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Foto e biografia extraído de http://rebra.org/
GILMA LIMONGI BATISTA
Durante sua carreira acadêmica, vem atuando no magistério, como professora das línguas vernácula e estrangeiras, tanto em universidades particulares quanto federais e estaduais, bem como em instituições governamentais. Como conferencista, pronunciou palestras em Congressos sobre o processo de ensino e aprendizagem com abordagem instrumental, área em que se tornou especialista e na qual defendeu dissertação de Mestrado na Pontífica Universidade Católica de São Paulo.
Por haver sido premiada em concursos literários ou por convites, participou de quatro Antologias entre poesias, contos, crônicas com publicação em jornais e revistas. Como ficção brasileira, publicou o ramance "O céu por entre a renda caprichosa das folhas da Amazônia".
Atualmente reside em Brasília - DF, onde é membro do Sindicato dos escritores de Brasília. Nascida e criada em Manaus, a escritora amazonense discorre predominantemente sobre a mitologia amazônica, como na recriação da lenda do boto - fêmea. É militante da utopia da defesa do verde entremeado de apavoradas vitórias-régias.
Prefere pensar que, na busca pelo seu muiraquitã da felicidade, trocou a Hiléia pelo cerrado de solidão, embora, mesmo lá, continue a gritar para o nada de ninguém, o seu slogan eterno: "SALVEM AS VITÓRIAS-RÉGIAS". Gosta de assumir-se como uma folha que silenciosamente, só chora.
O RESGATE DA PALAVRA: I Antologia do Sindicato dos Escritores do DF. Brasilia: Thesaurus, 2009. 156 p. ISBN 978-85-7062847-3
Amazônia: colorida metáfora — queimada
Nós, os verdadeiros moradores do sol, raramente estranhamos o calor. Sabemos como viver a quentura, tirar vantagem de sua ardência, cheiramos o sol. Qualquer temperatura abaixo da queimação vira inverno.
Sentimos falta do suor escorrendo, pingando das sobrancelhas, gostoso mesmo é chorar de calor muitas lágrimas de amor. Para muitos, estraga não só as comidas como o humor, ruminam o tempo todo da inabitabilidade do sol, desconforto da roupa colada ao corpo, fica tudo grudado... Hoje nem a quentura é a mesma, aumentou tanto!
Amazónia Azul, Verde, Pan-Amazônia, Amazónia Legal, tem Ilegal ou em toda ela o é? Quantas afinal? Questão de linguagem ou simples questão de adjetivos? Será que para o mundo, a Amazónia é tão - somente uma metáfora? Quei-mada-colorida.
Querem mesmo é botar a mão nela, transformá-la num loteamento lucrativo minúsculos de lotes de mil metros quadrados, três dias rio acima e treze dias rio abaixo, sabe-se lá até onde ou quando; como se fosse possível partir, repartir, quebrar, diluir, dividir, derrubar, replantar, lotear e esmigalhar uma metáfora!
Ela se sente como se estivesse traindo o verde. Ofereceu à humanidade beleza, grandeza, nobreza. Recebeu metáforas: Impacto ambiental, desenvolvimento sustentado, sustentá¬vel, mais metáforas rio abaixo...
Pelo menos são belas. Pois diante de outras, a razão sucum-be, diante da feiúra e pobreza. Elas quebram os recortes dos rios e das matas, para tentar reconstruí-los, ( mapeamento por satélite) cheio de buracos esfumaçados, fumegando de ódio e de dor.
Fico imaginando quando queimarem tudo, quando restarem apenas clareiras de tocos pretos, troncos de fraturas expos-tas, não há metáfora que resista ao apocalipse. A poeira e a fumaça trarão o cheiro insuportável do horror. Só pulmão estourado por toda a parte, não poder mais reclamar, muito menos respirar. Nem nós nem o resto do planeta, acima ou abaixo do Equador.
Em vez de internacionalizar a Amazónia, vamos amazoni-zar o mundo?
Entre a cobiça de todos e a indiferença comum, posso dei-xar-me devorar lesamente, ou gritar: deixem a Amazónia em paz, para viver seu reflexo de infinito em seus cenários encantados.
Como se fosse possível alguém ouvir um grito perdido den-tro da selva ou afogado no meio do rio...
