RUI  DE NORONHA 
                (1909-1943) 
                  
                Nasceu  em Maputo, assinou-se também António Ruy de Noronha e Carranquinha de Aguilar..  Mestiço, filho de índio e negra. Com seus Sonetos é tido como o precursor da  poesia moçambicana.    
                      
                    TEXTOS EM PORTUGUÊS /  TEXTO EN ESPAÑOL                 
                  
                  
                LUA  NOVA 
                  
                “Quenguêlêquêze!... “Quenguêlêquêze!...  (Lua Nova) 
                
                    
                  Surgia a lua nova, 
                  E a grande nova] 
                  — Quenguêlêquêze!...— ia de boca em boca 
                  Traçando os rostos de expressões estranhas, 
                  Atravessando o bosque, aldeias e montanhas, 
                  Numa alegria enorme, uma alegria louca, 
                    
                  Loucamente, 
                  Perturbadoramente... 
                    
                  Danças fantásticas 
                  Punham nos corpos vibrações elásticas, 
                  Febris, 
                  Ondeando ventres, troncos nus, quadris... 
                    
                  E ao som de palmas 
                  Os homens, cabriolando, 
                  Iam cantando 
                  Medos de estranhas vingativas almas, 
                  Guerras antigas 
                  Com destemidas impias inimigas 
                  — obscenidades claras, descaradas, 
                  Que as mulheres ouviam com risadas 
                  Ateando mais e mais 
                  O rítmico calor das danças sensuais. 
                    
                 
                “Quenguêlêquêze!...  Quenguêlêquêze!...” 
                  
                Uma mulher de vez em quando vinha, 
                Coleava a espinha, 
                Gingava as ancas voluptuosamente, 
                E diante do homem, frente a frente, 
                Punham-se os dois a simular segredos... 
                — Nos arvoredos 
                Ia um murmúrio eólico 
                Que dava à cena, à luz da lua, um que  diabólico... 
                  
                “Quêze!.Quenguêlêquêze!...” 
                  
                ... Entanto uma mulher saíra sorrateira 
                Com outra mais velhinha; 
                Dirigiu-se na sombra à montureira, 
                Com uma criancinha. 
                Fazia escuro e havia  
                Ali um cheiro estranho 
                A cinzas ensopadas, 
                Sobras de peixe e fezes de rebanho 
                Misturadas...O vento, perpassando a cerca  de caniço, 
                Trazia para fora o ar abafadiço, 
                Um ar de podridão... 
                E as mulheres entravam com um tição: 
                E enquanto a mais idosa 
                Pegava na criança e a mostrava à lua 
                Dizendo-lhe: “Olha, é a lua”, 
                A outra, erguendo a mão, 
                Lançou direito à lua a acha luminosa. 
                — O estrepitar de palmas foi morrendo... 
                E a lua foi crescendo... foi crescendo... 
                Lentamente... 
                Como se fora em brando e afogado leito 
                Deitaram a criança, revolando-a, 
                Ali na imunda podridão, no escuro, 
                Lhe deu o peito... 
                  
                Então, o pai chegou, 
                Cercou-a de desvelos, 
                De manso a conduziu p´los cotovelos, 
                Tomou-a nos seus braços e cantou 
                Esta canção ardente: 
                  
                “Meu filho, eu estou contente! 
                Agora já na temo que ninguém 
                Mofe de ti na rua, 
                E diga, quando errares, que tua mãe 
                Te não mostrou a lua! 
                  
                Agora tens abertos os ouvidos 
                Para tudo compreender; 
                Teu peito afoitará, impávido, os rugidos 
                Das feras, sem tremer... 
                Meu filho, estou contente! 
                Tu és agora um ser inteligente, 
                E assim hás-de crescer, hás-de ser homem  forte 
                  
                Até que já cansado 
                Um dia muito velho 
                De filhos, rodeado, 
                Sentido já dobrar–se o teu joelho 
                Virá buscar-te a Morte... 
                Meu filho, eu estou contente! 
                Agora, sim, sou pai!...” 
                  
                Na aldeia, lentamente, 
                O estrepitar das palmas foi morrendo... 
                E a lua foi crescendo... 
                — Crescendo 
                Como um ai...  
                  
                  
                
                  
                    CARREGADORES  
                   
                 
                A pena que me dá ver essa gente 
                  Com sacos sobre os ombros, carregadíssima!... 
                  Às vezes é meio-dia, o sol tão quente, 
                  E os fardos a pesar, Virgem Santíssima!... 
                À porta dos monhés*, humildemente,  
                  Mal a manhã desponta a vir suavíssima,  
                  Vestindo rotas sacas, tristemente  
                  Lá vão 'spreitando a carga pesadíssima... 
                Quantos, velhinhos já, avós talvez.  
                  Dez vezes, vinte vezes, lés a lés  
                  Num dia só percorrem a cidade! 
                Ó negros! Que penoso é viver 
                  A vida inteira aos fardos de quem quer 
                  E na velhice ao pão da caridade... 
                  
