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JOAQUIM CORADO
Joaquim Francisco da Silva Corado
Idade: 71 anos (04/10/1947)
Naturalidade: AM - Amaturá
CORADO, Joaquim. Verde geral. Apresentação de Pojucan Bacellar. “Orelha” do livro por Alcides Werk. Capa: Rômulo Nascimento. Ilustração: Palheta. Manaus: Edições Kintaw, 2005. 112 p. ilus Inclui um Glóssário. Ex. bibl. Antonio Miranda.
“Quem tem a vivência de mais de 30 anos, neste paraíso verde e aquático, como eu, fica veramente comovido ao acompanhar o poeta em seu périplo maravilhoso, nas asas do Vento Geral.” ALCIDES WERK
ONDE O VENTO FAZ A CURVA
Aqui neste ponto,
fim do mundo,
onde o vento
faz a curva,
quando a água
é transluzente
e o verde
é transbordante,
vê-se que
o zumbido do silêncio
assunta,
mas reconforta o espírito
e a certeza de ver-se
frente
à imensidão
do mundo.
Rio Solimões, acima de São Paulo de Olivença, jul./96.
DERRIBADA
O estrondo da mata
do verde que morre
é pranto que brota
o ocre rodeia.
A roça que nasce
na queda da árvore,
na força do machado
o tronco ronqueia.
Na fenda que arreganha
a ferida se abre,
é o aço que mata, fere
e corta e rasga a veia.
Na seiva que míngua,
a clareira descobre,
o sol inclemente
deixa o verde à míngua.
Permeio é aviso
que breve na mata,
o canto morre, a vida foge
e a morte campeia.
VENTO GERAL
O rebojo transforma na cor do mel
as negras águas feridas pelo casco do barco,
que balança
e rasga impiedosamente o caminho
nas revoltas ondas brabas de bigodes brancos
pela fúria do vento,
que, como usança,
todo dia despeja sua raiva e faz o sacolejo
da água prateada pelo brilho do sol,
oceano de infindáveis estrelas cintilantes.
E o casco, como nave, flutua e permeia agitado,
apagando-as uma a uma com a perícia
do piloto, caboclo corajoso,
prático teimoso,
que enfrenta sem temor a porfia,
no vai e vem da travessia
do velho negro,
o rabugento vento leste que açoita todo dia,
por duas horas, infalivelmente na mesma hora.
Ao meio-dia,
há o encontro bravio, raivoso,
revolto, nervoso:
água e vento, vento e água
rebojam e enfurecem o rio Negro.
É o vento geral.
Manaus, 09/00.
BANHO NA BEIRA
A algazarra e a farra
do banho na beira
Nada era igual,
o escorrega-lá-vai um
pelado de bunda
No tobogã do tijocopau*
O mergulho era certo
Na medida do impulso
Vencia o rival
A afogadela e o rescaldo
no moleque menor
Era brincar sem maldade
A fingida mordida no mocotó
por baixo da água
era susto bem grande e
grito na certa.
Acabava a festa
com o grito da mãe
lá da ribanceira.
-Tá na hora! Vamos!
Com o cipó-titica*
batendo na mão.
Era vestir o calção
e correr pra ver
quem chegava
primeiro e pegava
uma só lambada.
O último pagava
por todos...
*tijucopau – terra da beira do rio ou igarapé
amolecida pela água durante a enchente.
*cipó-titica – uma das espécies de cipó,
originário da Amazônia.
Página publicada em novembro de 2018
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