RAPSODIAS. Selección de poesia contemporânea. Montevideo: aBrace editores, 2010.
96 p. ISBN 978-9974-8224-4-6 Ex. bibl. Antonio Miranda
Amazônia : poesia de águas e folhas
Rios silenciosos criam terras caídas.
Em suas margens como ikebanas tropicais
despencadas folhas tentam segui-los.
Ao tempo de sua mutação, elas
tornam-se marrons, esburacadas,
temem soltar-se, virar pedacinhos esparsos.
Tornam a forma aquele uma
para sempre dentro da rigidez de um quadro
emoldurado pela angústia e tristeza,
olhos de negro rio, retrato da carência...
Gritam, ensopadas de pavor:
“Queremos viver, não nos destruam somos verde!”
No palco de um presente imaginário,
momento em que a alma é divina,
descem no real a pisar no irreal lentamente
VIVAS,
descendentes das Amazônias,
personificação, deificação das caboclas, cunhãs
BOTOS-FÊMEAS.
Deviam mesmo era estar vestidas de dourado
deitadas nuas na desilusão
enquanto devoram a grandeza em volta,
despidas de toda arte da solidão
e da indiferença ou descaso de tantos.
São enganadas por Homens--botos
de buracos na cabeça
séculos para aprenderem
que só o Rio comanda a vida...
Amazônia: No Silêncio
O gosto indelével da grandeza
nem todos suporta. Tem sabor da inveja,
desejo, lembranças que grudam na boca ardida,
dolorosamente contemplo rios, parecem sem fim
tem Negro, Branco, Verde, Barrentos,
nas margens o Sol bate forte, pele gritando,
quentinhos e macios
TADINHOS
Na sua beleza, supostamente eterna
hordas de bárbaros, oriundos de toda parte,
atiram neles seu ódio em forma de lixos indestrutível.
As águas confusas sabem demais num instante
noutro fogem apavoradas
viram areia, praias desertas
vingança sem água, só seca solidão.
Ouçam o silêncio dos rios
temos vida, vida em abundância
estranhas, algumas já aparecem mortas
lentamente sufocadas, desfazendo-se esquecidos que
se os rios comandam a vida,
por que mata-los
juntamente com todos rios, viventes?
Amazônia Solidão
Madrugada insone e úmida
lâmpadas escorrem pingos dourados
evocam coloridos e sonoras lágrimas
das incontáveis Maysas lamentando a imensidão.
Dentro de mim, a luminosidaded de vida provoca lassidão
isolamento cria questões de horror e terror.
Solidão inicia nos Andes degelados
não morre afogada nas rochas
vem arrastando-se, devagar esquentando
conforme ela e os rios avolumam-se, inchados,
perfuram tudo, escuridão só resta a lamparina
luzinha fraca ilumina a cunha,
minha alma tão pequena quanto ela
enrugada e envelhecida.
Naquela catraia segue os rastros da lenda
Da COBRA-GRANDE, onde ela se escondeu?
Por que não atende meus apelos de juntar-se a mim
como uma pororoca de dores, para esmagar
enquanto atiro mil flechas de curada veneno
contra todos aqueles que nos querem consumir,
destruição ruidosa movida a ignorância
sem voz, grito para o sol
apaga, desliga o luar, vou dormir.
A Cobiça da Amazônia
Vou usar as páginas em branco antigas agendas
para fingir preencher o passado
só com que gostaria de ter vivido
ignorar a estética da insanidade.
Recuperar pedaços perdidos de madeiras extintas
na dimensão devassada, celebrar o vazio
casa flutuante de ribeirinhos isolados
filiação legítima de botos machos e fêmeas
são movimentos parados na paisagem
com retratos pintados sem heroísmo, com cinismo.
Recebes beijos tão frios e falsos, cabocla deslumbrante
quer mais uma fatia morena de verde
nenhuma compaixão pelas orquídeas tão frágeis.
Na opacidade de lua amassada,
tentando dourar, alumiar.
A mata se fechou, ela ficou de fora
cansada, cansada de tanto subir, subir
manazinha, manazinha Amazônia
subitamente VIRAMOS MODA
posso sentir esta lembrança com facadas
nada além de uma COBIÇA a mais.
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Página ampliada e republicada em novembro de 2025.
Página publicada em julho de 2020
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