YUNBAD BAGUUN PARRAL
Ágil e destemido, qual um cangaceiro que avança pela caatinga, Yumbad Baguun Parral esgueira-se por entre as mesas e cadeiras dos bares da Lapa, em São Paulo. Dotado da estatura de 1,66 metro, lança mão de um paradoxal chapéu de couro cor-de-rosa e de uma barbicha de trancinha grisalha meticulosamente composta para atrair a atenção da boemia. Já de início a tarefa soa inglória, pois ele atua sobretudo nas calçadas e, nessa sexta-feira glacial de setembro, boa parte de suas presas virtuais parece ter capitulado ao conforto de dvds e cobertores. Por volta das 22 horas, a maioria das mesas ao ar livre está às moscas.
Mas Yumbad Baguun Parral, pseudônimo de Miguel Cavalcante Felix, não se aflige. Aos 47 anos, com segurança e paciência esculpidas ao longo de uma década na função, esse alagoano arretado ergue a cabeça e leva em frente o seu sorriso constante e simpático. Com um andar calmo e alinhado, arrematado pelo blazer escuro sobre o pulôver amarelo, vai oferecendo dois de seus produtos literários mais atraentes: o romance Santa Puta, a Redentora, que, segundo ele, já vendeu cerca de 10 mil exemplares, e a recém-lançada sátira política Senadô Severino, Sua Excrescência.
TOMAS CHIAVERINI, in: http://revistapiaui.estadao.com.br/
PARRAL, Yumbad Baguun. San Bin Laden. Lampião da globalização. Um radical manifesto “poépico” pela paz. 3ª. edição. São Paulo: “Produção independente”, 2002. 100 p. 14x21 cm. “Proesia” “ Yumbad Baguun Parral “ Ex. bibl. Antonio Miranda
SOCIOLOGIA
Carne humana dana sina / danada, carnificina / do dia a dia na
mina, / supermercado oficina, / bolsa de valores, fábricas, / presídios e hospitais...
São tais os ditos valores / que custam da vida as dores / mais
lancinantes e atrozes, / os ritos mais hediondos, / as condutas mais cretinas / e os conceitos mais sádicos.
Tão cínicos são os costumes / que os hábitos mais perversos /
são normais - viram rotina. / É espetáculo: chacina, / tortura, sevícia, morte... / - passam a ser naturais.
Pior é que se quer mais. / Rios de sangue não bastam. / O vício à perversidade / reivindica oceanos / correndo, no horário nobre, / pela tela da tv.
Do conforto da poltrona / a boa gente, assustada, / atrás das
grades de luxo / do condomínio fechado / reclama a pena de morte, / prisão perpétua, suplício...
Vêm a público campanhas / oportunistas e hipócritas / exigindo
sua paz / numa "solução final" / - "abaixo a vil tolerância, / queremos o genocídio".
Mas tem aquele humanista / que vem contemporizar, / com a
sua sutileza, / propondo uma estratégia / moralmente defensável / - uma "indução" ao suicídio...
"Suicida" toda essa gente, / satisfaz a classe média, / diverte
um pouco a elite, / com boas doses sutis / de sadismo elaborado / - para deleite do GOI...
Reproduz em massa Herzog / e cala logo essas bocas /
verborrágicas e inúteis. / Precisamos de mão forte... / Presidente sociólogo, / cadê sociologia?
CARNIÇA
Que delícia de defunto! / Bradam todos os abutres, / ávidos
pela carniça, / avaros, esganiçados, / disputando a qualquer custo / cada naco da tragédia.
Depois vendem as conquistas / em manchetes hediondas / e
fotos, imagens, sons / sangrentos e dolorosos / à massa consumidora / da matéria putrefata.
Em embalagens bonitas, / bem expostas e editadas / vendem o sangue, o pus / e a decomposição, / para deleite supremo / e delirante da malta.
Dão nomes sofisticados / e nobres aos seus produtos / - "para
encantar o cliente": / revistas, jornais, programas, / enfim, mídia, informação /e mais, comunicação...
Quanto maior a tragédia / e mais atroz a sevícia, / maiores as
edições / os índices de audiência, / o prazer do anunciante.
Só a maldade dá lucro / e alimenta a riqueza / nefanda dos
urubus. / Afinal, eles são úteis... / - limpam a sociedade / e o mundo - da carniça.
Página publicada em janeiro de 2015
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