram de tanto desgosto)
Sateré-maué que foi feito ao povo?
(os que sobreviveram esconderam o rosto)
Sateré-Maué que foi feito ao povo?
(em museu turístico finalmente posto)
Sateré-Maué que foi feito ao povo?
(acabaram o nome, acabaram o povo)
Zona Franca
Esta zona nunca foi franca
mas falsa:
com seu estilo decadente
de art noveau sem graça.
Ali onde havia macacaúba,
marupá, louro e andiroba
hoje é só vidro fumê
(concreto armado
com portas pantográficas
e dégradê).
Ali onde nadava o matrinxã,
piramutaba, tucunaré e jaraqui
hoje é só veio de lama
(esgoto fétidos
com suas imundas
ratazanas).
Ali onde cantava o japiim,
pipira, curió, uirapuru
hoje é só banco de mármore
(carrinho de pipoca
com a praça da Matriz
e da Saudade).
Ali onde andava o tracajá
capitari, iaçá e cabeçudo
hoje é só vão de dentro
(urubu sobrevoando
com cunhas catando
o lixo).
Ali onde comia o caititu,
queixada, tamanduá e capivara
hoje é só desmatamento
(conjuntos do BNH
com gente cabisbaixa
dentro)
esta zona franca nunca passou
de um rendez-vous:
Com suas polacas new society
e seus homens-guabiru.
Página publicada em fevereiro de 2016
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