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MUTIMATI BARNABÉ JOÃO


Nasceu em Viseu, Portugal, mas é reconhecido como poeta de Moçambique. Heterônimo de António Quadros.

Obra publicada: Eu, o Povo, poemas da revolução (1975)

MUTIMATI BARNABÉ JOÃO

Fonte da imagem: http://kotodianguako.blogspot.com
 

VENCEREMOS

 

A última coisa que vi foi nada.

Logo a seguir às labaredas foi nada o que vi então

Com um grande silêncio espantíssimo por cima de nada

E um cheiro queimado de carne

Que vinha de dentro do peito para a boca.

 

Agora estou só nos ouvidos e na língua vagarosa

Eu que só pensava dentro dos olhos penso mal na língua

E o mundo inteiro é muito pouco agora

E tudo quanto está chegando aos meus ouvidos é pouco.

 

Não poderei fazer mais a mesma tarefa

Mas a Luta continua pois é independente de um homem só

E haverá outra tarefa para dois ouvidos e uma língua.

Venceremos.

 

 

EU, O POVO

 

Eu, o Povo

Conheço a força da terra que rebenta a granada do grão

Fiz desta força um amigo fiel.

 

O vento sopra com força

A água corre com força

O fogo arde com força

 

Nos meus braços que vão crescer vou estender panos de vela

Para agarrar o vento e levar a força do vento à Produção.

As minhas mãos vão crescer até fazerem pás de roda

Para agarrar a força da água e pô-la na Produção.

Os meus pulmões vão crescer soprando na forja do coração

Para agarrar a força do fogo na Produção.

 

Eu, o Povo

Vou aprender a lutar do lado da Natureza

Vou ser camarada de armas dos quatro elementos.

A tática colonialista é deixar o Povo ao natural

Fazendo do Povo um inimigo da Natureza.

 

Eu, o Povo Moçambicano

Vou conhecer as minhas Grandes Forças todas.

 

 

O VENTO NA PRODUÇÃO

O vento é de ninguém e não custa dinheiro

O vento tem muita força, tem direcção só, não tem cabeça

O vento está à espera da cabeça do Povo para pensar.

 

Com uma faca e um machado o Povo vai fazer já

Mil e mil e mil armadilhas no vento

Vai apanhar o vento todo e dar-lhe Instrução de Treino

Vai pôr o vento na Produção

Vai convencer o vento a fazer força útil

Não vai prender o vento para o matar fechado

Vai ensinar o vento na canção da Liberdade Vigilante.

 

O camarada pescador sabe do vento todo

Faz a sua pequena armadilha a todos os ventos

Com um pau prumo e outro deitado que anda à roda

E entre os dois põe a vela de pano de esteira ou plástico

Para apanhar o vento malandro naquela rede tapada.

 

O camarada camponês vai aprender esta lição

Vai arranjar uma mecânica de pau e machado

Vai pôr quatro paus andando à roda

Do pau prumo deitado de face ao vento.

Com quatro velas de quatro sacas para encher de vento

Vai levar o vento e fazer força em redondo

Vai levar a força redonda até ao pilão de pedra

Vai pôr a força redonda em força aos saltos iguais

 

Vai pôr os saltos na bomba de água, no gerador

Vai pôr o vento a girar no gera Alegria.

 

Vamos aprender do Vento e de todos.

Vamos pôr o Vento na Produção.

 

 

VIGILÂNCIA

 

Este missionário está muito claro por dentro
Anda muito bem como um homem na mata
E tem um sorriso de quem está tudo perfeitamente
E chegou agora de estar no serviço de Jesus da Nazaré
Que é um sócio católico romano e compadre.
Está tudo perfeitamente claro fora deste missionário
Com sol ou com chuva ou com noite
Está tudo perfeitamente claro
Claro!

Só o que está um pouco na confusão
E este verniz raspado com o meu nome completo
Nesta carteira escolar da 4.a classe adiantada
E eu aqui incomodado com a arma entalada na porta
Não me lembrar de ter estado dentro da pessoa
Que escreveu o meu nome completo no verniz
Nem me lembrar de ter estado fora.

Há com certeza um pormenor que me subtraiu
E que explica haver tantos dentes neste missionário.
Vou sair no cuidado sem virar costas
Acho muito escuro nesta clareza
São muitos dentes todos na mesma pessoa

 

 

Página publicada em dezembro de 2008



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