                *Monhés – lojas de  comerciantes indianos (ou mesti;[o de indiano com negro). 
  
                
                  
                TEXTO EN ESPAÑOL 
                Traducción de XOSÉ  LOIS GARCÍA 
                  
                LUNA NUEVA 
                  
                “Quenguêlêquêze!... “Quenguêlêquêze!...  (Luna Nueva) 
                  
                Surgía la luna nueva, 
                es la gran noticia 
                  
                —  Quenguêlêquêze!... — iba  de boca en boca 
                Trazando en los rostros expresiones  extrañas, 
                Atravesando el bosque, aldeas y montañas, 
                Com enorme alegria, una alegria loca. 
                  
                Locamente, 
                Perturbadoramente... 
                  
                Danzas fantásticas 
                Conferían a los cuerpos vibraciones  elásticas, 
                Frenesí, 
                Ondulando vientres, bustos desnudos,  caderas... 
                  
                Y al son de las palmas 
                Los hombres, saltando, 
                Iban cantando 
                Temores de extrañas y vengativas almas, 
                Guerras antiguas 
                Con intrépidas impias enemigas 
                — Obscenidades claras, descaradas, 
                Que las mujeres oían com grandes risas 
                Avivando más y más 
                El rítmiico calor de las danzas sensuales. 
                  
                “Quenguêlêquêze!...  Quenguêlêquêze!...” 
                  
                De vez en cuando llegaba una mujer, 
                Movía el espinazo 
                Bamboleaba las nalgas voluptuosamente, 
                Y delante del hombre, frente a frente, 
                Se ponían los dos a simular secretos... 
                  
                — En los árboles  
                Había un murmullo eólico 
                Que daba a la escena, a luz de la luna, um  algo diabólico... 
                  
                “Quêze!.Quenguêlêquêze!...” 
                  
                ...Mientras tanto una mujer había salido  riñendo 
                Con otra más vieja; 
                Se dirigió en la sombra al estercolero, 
                Con una criatura. 
                Estaba oscuro y había allí um olor extraño 
                A cenizas encharcadas, 
                Sobras de pescado y excrementos de rebaño 
                Mezclados... 
                El viento, sobrevolando la tapia de caña, 
                Traía hacia afuera un aire sofocante, 
                Un aire de podredumbre... 
                Y las mujeres entraban con un brasero: 
                Y mientras tanto la más vieja 
                Cogía al niño y lo mostraba a la luna 
                Diciéndole: “Mira, es la luna”, 
                La outra, levantando la mano, 
                Lanzó hacia la luna el leño luminoso 
                — El estrépito de los apalusos fue  muriendo... 
                Y la luna fue creciendo... fue creciendo... 
                Lentamente... 
                Como si fuera em blando y simulado lecho 
                Acostaron al niño, abadurnándolo, 
                En la ceniza del estercolero... 
                Y de repente, 
                Cuando lloró, la madre, cogiéndolo, 
                Allí en la inmunda podredumbre, en la  oscuridad, 
                Le dió el pecho... 
                  
                Entonces, llegó el padre, 
                Lo llenó de caricias, 
                Suavemente lo cogió por los codos, 
                Lo tomo en sus brazos y canto 
                Esta canción apasionada: 
                  
                “Hijo mio, estoy contento! 
                Ahora ya no temo que nadie 
                Se burlçe de ti en la calle, 
                Y diga, cuando errares, que tu madre 
                ¡No te mostro la luna! 
                  
                Ahora tienes los oídos abiertos 
                Para comprender todo: 
                Tu pecho afrontará, intrépido, los ruidos 
                De las fieras, sin temblar... 
                ¡Hijo mío, estoy contento! 
                Ahora eres um ser inteligente, 
                Y así has de crecer, has de ser un hombre  fuerte 
                  
                Hasta que ya cansado 
                Un día muy viejo 
                Rodeado de hijos, 
                Sintiendo ya doblars tu rodilla 
                Vendrá a buscarte la muerte... 
                ¡Hijo mío, estoy contento! 
                ¡Ahora, sí, soy padre!...” 
                  
                En la aldea, lentamente, 
                El estrépito de los aplausos fue  muriendo... 
                — Creciendo  
                Como un ay... 
                  
                  
                  
                Textos  originalmente publicados na revista HORA DE POESÍA, n. 19-20, Barcelona,  Espãna, 1978. 
                Página  publicada em março de 2008; ampliada em janeiro de 2016 
                   |