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MANUEL GUEDES DOS SANTOS LIMA
Nasceu em Bié aos 28 de Junho de 1935. Estudos primários em Vila Teixeira de Sousa; secundários e universitários em Portugal e na Suíça, tendo doutorado em letras pela Universidade de Lausanne. Desertor do Exercito Português e fundador do Exercito Popular de Libertação de Angola (braço armado do Movimento Popular de Libertação de Angola) e seu 1° comandante-em-chefe. Professor universitário;docência no Canadá, França e Portugal. Presidente do Movimento de Unidade Democrática Angolana para a Reconstrução (MUDAR).Vive em Portugal.
Obras: Kissange (poemas); As Sementes da Liberdade (romance); A Pele do Diabo (teatro); Os Anões e os Mendigos (romance)
Poemas extraídos da obra: ROZÁRIO, Denira, org. PALAVRA DE POETA; CABO VERDE – ANGOLA. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1999. ISBN 85-286-0675-9
ESCRAVOS sem terra, em caminho, homens sozinhos acorrentados no terreiro com os caminhos incógnitos do universo traçados nos rostos atônitos, homens de peito ao relento, quissanges dispersos nas insônias do mar.
EXPRIMO-ME PELO SILÊNCIO
Exprimo-me pelo silêncio em torno de mim decretado. Cumpro pena de ausência por insubmissão e reincidência. Vivo no segredo sintonizado de quem me sabe. Sou na negação com que me afirmam. Reconhecem-me omitindo-me, Logo existo. Por isso resisto. O exílio é a Pátria que me confirma no meu país confiscado, onde a Nação abortou. Oiço-lhe os gritos e como outrora busco as sementes de uma nova aurora entre as raízes que ainda o são. Estou presente Queiram ou não Os meus huízes.
O KWANZA
O Kwanza é um rio bonito que corre aflito para Luanda, a catita. Por onde passa recita um rosário de gritos.
O Kwanza é caseiro e às vezes molengão; é um rio de papel que escorre de mão em mão num tropel o ano inteiro a fingir que é dinheiro.
O TRATOR
Somos um povo que olha a terra a menos de um metro do chão, rins quebrados peito fremente.
Somos um povo semeador De pés magoados Entre raízes e suor.
O nosso pai deixou-nos uma enxada e um pedaço de terra favorecida.
Para a cultivar o meu irmão pôs-se a sonhar com um trator.
Do estrangeiro, prontamente, lhe enviaram um estranho trator. tantas rodas tão grande motor!
O trator do meu irmão tem na frente um canhão.
GUERRA
Dois meninos sentados um terceiro de pé todos irmanados na orfandade de um pé.
EXÍLIO
Tange, tange kissange ele absorto ela magoada.
E o sonho morto.
Toda a memória não é nada para tantos desenganos, na larga factura dos anos!
E a mente tão cheia de tanta terra alheia!
Tange, tange kissange recordar não cansa chorar não consola nem os descansa de pensar em Angola.
NOTA EXPLICATIVA SOBRE OS POEMAS
I – Ciclo do Desencanto Nacional
“Kwanza” – brincadeira poética em torno do Kwanza ( o maior rio de Angola), e a moeda nacional com o mesmo nome, uma espécie de caricatura de dinheiro, pois a verdadeira moeda de Angola é o dólar.
“Exprimo-me pelo silêncio” - poema de resistência ao regime marxista vigente.
“O Trator” e “Guerra” – a condenação da guerra civil que tem flagelado o país.
“Exílio” – O regime e a guerra civil condenaram uma parte significativa da população a abandonar o país. (In “Boletim do Movimento de Unidade Democrática Angolana para a Reconstrução”)
II – Ciclo da Negritude
“Escravos” – a memória do passa (In “Antologia Temática de Poesia Africana” e “Kissange”, respectivamente de Mário de Andrade e do autor)
PRISIONEIRO COMS ESPINGARDA DE PAU
Menino negro
Quero levar-te ao planalto
Menino soldado à força
Este poema é para te acordar Docemente Ao lado da tua espingarda de pau
Que pena, menino meu, Que estejas morto!
O HÓSPEDE
Entre a régua e o esquadro alheios
Entre a máscara
Homem paralelo
CERTEZA
Aqui estamos, Enteados do presente E órfãos do futuro
Aqui estamos, De mãos dadas, Os olhos cheios de Amanhã E na boca O nosso grito maduro Sobre as mordaças
SOBRE OS LUTOS
Aqui estamos Companheiros, Junto aos altares da pátria Somando vontades e esperanças Na hora magna Da nossa certeza.
Página publicada em janeiro de 2009; ampliada em julho de 2017
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