Foto: http://angola-luanda-pitigrili.com/
JORGE MACEDO
(Jorge Mendes Macedo) Nasceu na cidade de Malanje em 1941. Fez os estudos primários e secundários em Malanje. Educado nos seminários, freqüentou os seminários Menor e Maior de Luanda até ao curso de Filosofia. Formou-se em etnomusicologia pela Universidade de Kinshasa. A primeira atividade profissional que desenvolveu foi a de regente escolar, tendo ingressado em seguida na carreira administrativa. Após a independência ocupou vários cargos de responsabilidade entre os quais os de Diretor Nacional de Arte e Diretor Nacional da Escola de Música.
Este autor pode ser considerado como sendo um dos raros poetas e ficcionistas que, pela estreia precoce à semelhança de Mário António, assinala com a sua obra a transição de gerações, neste caso da geração de 60 a de 70. E pode tal facto estar na origem da sua propensão para o exercício dos vários géneros literários e associações a outras manifestações artísticas. Acabou por ser igualmente colhido pelo desencanto que longe da pátria se agrava, quando sente o país dilacerado pela guerra. É este > o tema do seu último livro de poesia, O Livro das Batalhas. Iniciou a sua vida literária em 1957 com a publicação do livro de poesia Tetembu.
Obra poética: 1.º Tetembu, 1966, Luanda, e. a.; As Mulheres, 1970, Luanda, NEA; Pai Ramos, 1971, Luanda, NEA; Irmã Humanidade, 1973, Lobito, Cadernos Capricórnio; Clima do Povo, 1977, Lisboa, Edições 70; Voz de Tambarino, 1978, Lisboa, Edições 70; Página do Prado, 1989, Luanda, ENDIPU/UEE; O Livro das Batalhas, 1993, Lisboa, Nováfrica. (Fonte da biografia: http://www.ueangola.com/)
AQUELA NEGRA
de enxada em punho,
lutando pela minha fome;
aquela negra que jorra suores na minha sede
e que vai de lenha na cabeça
porque o frio me consome;
aquela negra
pobre, sem nada,
que vende os panos para me vestir;
que chora nas ruas o meu nome;
aquela negra é minha mãe.
(In: Angola Norte, Bissemanário de Malange, terra natal, 1962;
Cosmoran & Delfim, Revista Internacional de Buenos Ayres, 1964;
I TETEMBU, brochura, edição do autor, 1966.)
VESTIREMOS
com kimenemene perfume de libertação
longe-perto
nossa hora
vermelho
de sangue mártir
vestiremos nosso muxitu vestiremos sol
fumando makanhas de impaciência
talamungongo na kinjila mastigando revoltas
promontório
vulcão
em malambas que fingimos no avesso de nossos risos
sem riso
vestiremos nossos rostos desalienados
vestiremos
(inNGOMA, Revista Angolense de Literatura, n. 1, dezembro 1974,
Luanda; CLIMA DO POVO, Ed. União dos Escritores Angolanos, 1977.)
O GUERREIRO
fala
com ternura aos seus mortos
como um pai
morto em humanizar
depois de matar
deita nos braços os espíritos
e beija
na memória
o rosto dos tombados
(In O Livro das Batalhas, Nova África Edições e Publicações, Lisboa, 1993)
TU ÉS A MAIS NOBRE ANGÚSTIA
esmagados os lábios de onde torrencial a chaga
esboçou o sorriso impossível
com que as crianças atearam estrelas
paradoxais os olhos que forjaram auroras
abatendo promontórios amotinados
com a teimosia da ternura
TU ÉS CATACLÍTICO
tudo que possas dizer sobre a viagem forçosa
na garganta da decepção será um suicídio
A crueldade está de férias. É só a chamarem
e ela estará de volta. Nunca digas
em que furna te escondes do universo. Não aceites dizer
que és um animal extraviado.
A melhor locomoção pertence aos desejos prudentes.
TU ÉS O MAIS LONGO EXTENSO
dia forjado por aqueles olhos oceânicos
pachorrentamente sentados nos picos de rochedos
da praia inventada
no coração da sombra de exúberes frutos
assim o esforço coroou de êxito a espera impossível
pois
de onde a dor combatida se muda para outro lado
nascem auroras enternecidas
à espera envelhecida
Página publicada em setembro de 2015; página ampliada em julho de 2017
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