ALCINA CAROLINA LEITE
Nasceu em Atalaia, Alagoas, em 21 de junho de 1854 e faleceu em 30 de agosto de 1939, em Coqueiro Seco, aos 85 anos de idade. Obra publicada: Campesinas (Versos), pela Tipografia de Amintas de Mendonça, em Maceió, com prefácio de Martins Júnior, em 1889.
ESMERALDA
Vamos, meu coração, meu pensamento,
Voejando nas asas da saudade,
Vagar por esses campos, onde sorriu-me
Em flor a mocidade.
Que sítio encantador! Como a beleza
Dum casto coração de adolescente
Lembra um idílio azul; é todo amores
— Ensina amar a gente...
Aqui, ali, além... por toda a parte,
Murtas, boninas, cravos olorosos,
Junquilhos, "não-me-deixes", margaridas,
Lilases graciosos.
Lírios... os brancos lírios de minh'alma!
E as violetas castas e modestas!
Meu Deus! aqui se abriga, entre verdores,
A Musa das florestas.
Eu, entre estas belezas, — borboleta —
Amo a todas, — volúvel, inconstante...
Nessa orgia de flores e perfumes
Conheço-me... bacante!
Eis da fonte o caminho, marginado
De mimosas, de frescos rosmaninhos;
A fina areia bordam-lhe, inquietos,
Das rolas as pezinhos...
Foi aqui... foi ali... sob a copada
Sombra deste cajazeiro
Que eu fabriquei anéis... duns rebentinhos
De maracujazeiro...
E — pensamento leve como fumo
Que ondeia além, da rústica choupana,
Fiz — artista inocente — os meus brinquinhos
De flor de gitirana.. .
Eis, mais distante, o verde tabuleiro
Estrelado de agrestes malmequeres,
Que eu escolhia aos boqueis. . . mas oh ! saudade,
Por que assim me feres?
Volta, minha saudade, sê bondosa,
E nunca digas, nunca, oh! não! — por quem
Eu perguntava às inocentes flores
— Se me queria bem!. . .
MEU ANJO ENGANADOR
Meu anjo inspirador aos lábios nega
Os mimosos sorrisos da ventura,
Densa núvem a fronte lhe carrega
Da pesada tristura!
Meu anjo inspirador é macilento
Como um raio de luz crepuscular;
Tem um mundo de dor c sentimento
No seu lânguido olhar.
O puríssimo seio não lhe cobre
Um manto rutilante de esplendor,
Mas lhe brilham gentis na face nobre
As pérolas do amor.
Meu anjo inspirador não se espaneja
Aos vívidos clarões do rei do dia,
— Profundo cismador — mas livre adeja
Na escuridão sombria.
Não lhe vibra a voz o raio ardente
Da eloquência que os ânimos seduz;
Co’o flébil sôpro a viração plangente
Suas falas traduz.
Meu anjo inspirador não se enfeitiça
Dos perfumes das rosas matutinas;
— Êle quer mais à palidez mortiça
Do lírio que declina.
Meu anjo inspirador é grande, imenso,
Como um abismo de amor e de amizade!
Vive no meu coração — profundo, intenso,
E chama-se — Saudade!...
Página publicada em janeiro ded 2016.
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