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 CAETANO DE COSTA ALEGRE     (26 de Abril de  1864 - 18 de Abril de 1890)    Manuel  Ferreira, das Ilhas São Tomé e Príncipe, dava a seu conterrâneo Caetano de  Costa Alegre (26 de Abril de 1864 - 18 de Abril de 1890) o título de  "criador da negritude em poesia", com versos assim: "Ah! Pálida  mulher, olha, a noite é negra e tem milhões de estrelas,/ o dia é belo e branco  e tem apenas uma". Antonio Olinto
   CANTARES  SANTOMENSES (A meu tio Jerônimo José da Costa)   Branca a espuma e negra a rocha, Qual mais constante há-de ser, A espuma indo e voltando,  A rocha sem se mexer?   Não creias que em teu jazigo Alguém parta o coração, No mundo quem morre, morre, Quem cá fica come pão.   Não me dizem quanto tempo Tenho ainda que viver, Ficava ao menos sabendo Quando finda o meu sofrer.   Se eu me casasse contigo, Fazia um voto de ferro, De deixar-te unicamente No dia do meu enterro.   Todos me dizem: “esquece Essa paixão, que te abrasa”. Que serve fechar a porta Ao fogo que tenho em casa?   Não havia tanta cara De asno, de tolo e pedante, Se falasse, quem censura, Com um espelho adiante.   Brotam espinhos da rosa, O incêndio brota do lume. A traição brota das juras, Brota do amor o ciúme.   Numa loja conhecida O que é cem custa duzentos, Levam dinheiro em fazendas E o tempo nos cumprimentos.   Macaco, chamaste tolo Ao meu pequeno sagüi. Também queria que ouvisses O que ele disse de ti.   Por teu desdém não me mato, Não faço tamanha asneira, Se o meu amor tu não queres, Há muita gente que o queira.   Quem pode num campo vasto O joio apartar dos trigos? Quem conhece dentre os falsos Os verdadeiros amigos?     A NEGRA   Negra gentil, carvão mimoso e lindo Donde o diamante sai, Filha do sol, estrela requeimada, Pelo calor do Pai,   Encosta o rosto, cândido e formoso, Aqui no peito meu, Dorme, donzela, rola abandonada, Porque te velo eu.   Não chores mais, criança, enxuga o pranto, Sorri-te para mim, Deixa-me ver as pérolas brilhantes,  Os dentes de marfim.   No teu divino seio existe oculta Mal sabes quanta luz, Que absorve a tua escurecida pele, Que tanto me seduz.   Eu gosto de te ver a negra e meiga E acetinada cor, Porque me lembro, ó Pomba, que és queimada Pelas chamas do amor;   Que outrora foste neve e amaste um lírio, Pálida flor do vale, Fugiu-te o lírio: um triste amor queimou-te O seio virginal.   Não chores mais, criança, a quem eu amo, Ó lindo querubim, O amor é como a rosa, porque vive No campo, ou no jardim.   Tu tens o meu amor ardente, e basta Para seres feliz; Ama a violeta que a violeta adora-te Esquece a flor-de-lis.     PARA UM LEQUE     Se eu lhe fosse depor, minha senhora, Por entre estas mentiras cor de aurora Uma verdade sã e proveitosa, Chamava-lhe vaidosa! E, faça-me favor, Não encrespe esse olhar acostumado Ao falso galanteio delicado E a finezas de amor.   II   Eu sei perfeitamente que Vocência Possui a verve, a fina  inteligência. Que eu...não admiro, e toda a gente adora, Duma mulher doutora. Portanto vai então Achar-me pouco amável no que digo, Mas, por fim, há-de concordar comigo E dar-me até razão.   III   Senão Vocência que me diga, franca,  Para que serve numa folha branca: “A senhora é rainha da beleza; Em graça e gentileza, Um cisne a flutuar Num lago não a iguala. Encanta, prende, Como grades de ferro, a luz que esplende Do seu profundo olhar”?   IV   Enfim, essas tolices que descubro No leque, e que seu lindo lábio rubro Agradece aos autores discretamente Dizendo-lhes, ridente:  – Que bonitos que estão Os versos!... Eu bem sei que não mereço O que neles me diz, pois me conheço. Mas...toque. E estende a mão   V   Suponha agora (é só por um momento) Que esse escuro cabelo esparso ao vento, Pelo vento é levado; em outros termos, Para nos entendermos, Suponha que ele cai, Que o pouco que ficou se torna neve E que a pele gentil do rosto breve Encarquilhando vai!   A minha cor é negra, Indica luto e pena; É luz, que nos alegra, A tua cor morena. É negra a minha raça, A tua raça é branca, Tu és cheia de graça, Tens a alegria franca, Que brota a flux do peito Das cândidas crianças. Todo eu sou um defeito, Sucumbo sem esperanças,  E o meu olhar atesta Que é triste o meu sonhar, Que a minha vida é mesta E assim há-de findar! Tu és a luz divina, Em mil canções divagas, Eu sou a horrenda furna Em que se quebram vagas!... Porém, brilhante e pura,  Talvez seja a manhã Irmã da noite escura! Serás tu minha irmã?!...      
                        “?” A minha cor é negra. Indica luto e pena;
 é luz, que nos alegra,
 A tua cor morena.
 E negra a minha raça,
 A tua raça é branca,
 Tu és cheia de graça,
 Tensa alegria franca,
 Que brota a flux do peito
 Das cândidas crianças.
 Todo eu sou um defeito, Sucumbo sem esperanças,
 E o meu olhar atesta
 Que é triste o meu sonhar,
 Que a minha vida é mesta
 E assim há de findar!
 Tu és a luz divina. Em mil canções divagas. Eu sou a horrenda furna Em que se quebram vagas!... Porém,  brilhante e pura. Talvez seja a manhã Irmã da noite escura! Serás tu minha  irmã?!...
   AURORA   Tu tens horror de mim, bem sei.  Aurora, Tu és o dia, eu sou a noite espessa,
 Onde eu acabo é que o teu ser começa.
 Não amas!... flor, que esta minha alma adora.
   És a luz, eu a sombra pavorosa. Eu sou a tua antítese frisante, Mas não estranhes que te aspire formosa, Do carvão sai o brilho do diamante.   Olha que esta paixão cruel, ardente, Na resistência cresce, qual torrente;
 É a paixão fatal que vem da sorte,
   É a paixão selvática da fera, É a paixão do peito da pantera. Que me obriga a dizer-te  "amor ou morte"         Página publicada em setembro de 2008; ampliada e republicada em janeiro de 2016. 
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